Crise de combustíveis

Moreira Franco aparece de surpresa na Câmara e governo nega aumento de impostos

Em debate amplo, deputados de vários partidos apontaram falhas na política de preços da Petrobras e caminhoneiros pediram apoio para aprovar MPs sobre itens prometidos no domingo por Michel Temer

Luis Macedo/Câmara dos Deputados

Moreira Franco evitou falar sobre entrevista em que mencionou a possibilidade de aumento de impostos

Brasília – A Câmara dos Deputados protagonizou, hoje (29), na comissão geral instituída para discutir a crise de combustíveis, mais um dia tenso. Os destaques passaram por reclamações de representantes dos caminhoneiros sobre sua situação, pedidos para que os pontos prometidos pelo governo sejam votados com brevidade pelo Legislativo, propostas diversas para a redução do preço dos combustíveis e críticas de parlamentares sobre possível aumento de impostos para suprir as concessões anunciadas no último domingo. A principal surpresa, entretanto, foi a presença inesperada do ministro de Minas e Energia, Wellington Moreira Franco.

Moreira Franco, cuja assessoria já tinha avisado que não iria participar do encontro, tem sido criticado por muitos deputados desde a última semana. Inclusive pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), neste caso, por ter dado a entender que parte dos recursos a serem utilizados para as concessões feitas pelo governo aos caminhoneiros (cerca de R$ 9,5 bilhões) poderiam resultar em aumento de impostos para os cidadãos.

“Isso aqui é uma democracia e ele (Moreira Franco) não manda no Congresso Nacional. O que foi dito ontem foi muito irresponsável. O Congresso não aprovará nenhum projeto sobre aumento de impostos”, bradou Rodrigo Maia.

Quando Franco e o presidente da Petrobras, Pedro Parente, anunciaram que se ausentariam do evento, deram margem para acusações de deputados de todos os partidos contra ambos. Mas, pressionado pelo Palácio do Planalto, segundo contaram parlamentares da própria base do governo, o ministro foi instado a marcar presença. 

No mesmo tom de Maia, o deputado Luiz Sérgio (PT-RJ) também criticou a postura dos representantes do Executivo no Congresso Nacional. “Estamos vendo aqui um retrato do Brasil e da importância que o governo dá aos nossos problemas mais sérios. Cadeiras vazias do representante da Petrobras, de outros assessores do governo, até do ministro de Minas e Energia”, ironizou.

Saída relâmpago

Atrasado, o ministro apareceu no espaço com cara de poucos amigos e por meio de uma passagem isolada do plenário da Câmara. Disse que é importante ser enfrentada a questão tributária no país e que está construindo uma proposta para funcionar como espécie de “colchão” para reduzir a inconstância dos preços dos combustíveis. Mas evitou falar sobre entrevista em que mencionou a possibilidade de aumento de impostos, veiculada pelo jornal Folha de S. Paulo.

Ele ainda ressaltou que é preciso ser estudada a questão da redistribuição do ICMS, já que a diferença na alíquota do tributo entre estados vizinhos chega a ser de até quatro pontos percentuais. E defendeu que o poder público não deve interferir na Petrobras, além de destacar que a estatal precisa ter permissão para “continuar praticando preços do mercado”.

Pouco depois de ter se pronunciado, o ministro saiu discretamente, da mesma forma como chegou, sem participar dos debates nem ouvir o que os outros palestrantes estavam falando. Sequer deu explicações solicitadas por muitos dos participantes da comissão.

Foi pior a emenda que o soneto. Se mandaram ele para cá às pressas, na tentativa de melhorar a situação, erraram outra vez e feio”, comentou um emedebista que não quis se identificar, argumentando não querer acirrar ainda mais a crise política.

No mesmo momento em que Moreira Franco estava na Câmara, no Senado, o ministro da Fazenda Eduardo Guardia afirmou que não há previsão para aumento de impostos e que a compensação tributária dos recursos a serem retirados do Orçamento da União para bancar a redução do óleo diesel pode ser uma redução de incentivos fiscais.

Para muitos parlamentares, a fala dos dois ministros representou um recuo nas intenções do governo e foi mais uma prova de que o Executivo ainda não sabe como agir para suprir as receitas que deixarão de entrar.

“Nos últimos 30 dias a gasolina aumentou 16 vezes neste país. Existe hoje uma paridade internacional de preços que faz com que, toda vez que se aumente o valor lá foram sejam ampliados os preços aqui no Brasil”, disse o deputado Assis Carvalho (PT-BA).

Sem condições de trabalho

“A greve que estamos presenciando é uma situação de esgotamento total dessa política de combustíveis. Representa o desencantamento da sociedade que não aguenta mais tantos aumentos”, afirmou também o deputado Felipe Bornier (Pros-RJ).

O motorista Wallace Landim, mais conhecido como “Chorão” – alvo de queixas nos últimos dias por ter ligações com o partido político Podemos – pediu para que fosse aberto um canal de diálogo dos caminhoneiros com outros representantes do governo e com lideranças partidárias, com o apoio do Congresso.

“A verdade é que estamos numa situação difícil. Temos colegas desesperados, há dias sem dormir, sem conseguir voltar para casa. A mobilização foi feita porque os preços praticados não dão condições de trabalho para a categoria”, ressaltou.

Sobre sua ligação com o Podemos, Chorão negou fazer parte de qualquer movimento político. “Fui flagrado numa rede social ao lado de políticos que foram nos visitar numa das concentrações dos caminhoneiros”, justificou-se.

Ontem o Congresso Nacional recebeu as três Medidas Provisórias (MPs) prometidas por Temer para diminuir o preço do óleo diesel, como forma de dar fim à greve dos caminhoneiros. Tais medidas são referentes à liberação do frete da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para caminhoneiros autônomos, a fixação do preço mínimo do frete e a dispensa do pagamento de pedágio do eixo suspenso de caminhões.

Orlando Silva (PCdoB-SP), relator do projeto de reoneração de setores da economia afirmou que ainda tem dúvidas sobre o real impacto destas providências. “Não acho que seja correto assinar um cheque em branco, sem saber o custo que terá para o próprio governo. Como o governo está na lona, muito fragilizado, o movimento está impondo uma derrota que agora, aparentemente, pode dar saída para a crise. Mas, adiante, a crise pode vir com muito mais força”, acrescentou.

Já para o deputado Ivan Valente (SP), a solução definitiva só virá a partir da revisão completa da atual política de preços da Petrobras.

O deputado Rogério Rosso (PSD-DF), outro a comentar sobre o tema, pediu foco na reforma tributária e alertou os colegas para que as medidas divulgadas pelo Planalto não levem a aumentos que acarretem em outros prejuízos para a população.

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