ENERGIA

Privatização da Eletrobras: Aleluia muda relatório para tudo continuar igual

Relatório do deputado foi divulgado hoje (10) com o acolhimento de emendas de oposicionistas, mas deixa a questão central, a desestatização do sistema elétrico, praticamente intacta

Alex Ferreira/Câmara dos Deputados

Relator reiterou todos os argumentos usados pelo governo de Michel Temer para privatizar a Eletrobras

Brasília – Divulgado hoje (10), o relatório do deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA)  sobre o Projeto de Lei (PL) 9463/18, que prevê a privatização da Eletrobras, acatou várias emendas feitas por parlamentares, mas continua deixando abertos alguns pontos, a serem discutidos na próxima semana. As mudanças, que na avaliação de oposicionistas consistem numa forma de conseguir maior apoio à aprovação do texto, em nada alteram a matéria quanto ao principal: a desestatização do sistema elétrico. Aleluia determina, por exemplo, que a venda da Eletrobras seja vinculada à destinação, por parte das adquirentes da empresa, de verbas para a revitalização de recursos hídricos.

O parlamentar aumentou o montante de R$ 250 milhões exigidos para a realização destas obras hídricas para R$ 500 milhões nos primeiros 15 anos de concessão, acolhendo, neste caso específico, duas emendas que pediam tal ampliação.

Já em relação ao Nordeste e, em especial, ao Rio São Francisco, o deputado afirmou, no documento, que o texto deve avançar sobre as necessidades da transposição do rio e seu projeto de integração. “Atualmente não há clareza sobre a origem dos recursos necessários para a operação desse programa”, destaca.

O relator coloca a questão para ser discutida na comissão especial, mas faz a ressalva de que “as despesas de operação e manutenção do programa de integração do São Francisco são estimadas em mais de R$ 500 milhões por ano, sem a definição de onde sairão tais recursos. E desse montante total de despesas, cerca de 60% correspondem a despesas com energia elétrica”.

Aleluia também avaliou, no seu documento, que não considera que o projeto de lei – que foi encaminhado pelo governo ao Congresso Nacional no início do ano – tratou de forma adequada a questão do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica – Cepel. Conforme o formato inicial do texto, a Eletrobras tem como obrigação manter o Cepel por quatro anos, mas não há definição sobre como seria essa manutenção, nem como ficará o centro depois desse período.

Apesar de sua tentativa de agradar aos parlamentares com essas modificações, o relator reiterou todos os argumentos usados pelo governo de Michel Temer para privatizar a Eletrobras. Afirmou que a empresa vem “perdendo relevância em todos os segmentos em que atua” e que, de 2011 a 2016, sua participação no setor de geração de energia foi reduzido de 36% para 31%. Os dados são contestados por deputados e senadores contrários a proposta, que consideram tais argumentos como insuficientes para a medida de privatização do órgão.

Participação

Ainda segundo o relator, a proposta de reestruturação da Eletrobras consiste no aumento de seu capital social mediante subscrição de ações ordinárias, sem que a União acompanhe esta subscrição, diluindo, portanto, a sua participação até que deixe de ser majoritária.

“Concluída a referida oferta pública primária de ações, caso a União ainda detenha participação majoritária, a proposição autoriza a realização de uma oferta pública secundária de ações de propriedade da União, a fim de garantir a desestatização da empresa. No âmbito do processo de reestruturação com a consequente desestatização da empresa, propõe-se a limitação do poder de voto de qualquer acionista ou grupo de acionistas a 10% do seu capital votante”, afirmou.

Para o deputado Parus Ananias (PT-MG), um dos integrantes da comissão especial que analisa a matéria, o objetivo do governo “não é melhorar serviço público algum, mas entregar ao setor privado os serviços essenciais para o povo brasileiro”.

“Toda vez que se discute privatização no Brasil, beneficiários e propagandistas de vantagens desse negócio apelam à promessa enganosa de que o dinheiro público poupado e acumulado, graças à venda de empresas estatais, será investido na educação, na saúde e na segurança pública”, contestou. “Essa mentira volta a ser largamente repetida agora, como um dos argumentos para a privatização da Eletrobras, de Furnas, do setor elétrico inteiro. E é repetida pelas mesmas forças que, no fim de 2016, congelaram pelos próximos 20 anos os investimentos públicos em educação, saúde e segurança, entre outros setores”, afirmou Ananias.

Base

Outro que considera equivocados os argumentos governistas é o ex-presidente da Agência Nacional das Águas (ANA), Vicente Andreu Guillo. Especialista reconhecido no setor, ele chegou a afirmar que a privatização não vai impactar apenas o fornecimento de energia à população.

Recentemente, durante audiência pública sobre o tema, ele disse estar fazendo uma avaliação fora do ponto de vista político e sugeriu a captação de parte dos investimentos destinados ao setor elétrico para ser usado nas bacias brasileiras, em vez da opção pela privatização. “Nenhum país abre mão, na sua parte hidrelétrica, de ter ao menos uma base para coordenar todo o setor. Perdermos isso vai prejudicar toda a sociedade brasileira”, alertou.

Como o relatório de Aleluia foi ornado público há poucas horas, vários deputados ainda vão estudar o texto nos próximos dias, até porque hoje e amanhã eles seguem agendas de debates e audiências públicas sobre o tema nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Audiências marcadas hoje, que estavam programadas para serem realizadas nos estados de Roraima e Sergipe, foram canceladas.

Desde que foi instalada a comissão, os parlamentares apresentaram perto de 300 requerimentos e exigem que a proposta conte com inclusão de sugestões tiradas por representantes dos movimentos sociais.

A expectativa de integrantes da base aliada do governo é de colocar o texto em votação até, no máximo, o final de maio. Mas tudo depende do ritmo dos debates e da apresentação e discussão de novas emendas ao texto, o que só poderá ser iniciado depois do prazo de cinco sessões do plenário da Câmara. 

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