Preso Político

Processo contra Lula violou todos os direitos, diz ex-presidente colombiano

Para Ernesto Samper, que também foi secretário-geral da Unasul, setores do Judiciário e da imprensa atuam em diversos países da América Latina contra experiências políticas progressistas

Ricardo Stuckert / IL

Cresce consenso na opinião pública internacional de que processo que levou Lula à prisão e que tenta barrar sua participação nas eleições é uma fraude desde o começo

São Paulo – O ex-presidente da Colômbia Ernesto Samper (1994-1998), que também foi secretário-geral da Unasul – União de Nações Sul-americanas (2014-2017), afirmou, em entrevista em São Paulo nesta quarta-feira (22), que no processo que resultou na prisão política do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foram violados todos os princípios fundamentais do Direito. “Não há um único dos princípios universais do devido processo legal que não tenha sido violado no caso do ex-presidente Lula. A presunção da inocência, a controvérsia das provas, o direito à intimidade, e também o direito de apelar às instâncias superiores, dentre outros, todos foram violados”, afirmou Samper, que é advogado.  

Ele destacou que Lula “não está sozinho”, pois conta com o apoio de figuras destacadas da política latino-americana, e que a percepção sobre o processo contra ele vem mudando “drasticamente” em todo o continente, apesar dos esforços dos grupos tradicionais de mídia que, como no Brasil, “condenaram” o ex-presidente ainda antes que do seu julgamento. Samper deve visitar Lula em Curitiba nesta quinta-feira (23).

Em seu país, ele divulgou um documento intitulado Nove Violações ao Devido Processo contra Lula (em espanhol), em que ele detalha as ilegalidades apontadas e que demonstram que o ex-presidente brasileiro é um preso político e, portanto, pede a sua “imediata libertação”. 

“Não há nenhuma prova que o condene. Não apareceu a prova cabal que estavam buscando os seus inimigos. Creio que o que eles estão buscando não é uma sentença justa, mas uma vitória política”, declarou o ex-presidente colombiano. 

Além de projetar a imagem do Brasil no exterior, ao fomentar a integração continental, e promover o alinhamento com países do sul e com os outros países emergentes – caso dos Brics –, Samper destacou que as políticas sociais, em especial os esforços no combate à fome, serviram de modelo para todos os países da região.

Segundo ele, Lula também conservou relações pessoais de amizade com figuras progressistas, como os ex-presidentes do Equador e Argentina – Rafael Corrêa e Cristina Kirchner, respectivamente – e também conquistou o respeito até de nomes mais conservadores, como o também ex-presidente colombiano Juan Manuel Santos e o atual mandatário chileno, Sebastian Piñera, que publicamente se manifestaram a favor de um julgamento justo para Lula. “Lula tem muitos amigos. Não está só internacionalmente.” 

Ricardo Stuckert
Lula e Ernesto Samper. Setores da mídia e do Judiciário atuam para perseguir políticos progressistas da América Latina

Samper afirmou que a prisão de Lula e a deposição da ex-presidenta Dilma Rousseff, a partir de um “golpe branco” são “duas faces da mesma moeda”, e representam o avanço do poder de magistrados que atuam em aliança com veículos tradicionais de imprensa para perseguir politicamente, e tentar “apagar do mapa” as experiências políticas progressistas na América Latina.

“São atores políticos, que estão fazendo política sem responsabilidades políticas. Suplantaram partidos políticos em aliança com grandes grupos empresariais de comunicação. Estou falando de juízes e promotores que são apoiados midiaticamente e também por organizações internacionais que intervêm em nossos assuntos internos”, denunciou Samper.

Ele afirmou que fenômenos como a judicialização da política e a politização do poder Judiciário são a principal ameaça à democracia no continente. 

Samper disse que, como secretário da Unasul, tentou coordenar esforços para evitar a “ruptura democrática” representada pelo golpe contra Dilma, mas, segundo ele, a “maior parte” dos chanceleres “coonestaram com o atropelo da democracia no Brasil”. 

Efeitos

O ex-presidente também afirmou que o “golpe” contra o governo Dilma, em 2016, inaugurou a crise na Unasul. Após a sua saída à frente do órgão, devido a pressões políticas, sequer um novo nome foi escolhido devido à falta de consenso entre os países. Ele marcou era o Brasil, antes do golpe, que exercia esse papel na busca por consensos, entre visões à direita e à esquerda. Com o governo Temer, o Brasil se retirou da cena internacional, segundo o ex-secretário-geral da Unasul. 

O continente vive uma ameaça de “desintegração” justamente no momento em que os países mais precisariam atuar conjuntamente, frente às ameaças colocadas pelo presidente americano Donald Trump, que segundo Samper, adota uma agenda “antiamericana”. Essa falta de articulação entre os países dificulta a solução de problemas, como a atual crise migratória venezuelana, com consequências para países como o Brasil e a Colômbia. 

Samper também criticou a aproximação da Colômbia com a Otan, e disse recear que os Estados Unidos utilizem essa aproximação para insuflar as animosidades do seu país com o vizinho venezuelano a ponto de provocar uma guerra no continente, o que seria uma especie de intervenção americana disfarçada. “Estamos no país do realismo fantástico. Tudo pode acontecer”, alertou o ex-presidente. 

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