memórias

‘Povo tem o direito de escolher em quem quer votar’, afirma José Dirceu

Ex-ministro diz que Lei da Ficha Limpa tem de ser revisada e espera ver Lula eleito no primeiro turno. “O PT aprendeu com os erros e sairá fortalecido, pois a população compreendeu isso”

Blog do Zé Dirceu/facebook

Ex-ministro José Dirceu fala de seu livro de memórias e traça análise do cenário atual para as eleições presidenciais

Brasília – O ex-ministro José Dirceu afirmou nesta quarta-feira (29), durante entrevista coletiva na capital federal, que o PT que sairá das próximas eleições será “um partido fortalecido”, depois de ter aprendido com erros cometidos no passado, mas já compreendidos pela população. Disse também que, apesar de tudo o que lhe aconteceu (numa referência ao período em que foi condenado e preso, num julgamento em que até hoje são questionadas provas apresentadas contra ele) defende o “respeito ao Judiciário”. Mas foi enfático ao criticar a forma como a Lei da Ficha Limpa vem sendo aplicada no Brasil.

Dirceu disse que espera uma grande bancada de petistas eleitos para a Câmara e que poucas legendas terão campanhas sendo realizadas de forma tão correta como as dos candidatos do partido este ano, referindo-se sobretudo à utilização de recursos de campanha. “O caixa 2 para financiamento das campanhas do PT foi um erro, algumas alianças que fizemos logo que iniciamos o governo também foram um erro”, afirmou aos jornalistas. 

Por outro lado, o ex-ministro afirmou que, apesar de não participar da coordenação da atual campanha de Lula, defende que o PT mantenha-se firme em suas convicções e, principalmente, em seu plano de governo. Disse ainda que as coligações firmadas pelo partido em vários estados são necessárias, mesmo que envolvam nomes de legendas que apoiaram o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff – o que tem sido criticado por petistas e oposicionistas. “Fazer alianças é necessário no Brasil. O problema não é coligar, mas saber qual o programa de governo que vai prevalecer, se o do PT ou dos aliados. E nós aprendemos. O que o Brasil precisa mesmo, e já tem tempo, é de uma reforma política.”

Ficha Limpa

Para José Dirceu, da maneira que se encontra, a chamada Lei da Ficha Limpa permite “brechas que levam à inelegibilidade de pessoas cujo processo ainda não transitou em julgado”, como é o caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele destacou que trata-se de uma lei retroativa – ou seja, aplicável a fatos anteriores à sua entrada em vigência–, quando a Constituição Federal proíbe leis retroativas no país. Sem falar na inconstitucionalidade que será uma eventual decisão pela inelegibilidade de Lula, líder de todas as pesquisas eleitorais e condenado antes do trânsito em julgado da sentença.

“Quem inventou essa história de inelegibilidade foi a ditadura, para evitar que as pessoas que os militares não gostavam se elegessem. O povo precisa ter o direito de escolher quem quiser. Essa lei precisa ser analisada e reformada”, destacou. O ex-ministro também afirmou que espera ver a vitória de Lula no primeiro turno. “Ele tem grandes chances para isso. E é por isso que o impedimento dele se torna uma ignomínia e uma infâmia.”

Dirceu reafirmou que “Lula tem o direito de ser candidato e vamos até o final dos pedidos, até o prazo máximo da Justiça” para que a candidatura do PT seja liderada efetivamente pelo ex-presidente. “Se for o caso, que esperamos que não aconteça, de o candidato ter de ser o Fernando Haddad, também avalio que ele tem condições de chegar ao segundo turno e sair vitorioso.”

“Nós temos condições de ganhar, porque a memória de Lula está viva. Temos condições de disputar essa eleição para ganhar”, acrescentou o ex-ministro. “Como a tendência é de a justiça eleitoral definir isso a médio prazo, até 17 de setembro, estamos contando com a candidatura Lula, mas se o resultado for por outro candidato, acho que teremos tempo suficiente (para uma campanha de transferência de votos de Lula para o ex-prefeito.”

“O Haddad já está, aliás, fazendo esse papel, ao percorrer o Nordeste e conversando com  a população. O PT pagou caro pelos erros que cometeu, mas aprendeu. E o eleitorado compreendeu isso, porque atualmente a sigla tem a mais alta avaliação da sua história e a mais baixa rejeição”, acrescentou.

Questionado sobre qual o PT que governará o país se o partido sair vitorioso nas urnas, o da “Carta ao Povo Brasileiro” ou o dos petistas “com faca nos dentes”, Dirceu respondeu que será o Brasil citado pela carta escrita por Lula e divulgada no início de agosto, durante a formalização da sua candidatura no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

“O Brasil sabe que não somos um partido de mágoas, sentimentos ou exclusões por questões ideológicas. Ao contrário do que fizeram conosco, pois fomos cuspidos, espancados, nossa bandeira foi rasgada nas ruas e fomos expulsos de todos os ambientes onde predominava a classe média conservadora e as elites do país, vocês sabem disso. Nós não pregamos o ódio e a violência, mas pregamos a defesa dos interesses sociais e políticos ao limite e esse limite é a lei. O PT que vai chegar ao poder é o PT da carta que Lula escreveu no início de agosto. Ali estão os compromissos do Lula, porque o Lula não mudou”.

Sobre algumas prioridades do governo, o ex-ministro destacou que os problemas brasileiros hoje são estruturais e que aponta como uma posição radical que o partido deve ter a prioridade à realização de reformas. “É legítimo sim, criar um grande movimento de pressão sobre o Congresso para fazer as reformas de que o Brasil precisa. Lula não é candidato por vontade própria. Ele é candidato porque tem apoio da maioria do eleitorado para se eleger. O PT não pode abrir mão de Lula”.

Livro

O ex-ministro lançará na próxima terça-feira (4), no Rio de Janeiro, o primeiro volume de suas memórias, em que narra sua trajetória de vida, passando pelo movimento estudantil, o combate à ditadura, o exílio político, a clandestinidade e todas as eleições disputadas pelo PT, desde sua fundação e até a que elegeu Lula para seu primeiro mandato presidencial, em 2002.

O livro, contou, foi escrito no período em que esteve preso e consistiu numa espécie de remédio para evitar a tristeza e depressão. É uma homenagem que faz aos militantes que durante estes tempos difíceis sempre mantiveram apoio firme a ele e outros companheiros. Também tem o propósito de contar sua história de vida à filha caçula, Maria Antonia, de 8 anos.

Descontraído, o ex-ministro, que conversou com os jornalistas na sede do Sindicato dos  Bancários, disse, em tom animado que já está trabalhando no segundo volume de suas memórias. “Agora vou escrever histórias de bastidores do período em que entramos no governo e da época do mensalão. Aguardem”, frisou.

José Dirceu fará lançamentos do seu livro em várias capitais. Depois do Rio, viajará a Vitória, Salvador, Aracaju, Maceió, Recife, João Pessoa, Natal, Fortaleza, Teresina, São Luís e Belém.