Eleições 2018

Site quer unir eleitor a candidatos que defendem nova política de drogas no Brasil

Objetivo é eleger políticos comprometidos com três temas: regulamentação da maconha; descriminalização das drogas; e uso da maconha para fins terapêuticos

Arquivo EBC

Estudos mostram que atual lei de drogas é responsável pelo aumento da violência e o encarceramento em massa

São Paulo – “Precisamos de mais políticos que defendam a reforma da política de drogas. Para isso, queremos mapear todas as candidaturas do país que defendem a reforma em três principais pontos que estão em discussão atualmente: a descriminalização do consumo de drogas, a regulamentação da maconha para fins terapêuticos e a regulamentação da maconha. Queremos conectar eleitores e eleitoras a candidaturas comprometidas com a construção de uma política de drogas justa, humana e eficaz e tornar possível essa mudança nos próximos quatro anos.”

É com esse enunciado sem rodeios que foi lançado, na última terça-feira (31), o site Drogas é caso de política – coalização de candidaturas pela reforma da política de drogas.

Elaborado pela Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD), o novo site tem o objetivo de mudar a política do tema no Brasil. Para isto, quer influenciar na eleição de mais candidatos que defendem a reforma da atual política de drogas, além de garantir o compromisso dos eleitos para cobrar-lhes ali na frente. A PBPD é uma rede criada em 2015 que reúne atualmente cerca de 50 organizações engajadas na promoção de uma política de drogas fundamentada na redução de danos e na garantia dos direitos humanos.

Responsável pela coordenação institucional da PBPD, Gabriel Elias pondera que o debate sobre o assunto tem avançado na sociedade brasileira nos últimos anos. Cita como exemplo pesquisa Datafolha de 2012 que, na época, indicou que 20% da população era favorável a descriminalização da maconha, índice que subiu para 32% em 2018.

“Isso significa uma mudança muito rápida no posicionamento da população. E isso não tem refletido nas instituições políticas. O que a gente vê no comportamento dos políticos é que há uma polarização, onde os conservadores defendem uma política de drogas mais repressiva, e os progressistas evitam falar sobre a necessidade de mudar a política de drogas. Então temos poucos parlamentares que defendem a mudança da política de drogas e mesmo os que defendem, têm receio em pautar o tema”, afirma Gabriel Elias, responsável por acompanhar os projetos de lei que tratam do tema no Congresso Nacional, julgamentos no Supremo Tribunal Federal (STF) e ações dos órgãos responsáveis pelo assunto no governo federal.

Para ele, o receio dos políticos favoráveis à pauta em promover o debate é consequência de um “cálculo eleitoral equivocado”, ao acreditarem que o tema faz perder votos. Uma visão que considera equivocada. “Queremos mostrar com esse projeto que defender a reforma da política de drogas no Brasil de hoje representa um ganho eleitoral para os candidatos. Queremos mostrar para os candidatos a importância do tema e, para os eleitores que concordam com o assunto, terem acesso às informações dos candidatos que defendem o tema nestas eleições.”

A página web permite ao usuário diversas formas de pesquisar quais são os candidatos defensores dos temas propostos, seja por estado, partido ou cargo eletivo. Nestes primeiros dias após o lançamento do site, em torno de 150 pré-candidatos já se inscreveram na plataforma.

Gabriel Elias explica que, neste primeiro momento, o mapeamento dos candidatos está sendo feito por meio da divulgação de um formulário. Quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) liberar a lista oficial dos candidatos, em meados de agosto, ele diz que o contato será feito individualmente com cada candidato para divulgar o projeto e estimular a inscrição. “Esse método mais sistemático ainda não começou. Por enquanto tem se espalhado mesmo pelo próprio interesse dos candidatos em se inscrever, e por ficarem sabendo que outro candidato se inscreveu.”

Argumentos para o debate

Para subsidiar o debate, a Plataforma Brasileira de Política de Drogas disponibilizou um guia para download, com a intenção de ajudar os candidatos a defenderem nas eleições as pautas propostas. A publicação explica as diferenças entre legalização, descriminalização e despenalização, aborda os diferentes modelos de política de drogas em vigor no mundo e os impactos da proibição das drogas na saúde e na segurança públicas.

“A gente sabe que muitas vezes o candidato se compromete com essa política, mas é muito difícil fazer o debate público, ainda mais num tema que é polêmico como este. Então a gente quer ajudar os candidatos a tomarem essa posição, de forma bem direta, com dados que sustentam os argumentos”, explica Gabriel Elias.

O documento, entretanto, também tem sido usado por eleitores interessados no assunto, seja para convencer os candidatos a aderirem à pauta, seja para promover o debate público. “Esse material pode ser usado por qualquer um que se interesse por política de drogas e queira debater nos diversos espaços.”

Por que devemos reformar a política de drogas?

Entre os pré-candidatos que já se inscreveram na plataforma, muitos são políticos conhecidos já em pleno mandato, como os deputados federais Paulo Teixeira (PT-SP) e Jean Wyllys (Psol-RJ), o vereador Eduardo Suplicy (PT-SP) e o deputado estadual Marcelo Freixo (Psol-RJ), entre outros. Pelo PSDB, a vereadora paulistana Patricia Bezerra é a única do partido até o momento inscrita na plataforma, defendendo o uso terapêutico da maconha e a discriminalização das drogas.

A maioria dos inscritos, por enquanto, são pessoas pouco conhecidas do eleitorado. Ao se registrar, o pré-candidato indica qual dos três temas ele apoia – descriminalização do consumo de drogas, a regulamentação da maconha para fins terapêuticos ou a regulamentação da maconha – e responde o questionamento: por que devemos reformar a política de drogas?

A seguir, alguns exemplos:

Carlos Minc (PSB-RJ), candidato a deputado estadual

“Há que legalizar a maconha e descriminalizar de fato o usuário. Há que impedir a prisão de milhares de jovens sem antecedentes, armas ou violência, que saem do sistema penal sem passar por qualquer ressocialização, se tornando realmente perigosos. Uma política eficaz de Segurança Pública tem muitos componentes, como qualificação, polícia de proximidade, investigação – combinada com esforço e educação integral e programas sociais em favelas. Mas sem uma profunda reforma na política carcerária e na Lei de Drogas, os presídios seguirão como quartel general do crime, e continuarão as mortes, violências e prisões injustas. Já com relação a maconha medicinal, sou a favor de que as pesquisas científicas e a regulamentação do cultivo desta planta avancem no Brasil, pois os ganhos para a qualidade de vida dos pacientes são significativos. É necessário reconhecer a demanda das mães, pacientes e familiares que lutam pelo acesso à saúde, qualidade e manutenção da própria vida ou da dos filhos, através da utilização de substâncias presentes na maconha que são usadas para fins terapêuticos como, por exemplo, no tratamento de doenças cerebrais.”

Júlia Martin (PT-SP), candidata a deputada federal

“Defendemos urgentemente que o Brasil tenha uma nova política de drogas que dialogue com as demandas da sociedade e enfrente com coragem este debate, com foco na redução de danos e não na criminalização do usuário. Nossa legislação atual é feita para privilegiar um sistema de guerra às drogas, que financia parte importante da corrupção nacional e por outro lado ataca a população mais pobre, encarcerada e criminalizada pelo uso de drogas. A questão em pauta não é se as pessoas vão ou não usar drogas, pois apesar da proibição o acesso a compra é fácil em todo o país e quem quiser vai usar, proibindo ou não. O ponto central é que o prejuízo é direcionado para a população pobre da periferia, garantindo proteção e lucro aos grandes traficantes. É necessário debater o direito ao corpo, as políticas públicas que cercam este tema e como a atual legislação brasileira está atrasada tanto do ponto de vista medicinal da maconha quanto das questões mais centrais que hoje servem para matar ou prender a população periférica, em especial a juventude e as mulheres negras que se envolvem na logística do tráfico, promovendo um sistema penitenciário desumano e um tratamento desigual da PM nas periferias do país. A proibição levanta ainda a discussão em torno da definição das drogas já liberadas, como álcool e cigarro que, diferente da maconha, causam danos irreversíveis ao corpo e a sociedade.”

Patrícia Bezerra (PSDB-SP), candidata a deputada estadual

“A política de combate às drogas é uma questão controversa. É preciso levantar toda a literatura sobre o tema, onde deu certo e onde não deu. Temos uma cultura, no Brasil, de só trabalhar pelo viés da repressão e pouco ou nada na prevenção. E o melhor caminho é a prevenção. A reforma da política de drogas no Brasil é, antes de tudo, uma questão de saúde pública. O que se combate hoje no Brasil é o uso da droga por um extrato social, com recorte racial, inclusive. Os pontos de venda e as rotas do tráfico são conhecidos, mas há muito dinheiro nesse negócio e poderosos lucrando. Fica mais fácil atacar o usuário pobre, nos guetos das grandes cidades, sem tratamento adequado, entregue ao crime. E pior: boa parte desses usuários é criminalizada e confundida com o traficante. É importante debater essa questão. É preciso considerar, ainda, as pesquisas científicas que indicam o potencial médico e terapêutico de algumas substâncias psicoativas. Esse assunto é cercado de preconceitos, afinal, estamos falando de drogas que podem provocar dependência química. Mas sabemos que há algum tempo a medicina já utiliza substâncias derivadas de plantas – como opiácios – para produção de analgésicos para dores fortes – gerados a partir da papoula, mesma base do ópio. Portanto, precisamos acompanhar o avanço do conhecimento científico e reconhecer que há medicamentos que beneficiam uma parcela considerável da população.”

Jean Wyllys (Psol-RJ), candidato a deputado federal

“Legalizar a maconha, como primeiro passo para acabar com a guerra às drogas, não é somente uma questão de liberdades individuais dos usuários. É também uma questão de segurança pública e de direitos humanos. A guerra às drogas está dizimando a juventude mais pobre das periferias, que morre vítima das lutas de facções, da repressão ao tráfico, da violência policial e das milícias. Ou é encarcerada pelo comércio ilegal de drogas ou, em muitos casos, pelo uso delas. Dependendo da cor e da classe social, a mesma quantidade de substância pode ser considerada para uso ou para tráfico, e a pessoa pode ir parar em presídios superlotados, que são verdadeiros infernos e escolas do crime. Por isso, em 2014, apresentei o projeto de lei 7.270, que faz muito mais do que legalizar a produção e comercialização da maconha (seja para fins recreativos ou medicinais) e descriminalizar o pequeno porte de quaisquer outras drogas para consumo privado. Além disso, o projeto propõe uma série de mudanças radicais na política de drogas do Brasil que seguem o caminho que já está sendo adotado em muitos países que compreenderam que a política proibicionista é um fracasso.”

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