Eleições 2018

‘O PSDB é um dos grandes derrotados do golpe de 2016’, diz cientista político

Professor de UFABC, Vitor Marchetti também acredita que Ciro Gomes e Fernando Haddad farão a disputa de quem vai para o segundo turno da eleição contra Jair Bolsonaro

Reprodução

“A gente tem que ler pesquisa eleitoral como um movimento, não como um quadro fixo”, avalia Vitor Marchetti

São Paulo – Os resultados das últimas pesquisas de intenção de voto, divulgados pelos institutos Ibope e Datafolha na noite de segunda-feira (10), foram objeto da análise do professor e cientista político da Universidade Federal do ABC (UFABC) Vitor Marchetti, em entrevista concedida hoje (11) aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, na Rádio Brasil Atual.

O nascimento oficial da candidatura de Fernando Haddad (PT), o efeito da chamada “transferência de votos”, a crise do PSDB e a estagnação da candidatura de Geraldo Alckmin, assim como as possibilidades de Marina Silva (Rede) e a consolidação de Jair Bolsonaro no primeiro lugar das pesquisas, foram alguns dos temas abordados por Vitor Marchetti.

Acompanhe os principais trechos da entrevista:

Crescimento de Haddad nas pesquisas

“Do ponto de vista político, a vinte dias da eleição, a gente já percebe um crescimento da candidatura Haddad, a partir do momento em que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) tomou a decisão pela inelegibilidade (da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva). E as últimas pesquisas já apontam um crescimento bastante expressivo da candidatura Haddad e me parece que essa vai ser a tendência a partir de agora. Em mais uma semana de candidatura confirmada, acredito que o cenário vá apontar para algo não definitivo, mas um cenário um pouco mais próximo do que de fato será o cenário eleitoral.”

Transferência de votos

“Todos os candidatos oscilaram dentro da margem de erro. O Ciro saiu um ponto da margem de erro, e o Haddad foi quem, de fato, apresentou um crescimento. A gente tem que ler pesquisa eleitoral como um movimento, não como um quadro fixo. E o movimento indica a candidatura de Bolsonaro consolidada em primeiro lugar, e a transferência de votos que Alckmin esperava acontecer, não vem acontecendo. Se a gente pegar de um mês atrás para agora, vamos perceber que a candidatura Alckmin não foi bem sucedida nessa sua estratégia de convencer o eleitor do Bolsonaro de que Alckmin era alternativa. O que é curioso porque o PSDB, no período pré-eleitoral, investiu fortemente na candidatura de Alckmin trazendo diversos partidos para sua aliança, tentando se consolidar como uma candidatura de centro, mas a gente sabe que boa parte desses partidos estão no campo da direita. Inclusive a vice Ana Amélia (PP) era um sinal muito forte para o eleitor do Bolsonaro de que o PSDB iria continuar trafegando nessa campo da direita. Mas o eleitor, aparentemente, não tem se convencido disso. A candidatura Alckmin, até esse momento, é a grande derrotada.”

De volta a 1989

“As candidaturas do campo da esquerda, Ciro Gomes e Haddad, me parece que essa vai ser a disputa, a reedição de 1989. PT e PDT disputando quem vai enfrentar o candidato conservador no segundo turno.”

A Crise do PSDB

“O PSDB, depois de ter incentivado e ter sido um dos principais protagonistas do golpe de 2016, não se consolida como alternativa para o país. O PSDB deu uma guinada à direita, todas suas novas lideranças têm um discurso bastante calcado na direita, e isso do ponto de vista eleitoral não tem se mostrado bem sucedido. Se pegar até o desempenho do Doria para o governo de São Paulo, sua rejeição não tem cedido, ele está com uma rejeição bastante importante. E as pesquisas já começam a apontar que ele perderia a eleição no segundo turno. Muita coisa, me parece, ainda vai acontecer na eleição para o governo do estado.

Nessa história de renovação dos partidos, se olharmos nas duas últimas décadas, os partidos que dominaram o cenário político, PT e PSDB, estão passando por processos intensos de troca geracional. O PT tem feito isso de um modo que, me parece, ainda mantém o partido como protagonista do jogo, e o PSDB fez essa renovação à direita, radicalizando o discurso à direita. E esse eleitor à direita não se mostrou fiel, ou que tenha identificado no PSDB o caminho da renovação. E além de esse eleitor não aderir ao movimento do PSDB como o partido que renova a direita, a legenda teve alguma sabotagem interna. Você pega comportamentos como o do Doria, nunca foram comportamentos orgânicos.

Na renovação das lideranças do partido, há gente com agendas pessoais muito mais importantes do que agendas orgânicas do próprio partido. Tem a declaração do Doria apontando que o Bolsonaro vai para o segundo turno, quer dizer, o afilhado político do Alckmin indica que o Alckmin já não tem chance. A gente sabe que, do ponto de vista eleitoral, por mais que se faça avaliação interna, nunca se diz isso publicamente, porque obviamente isso atenta contra a candidatura que você apoia. O que mostra que o Doria nunca esteve com Alckmin, e a disputa nos bastidores entre os dois sempre foi muito intensa. Acho que já podemos cravar que o PSDB é um dos grandes derrotados do golpe de 2016. O cenário tem apontado que o PSDB vai ter que se reinventar, inclusive sobre quais são as lideranças que vão assumir o partido.”

Queda da candidatura de Marina Silva (Rede)

“A gente tem dito que essa eleição reforça a polarização do Brasil entre esquerda e direita, com agendas distintas para o país, e que provavelmente a gente teria, no segundo turno, uma candidatura que representasse o campo da esquerda e outra o campo da direita. Portanto, o muro, o meio do caminho, ficava numa posição cada vez mais difícil. E Marina tentou se equilibrar num muro cada vez mais fino, mais estreito. E o derretimento das intenções de voto dela, nesse momento, mostra como, de fato, o muro ficou pequeno. O país não apresenta uma conjuntura em que é possível um candidato, que não tenha claramente sinalizado a qual agenda vai aderir, tenha espaço do ponto de vista eleitoral.”         

Rejeição de Jair Bolsonaro (PSL)

“Ainda que tenha oscilado positivamente dentro da margem de erro, a rejeição tem crescido, o que mostra que, de alguma maneira, o eleitor percebeu o ato de violência que ele sofreu como resultado, ou como parte do contexto em que o próprio candidato funciona nessa ‘chave’. O candidato funciona na chave da incitação à violência, tem focos principais nos seus discursos de ódio, e aí não é à toa que esse perfil de eleitor, mulheres, negros, nordestinos, tenham uma rejeição muito mais elevada porque são esses os eleitores focos do veneno que destilou nos últimos anos.

Do ponto de vista eleitoral, ainda que ele esteja se consolidando como um candidato que vai para o segundo turno, seu teto tem ficado cada vez mais baixo, o que pode dar um indicativo de que vai para o segundo turno, mas com uma chance muito pequena de sair vencedor. O que vai produzir um dilema bastante importante nos eleitores de Alckmin e do campo conservador, porque terão que aderir a um candidato que não parece ter muito fôlego para sobreviver a uma eleição no segundo turno. E imagino que as forças, não só do campo da esquerda, mas democráticas, vão acabar se unindo porque sabem a ameaça que ele representa para a democracia, para os direitos humanos e para a estabilidade política do país.”

Ouça a íntegra da entrevista:

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