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‘É preciso entender o que está por trás da onda de imigrantes venezuelanos no Brasil’

Para líder do MST, onda imigratória que desencadeou xenofobia de brasileiros na fronteira com a Venezuela tem relação com agenda norte-americana e posições ideológicas assumidas pela mídia

arquivo/ebc

A governadora de Roraima chegou a pedir na Justiça o fechamento das fronteiras do estado

São Paulo – O aumento do número de imigrantes venezuelanos que cruzam a fronteira no Norte do Brasil vem provocando reações dos políticos e dos cidadãos. No sábado (18), moradores da cidade de Pacaraima, em Roraima, na divisa com a Venezuela, atacaram um acampamento de imigrantes e os expulsaram do país. O ato foi carregado de um tom xenófobo. Ao ver cidadãos, incluindo crianças e idosos sendo expulsos, os brasileiros entoavam o hino nacional em coro.

Ontem (20), a governadora do estado, Suely Campos (PP) pediu o fechamento das fronteiras do estado para venezuelanos, ato que foi repetido pelo líder do MDB no Senado, Romero Jucá (RR). Para o diretor nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Joaquim Pinheiro, a situação é complexa e merece atenção. “Pacaraima tem pouco mais de 12 mil habitantes. O prefeito da cidade (Juliano Torquato, do PRB) é um conhecido latifundiário e seu grupo político vem mostrando posições xenófobas, o que vem sendo ampliado pelo clima de pavor que a imprensa tem criado”, disse à Rádio Brasil Atual.

Para Pinheiro, a onda de ódio contra os venezuelanos tem raízes na mídia corporativa e em forças ocultas internacionais. “Na nossa avaliação, a primeira questão que temos que entender é que a mídia empresarial tem divulgado, não é de hoje, que está havendo uma espécie de crise. De acordo com dados da ONU, de 2015 a 2017, a Venezuela recebeu mais brasileiros do que venezuelanos vieram para cá. Mais de 6 mil brasileiros aportaram por lá e metade disso veio para o Brasil”, disse.

A Organização Internacional para Migrações (OIM), da ONU, revela que esse número cresceu desde então. Mesmo assim, o Brasil não é o principal destino dos venezuelanos. Estima-se que 50 mil deles tenham atravessado a fronteira até abril deste ano. Destes, 52% afirmam que não têm a intenção de ficar no país. Comparando, o Peru recebeu 354 mil pessoas e, a Argentina, distante geograficamente, 105,7 mil. A Colômbia é o destino mais procurado: 870 mil venezuelanos atravessaram a fronteira. Em contrapartida, a Venezuela é o segundo país que mais abriga imigrantes no continente. Quase um milhão de colombianos vivem no país, refugiados de conflitos internos que os assolaram durante décadas.

A falta de contextualização da crise é ponto de crítica de Pinheiro. “É preciso entender o que está por trás disso tudo. A grande parte da população brasileira, acredito, não sabe o real motivo (…). A Venezuela tem a segunda maior reserva de petróleo do mundo, disputa o posto com Arábia Saudita. Os Estados Unidos sempre mandaram no petróleo deles, até a chegada do presidente Hugo Chávez (eleito em 1999). Isso é fundamental entender. O grande problema é que os grandes meios de comunicação têm uma certa linha editorial comandada desde o departamento de Estado norte-americano”, argumentou.

“Chávez estatizou a empresa de petróleo venezuelana, que era comandada pelas grandes corporações dos Estados Unidos e começou a investir os recursos em programas sociais. Desde então, o país teve crescimento fabuloso em políticas sociais”, disse. Entretanto, a Venezuela é um país de economia pouco diversificada, com a produção de riqueza centralizada no petróleo, o que acaba os deixando reféns da variação do valor da commodity. “O problema é que, na época do Chávez, o petróleo chegou a US$ 150 o barril. Agora, com o Maduro (presidente Nicolás Maduro), teve uma crise generalizada no capitalismo. Com isso, o barril bateu na casa dos US$ 29. Uma queda brusca para um país com 80% de sua economia voltada para tal.”

Agenda de ataques

Para o líder do MST, a novidade no cenário venezuelano é a maior interferência internacional, especialmente promovida com a mudança do governo dos Estados Unidos, sob comando do republicano Donald Trump. “Ele tem falado da necessidade de uma intervenção militar na Venezuela. Até agora, o governo que mais tem se alinhado com eles é a Colômbia, que tem sete bases militares norte-americanas. Agora, depois do golpe de 2016 no Brasil, o governo de Michel Temer (MDB) que colocar o Brasil na posição de garoto de recado dos Estados Unidos para atingir a Venezuela”, reforçou.

Essa nova agenda alinhada com os interesses norte-americanos acaba por deixar os venezuelanos em situação complicada em território nacional, sem estrutura de acolhimento, o que pode servir como estopim para conflitos sociais, de acordo com Pinheiro. “Os imigrantes estão chegando sem a assistência necessária. O governo tem a obrigação de fazer isso, como outros países fazem com os brasileiros. Na minha avaliação, isso tem relação com o governo e com a campanha midiática contra venezuelanos, que acabou por deixar a situação mais grave.”

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