Fora da ordem

Novo chanceler quer ‘libertar’ o Brasil e combater a ‘ordem global’

'O presidente Bolsonaro está libertando o Brasil, por meio da verdade. Nós vamos também libertar a política externa brasileira, vamos libertar o Itamaraty', afirmou, em discurso repleto de citações

Reprodução Youtube

Araújo: ‘Não mergulhemos nessa piscina sem água que é a ordem global’. Ele pregou libertação ‘pela verdade’

São Paulo – Aletheia, eleutherosei, gnosis. Com repetidas exaltações ao conhecimento, à liberdade e à verdade, o novo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, tomou posse falando em “libertar” o Itamaraty, da mesma forma que Jair Bolsonaro fará em relação ao país. Em discurso de tom ideológico, elogiou Estados Unidos e Israel, países que hoje estão politicamente com governo de direita (Hungria, Itália, Polônia) e aqueles que, segundo o chanceler, se “libertaram” do Foro de São Paulo. E muitos ataques ao que chamou de “ordem global”.

“O Brasil estava preso fora de si mesmo. E arrisco dizer que a política externa estava presa fora do Brasil. (…) O presidente Bolsonaro está libertando o Brasil, por meio da verdade. Nós vamos também libertar a política externa brasileira, vamos libertar o Itamaraty”, afirmou Araújo. O Itamary, acrescentou, não é apenas uma repartição pública, mas um santuário, “por onde corre a seiva da nacionalidade”.

Depois de citar o escritor francês Marcel Proust, o ministro disse que a política externa brasileira “vem se atrofiando” por medo de ser criticada. “Não estamos aqui para trabalhar pela ordem global”, afirmou. “Não mergulhemos nessa piscina sem água que é a ordem global”, acrescentou minutos depois, em meio a uma infinidade de citações. Inclusive o cantor Renato Russo, ex-Legião Urbana, que na música Monte Castelo cantou que “só o amor conhece o que é verdade”. Uma citação bíblica (Coríntios), que o chanceler atribuiu equivocadamente ao “ilustre brasiliense”, que na verdade nasceu no Rio de Janeiro. 

Ele também usou várias expressões em grego, latim e tupi. A última frase do discurso, por exemplo, foi Anuê Jaci, Ave Maria na tradução do padre Anchieta.

“Vamos ler menos Foreign Affairs e mais Clarice Lispector ou Cecília Meireles. Vamos ler menos New York Times e mais José de Alencar e Gonçalves Dias. Vamos escutar menos a CNN e mais Raul Seixas. Vamos fazer alguma coisa pelas nossas vidas e pelo nosso país”, pediu o chanceler, para quem o povo não está mais dividido por “uma ideologia perversa”. 

Geleia geral

O ministro exaltou o filósofo Olavo de Carvalho, “um homem que, após o presidente Jair Bolsonaro, talvez seja o grande responsável pela enorme transformação que o Brasil está vivendo”. Observou que universalismo “não significa não ter opiniões, não significa uma geleia geral, querer agradar a todos”. “Queremos ser escutados, mas não por repetir alguns dogmas insignificantes ou frases assépticas. Não pediremos permissão à ordem global.”

Segundo ele, o problema não é a xenofobia, mas a oikofobia, a aversão ao próprio lar. Araújo afirmou que o Itamaraty se distanciou do Brasil, do povo e do setor produtivo, e que a nova gestão vai “trabalhar sem descanso” para promover o comércio, tendo um programa de trabalho específico para cada parceiro internacional, com uma Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) “redinamizada”. 

“Implementaremos uma política de relações internacionais para os dias hoje”, acrescentou, prometendo ainda “renovado esforço nas negociações multilaterais”, especialmente na Organização Mundial do Comércio (OMC), “que está construindo uma nova e promissora agenda”. Nas Nações Unidas, disse que vai “reorientar a atuação do Brasil, em razão do que é importante para o brasileiro e não do que é importante para as ONGs”. 

Segundo ele, o Brasil defenderá os “direitos básicos da humanidade”. Para citar aquele que considera o mais importante, citou uma novela famosa de meados dos anos 1960, O Direito de Nascer. Para Araújo, o brasileiro, que antes não se interessava por política externa por achar “que era só um exercício de estilo”, agora sente que dessa área “depende o êxito e a sobrevivência do projeto de redescoberta e libertação”. 

Quase no final da fala de meia hora, prometeu um país “mais competitivo e mais autêntico, mais respeitado internacionalmente e mais fiel a si mesmo”, com um última referência a seu tema central: “Não deixem o globalismo matar a sua alma em nome da competitividade. Não escutem o globalismo quando dizem que paz significa não lutar”. 

Ele defendeu o poder da palavra. “Ela está aprisionada, mas com amor e coragem nós podemos libertá-la.”

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