São Paulo

Fora do governo paulista pela primeira vez em 24 anos, PSDB trava o Legislativo

Parlamento estadual não tem recesso por falta de acordo na tramitação de projetos e diretrizes orçamentárias para 2019

Renato S. Cerqueira/Futura Press/Folhapress

Plenário vazio por conta da falta de quórum tem sido uma constante da atual disputa na Assembleia Legislativa paulista

São Paulo – Conhecida pelo absoluto domínio da base dos governos tucanos, a Assembleia Legislativa de São Paulo chegou a um impasse este ano. Dividida em três blocos, a casa não entrou em recesso no mês de julho porque os deputados estaduais do PSDB e PSB levaram para dentro dela a disputa eleitoral deste ano. Além destes, há o grupo de oposição de esquerda, formado por PT, Psol e PCdoB. Com base de apoio maior, o partido do ex-governador e pré-candidato à Presidência da República, Geraldo Alckmin, vem travando as votações, impedindo inclusive que a proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2019 seja votada. O documento é indispensável para o desenvolvimento do orçamento estadual do próximo ano e isso pode complicar a vida do próximo governador.

Desde o dia 26 de junho, a Comissão de Finanças, Orçamento e Planejamento da Assembleia Legislativa paulista vem tentando votar a LDO. No entanto, após 24 anos de poucas dificuldades para executar a tarefa, por um domínio quase absoluto do PSDB na Casa, os parlamentares paulistas não conseguem entrar em acordo para votar este e outros projetos de lei (PLs), como o que proíbe o transporte de animais vivos em embarcações (PL 31/2018) ou que assegura a carga horária de 30 horas para profissionais de enfermagem (347/2018).

Mesmo o projeto de extinção do Instituto de Pagamentos Especiais de São Paulo, de autoria de Alckmin, está parado. O Ipesp é uma antiga carteira previdenciária do governo paulista, que foi substituída pela São Paulo Previdência (SPPrev), mas ainda mantém antigas pensões de quatro mil advogados e outros 17 mil servidores. Caso o projeto seja aprovado, os beneficiários poderiam sacar os valores a que têm direito e o governo estadual teria cerca de R$ 1 bilhão no Tesouro Estadual.

O que ocorre agora é uma disputa por esse valor. Os tucanos e seus aliados acusam o atual governador, Márcio França (PSB), de querer usar o valor em seu benefício eleitoral. E exigem que o projeto de lei que trata do tema determine exatamente onde o montante será aplicado. “O governo assume a carteira do Ipesp e apropria esse valor. O que vai ser feito? Isso precisa ficar claro, ser especificado. Vai para promessa eleitoral? Não é correto, não é justo, a legislação não permite. Vai pagar precatório? Ótimo, então escreve isso no projeto de lei. O projeto não fala nada disso, ele simplesmente desvincula os recursos”, criticou o deputado Edmir Chedid (DEM).

O líder do governo França, deputado Carlos Cezar (PSB), negou que o projeto de extinção do Ipesp deixe “R$ 1 bilhão livre” para o governo estadual. “Embora seja um projeto do Alckmin, até agora o PSDB tem obstruído todas as votações. Mas não existe recurso nenhum para o governo estadual. É um equívoco isso. É um recurso vinculado, que já tem emenda aglutinativa alinhada com praticamente todos os partidos. E só o PSDB não quer aprovar”, afirmou ele, que disse estar discutindo uma nova tentativa de votação da LDO na Comissão de Finanças, amanhã (24).

Cezar amenizou a demora pela aprovação do orçamento. “Se votar o orçamento agora a Assembleia entraria em recesso. Acontece que temos projetos importantes para serem votados. E que têm urgência, porque são importantes para o estado, como no caso da extinção do Ipesp”, disse. Apesar disso, ele critica os tucanos pela postura apresentada no último mês. “A maior dificuldade é que o PSDB tem politizado os projetos e impedido o andamento dos trabalhos, trazendo a disputa eleitoral para dentro da assembleia”, afirmou.

“É uma briga de farinha do mesmo saco. PSB e PSDB foram aliados quase oito anos. Precisa perguntar para o PSDB porque agora vão se opor. Como eles não aceitam a proposta de liquidar o Ipesp? É um projeto que foi encaminhado pelo Alckmin, mas agora o PSDB não quer aprovar em uma estranha oposição. Está uma verdadeira bagunça a Assembleia Legislativa de São Paulo”, afirmou o deputado Teonílio Barba (PT), membro do partido na Comissão de Finanças.

De parte do PT, as prioridades são a derrubada o veto ao Projeto de Lei 367/2018, que incorpora emendas parlamentares ao orçamento deste ano, e exigir transparência nos dados relativos à concessão de isenções pelo governo paulista, que chegou a R$ 20 bilhões em 2018. “Nós vamos obstruir enquanto a LDO não trouxer o orçamento impositivo e a transparência sobre as isenções fiscais, que hoje têm uma regra absurda de sigilo. É preciso esclarecer os critérios e valores dessa medida, divulgando quais são as empresas que o recebem”, afirmou Barba.

Já o líder do PSDB na Assembleia, Marco Vinholi, afirmou que o partido tem uma grande divergência com o projeto do governador e que não aceita a LDO como está. “Apresentamos um voto em separado que, dentre outras coisas, restabelece o número de funcionários do Sistema Único de Saúde, que caiu este ano. Mas nos preocupa, principalmente, a questão do alistamento civil. O governador apresenta um texto com uma meta de 100 mil jovens em um projeto de R$ 1,5 bilhão. Nós somos contrários à apresentação assim desse projeto, temos uma avaliação de que isso poderia até quebrar o estado de São Paulo.”

O alistamento civil é uma proposta de frente de trabalho do governo França, onde cem mil jovens de 18 anos seriam contratados para realizar serviços gerais ao governo paulista, como orientação a turistas e mesmo primeiros socorros. Receberiam treinamento, uniforme e uma ajuda de custo por um ano nessa função. França estimou o custo em R$ 100 milhões por mês.

Para a líder do PT, deputada Beth Sahão, a intriga entre os ex-aliados está prejudicando a população. “Aliados de outrora paralisam a Assembleia Legislativa, ignoram a agenda de deliberação e colocam em jogo os interesses da sociedade paulista”, afirmou. O governo tem que apresentar a proposta de Lei Orçamentária Anual (LOA) até 31 de setembro. Porém, o projeto deve ser pautado pela LDO. Caso não haja aprovação de uma Lei Orçamentária, o próximo governador paulista teria de trabalhar com o mesmo orçamento deste ano, dividido de forma igual para todos os meses, sem a possibilidade de realizar investimentos ou remanejamentos.