Sem perder a ternura

Perseguição a Lula é tema central de encontro em Havana

Reunião anual com lideranças de esquerda da América Latina também discutiu o avanço da direita no continente e o enfrentamento da agenda neoliberal

Ricardo Stuckert

Ao lado de políticos sul-americanos, Gleisi Hoffmann denunciou a situação vivida pelo ex-presidente Lula no Brasil

São Paulo – O enfrentamento da agenda neoliberal, o avanço da direita nos países da América Latina e a situação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, há 100 dias preso na sede da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, marcaram a realização da 24ª reunião anual do Fórum de São Paulo (FSP), que se encerrou nesta terça-feira (17) em Havana, Cuba.

Iniciado no último domingo, o evento contou com a participação de mais de 400 delegados e convidados de partidos e representantes de movimentos sociais e organizações de esquerda da América Latina, Caribe e outras partes do mundo, como a ex-presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, a senadora e presidenta do PT, Gleisi Hoffmann, o primeiro-ministro de São Vicente e Granadinas, Ralph Gonsalves, e o ex-presidente de Honduras, Manuel Zelaya.

“Este encontro em Havana pode ter a mesma importância histórica de quando surgiu nos anos 90. Os desafios são muitos, mas trabalharemos sob o mais profundo compromisso com a unidade da esquerda, sob as ideias do Consenso de Nossa América e a integração dos povos, forças partidárias e movimentos sociais. Tenho a convicção de que vamos vencer”, afirmou Monica Valente, secretária executiva do FSP, ainda na abertura do Fórum.

Monica Valente reiterou a necessidade dos países latino-americanos enfrentarem, juntos, a onda neoliberal que assola a região, e lembrou as figuras de Fidel Castro e Lula, fundadores do Fórum de São Paulo, em 1990, como um espaço de articulação entre as forças de esquerda e movimentos sociais do continente sul-americano.

Lula livre

Na segunda-feira (16), Gleisi Hoffmann denunciou, durante coletiva de imprensa, a perseguição política e judicial em curso no Brasil contra Lula. A senadora ponderou que, ao contrário dos anos de 1970, quando o modelo de intervenção política e econômica nos países latino-americanos ocorreu por meio de ditaduras que retiraram do poder governos também progressistas, as intervenções e golpes de atualidade se dão por vias aparentemente democráticas.

“Agora utilizam as instituições, que passam a tomar lado numa disputa política. Utilizam o judiciário e o parlamento para fazer essas intervenções. Primeiro o judiciário entra construindo o descrédito de figuras públicas, populares e progressistas, com acusações sempre ligadas a corrupção e induzindo a opinião popular a desacreditar esses líderes. Aconteceu no Brasil, acontece no Equador, na Argentina, em El Salvador e também no Paraguai. Depois, através dos parlamentos, dão o golpe para retirar a liderança. No caso do Brasil foi explícito o que aconteceu com a presidenta Dilma. Usam esses processos para desestabilizar governos progressistas, seja para retirar do poder, seja para impedi-los que voltem a governar”, afirmou Gleisi Hoffmann, durante a coletiva em que também participaram Gabriela Rivadeneira, deputada do Equador, Jorge Taiana, ex-chanceler de Cristina Kirchner, e Nídia Diaz, deputada da Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN), de El Salvador.

“Isso é um atentado à democracia. E tentam naturalizar, normatizar a situação, já que se dá por questões judiciais e parlamentares, logo são instituições acreditadas, constitucionais. O problema é que estas instituições tomam lado. No caso do Brasil, é evidente a prática do lawfare, ou seja, a lei como perseguição ao adversário. O presidente Lula é vítima disso, o PT é vítima disso, outras lideranças de esquerda também, onde a acusação, mesmo sem prova e infundada, leva à condenação e a retirada da vida pública. No caso do presidente Lula, é o maior líder popular na história do nosso país. Por isto estamos aqui para fazer essa denúncia”, disse a senadora.

Para ela, a política neoliberal que está sendo imposta em diversos países latino-americanos não pode prosperar em nações que ainda têm uma parcela grande da população em situação de pobreza e extrema pobreza.

Divulgação/Foro de São Paulo
Primeiro Foro de São Paulo, em 1990, projetava a união das esquerdas na América Latina

Diálogo

Nesta terça-feira (17), último dia do encontro em Havana, a ex-presidenta Dilma Rousseff explicou, para um auditório lotado, que o Brasil até hoje é marcado pela escravidão. Um país onde a exclusão tem como ‘parceiro’ o privilégio, o direito exclusivo de um setor da sociedade. Para ela, essa característica brasileira, e que existe também em outros países latinos, reforça a  importância do Fórum de São Paulo como um espaço onde movimentos sociais e partidos de esquerda e progressistas da América Latina podem dialogar.

Em seu discurso, Dilma lembrou que a América do Sul passou recentemente por diversos governos progressistas, como os de Pepe Mujica, no Uruguai, Cristina e Nestor Kirchner, na Argentina, Hugo Chávez e Nicolás Maduro, na Venezuela, Rafael Corrêa, no Equador, e Michele Bachelet, no Chile, todos “inspirados pelo pensamento de unidade do companheiro Fidel Castro”.

A ex-presidenta também recordou os encontros que teve com Fidel Castro nas ocasiões em que visitou Cuba como chefe de Estado. E destacou o interesse e o carinho que o líder cubano demonstrava pelo Brasil e outros povos do mundo.

“Tinha uma imensa curiosidade sobre o que se passava no mundo, no G20, nos Brics, e toda a realidade brasileira. Era a expressão característica de alguém que percebe que é fundamental, mesmo tendo que cuidar do seu país e da transformação dele e de seu povo, ter um grande compromisso com todos os povos e a humanidade. Essa é a característica marcante do companheiro Fidel Castro, esse imenso amor pelos povos oprimidos”, declarou.

Breno Altman, fundador do site Opera Mundi, dá mais detalhes sobre o que é o Foro de São Paulo:

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