barbárie

Bolsonaro ironiza, depois recua e nega ter comemorado exílio de Wyllys

Presidente negou que tuíte publicado tenha relação com a desistência de Jean Wyllys, mas lideranças reagiram. 'Que tal você começar a se comportar como presidente e parar de agir como um moleque?', disse Freixo

agência câmara

Suspeitas do envolvimento do clã Bolsonaro com milícias foi um dos motivos para Jean deixar o país

São Paulo – “A decisão do deputado Jean Wyllys (Psol) de não assumir seu mandato em 2019, embora seja de caráter pessoal, expressa o contexto de deterioração da democracia”, afirmou o presidente nacional do partido, Juliano Medeiros. Reeleito para o terceiro mandato na Câmara, Wyllys preferiu o exílio, após ser vítima de ameaças de morte e da máquina de notícias falsas articulada pela base do presidente Jair Bolsonaro (PSL).

O clã de Bolsonaro chegou a comemorar o fato. O presidente do país postou em sua conta no Twitter a expressão “grande dia”, fazendo supor que se referia à decisão de seu opositor. E prontamente recebeu respostas de outros políticos, como do deputado eleito Marcelo Freixo (RJ), companheiro de partido e de bancada de Wyllys. “Que tal você começar a se comportar como presidente da República e parar de agir como um moleque? Tenha postura”, reagiu Freixo em resposta ao presidente. Após as repercussões, Bolsonaro chegou a dizer que sua mensagem não tinha relação com o exílio de Wyllys.

As suspeitas do envolvimento do filho mais velho do presidente, senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), com as milícias foi um dos motivos para Jean deixar o país. Sobre o caso, a liderança do PT no Senado divulgou: “Um parlamentar brasileiro deixa o Brasil por conta das ameaças contra sua vida e o presidente comemora com um emoji de arma, em meio a um escândalo que liga o clã Bolsonaro à milícia que matou a vereadora Marielle Franco. Não é possível que isso seja aceito”.

A saúde da democracia brasileira, então, passou a ser questionada. O jornalista Leonardo Sakamoto, do Repórter Brasil, lamentou o momento do país. “Jean Wyllys, por medo de ser executado, desiste do mandato e não volta para o Brasil. Ou seja, um representante eleito deixa o país por ameaças de morte. E há quem diga que as ‘instituições funcionam normalmente’. Funcionam no nível ‘democracia de merda’.”

Sakamoto fez menção às palavras do ministro da Justiça, Sergio Moro, que afirmou que as instituições brasileiras estão funcionando. O jornalista e humorista José Simão também questionou a veracidade da sentença. “Moro: ‘as instituições estão funcionando normalmente’. Jean Wyllys é testemunha”.

Em novembro do ano passado, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos exigiu providências do Estado brasileiro para garantir a segurança de Jean Wyllys, que vinha sofrendo ameaças, inclusive de membros do Judiciário. Desde então, ele passou a viver com escolta policial. A CIDH lamentou a decisão do parlamentar.

Jean Wyllys será substituído por David Miranda, um carioca negro, homossexual e de origem periférica, também do Psol. “Respeite o Jean, Jair, e segura sua empolgação. Sai um LGBT mas entra outro, e que vem do Jacarezinho. Outro que em dois anos aprovou mais projetos que você em 28. Nos vemos em Brasília”, escreveu Miranda em seu Twitter.

A notícia dominou os comentários nas redes. “E nós, cidadãos que acreditam na liberdade e na justiça, o que iremos fazer? Não podemos ficar parados! Não aceito que meu país seja levado a esse estado de coisas!”, protestou a atriz Patricia Pillar. A cantora Zélia Duncan publicou uma foto do deputado, em que ele aparece sorridente em meio a uma multidão, e escreveu: “É assim que vou lembrar de vc todo dia, até te abraçar de novo, meu amigo mais corajoso”.

Candidata a vice nas eleições de 2018, na chapa liderada por Fernando Haddad (PT), a deputada estadual Manuela D´Ávila escreveu um texto emocionado em homenagem ao amigo. “Você, corajoso como sempre, ao decidir abrir mão do mandato e sair do Brasil desnuda por todos nós, meu amigo querido, o terror em que vivemos, o ambiente fascistoide que tomou conta da sociedade brasileira.”

Até o escritor Paulo Coelho entrou na discussão, inclusive pedindo reflexão por parte do deputado. Dirigindo-se a David Miranda, escreveu “é com você agora”. Para Wyllys, afirmou que ele deveria reconsiderar sua posição: “É declarar a vitória dos inimigos do LGBT”.