País em crise

‘Tudo o que se prevê pode mudar na semana que vem’, diz cientista política

Para Maria do Socorro Sousa Braga, ataque a ônibus de Lula e violência política, prisão de José Yunes e julgamento do habeas corpus do ex-presidente fazem com que quadro político seja imprevisível

Reprodução/Youtube

“Por que essa prisão agora, se já sabiam do envolvimento do Yunes e outros?”, diz analista da Ufscar

São Paulo – Diante de um cenário em que a cada semana, ou mesmo a intervalos menores, novos acontecimentos alteram o jogo no tabuleiro político do país, fazer previsões deixou de ser um exercício seguro por parte da ciência política. Por isso, não se pode antever quais as consequências das prisões do empresário e advogado José Yunes, ex-assessor do presidente Michel Temer, e do ex-ministro da Agricultura e ex-presidente da estatal Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), Wagner Rossi, além de executivos da área de transportes, no âmbito da Operação Skala, da Polícia Federal, na manhã desta sexta-feira (29).

“Na semana que vem, tudo o que se prevê pode mudar completamente. O clima é de muita insegurança”, avalia a cientista política Maria do Socorro Sousa Braga, professora da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar).

O ataque ao ônibus de Lula e a violência política, o julgamento do habeas corpus de Lula no dia 4 e a própria prisão de Yunes fazem com que o grau de previsibilidade do cenário fique menor do que já era. “É um dos períodos mais difíceis e imprevisíveis dessa quadra democrática. Vamos ter mais certezas com o desenvolvimento do processo até a definição do quadro de candidatos, que vai culminar com a eleição.”

Para a analista, as denúncias contra aliados do Planalto e as mais recentes prisões da Polícia Federal colocam mais pressão sobre o governo, segundo uma leitura possível. Por outro lado, ela discorda de avaliações segundo as quais Temer correria risco de não chegar ao fim do mandato, em decorrência do episódio Yunes. Inclusive porque não se pode ter certeza de a quem exatamente interessam as prisões desta sexta-feira.

“Não sabemos  a origem disso, em qual medida essas prisões se relacionam com a tensão que está no ar. Pode ser até estratégico ao Temer ou a setores que querem prender o Lula. Mostraria que as operações atingem vários grupos, e não só esse ou aquele político”, conjectura Maria do Socorro. A prisão de Yunes, principalmente, é secundária em relação ao “núcleo duro” do governo, pondera. “O que pode acontecer? Ele falar mais, para incriminar os principais? Acho difícil. Parece mais uma tentativa de manter o Estado de Direito e a democracia de alguma forma.”

Nesse contexto, seriam muito improváveis prisões de figuras do “núcleo duro”, como Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência da República). “A prisão de Yunes teria o sentido de dizer que as operações estão atingindo a todos.” Isso tornaria mais palatável um candidato lançado pelo governo, inclusive o próprio Temer. “Por que essa prisão agora, se já sabiam do envolvimento do Yunes e outros?”, questiona.

Além disso, o clima de violência, somado a prisões e operações atingindo políticos à esquerda e à direita, desestimularia manifestações populares da parcela da população que não está tão envolvida com PT e Lula, ou até está descrente da política. Seja como for, para Maria do Socorro, diante do cenário imprevisível, as análises tateiam o imponderável e são “um tiro no escuro”.

Rosa Weber e Fachin

A violência política atual, os tiros contra os ônibus de Lula, a morte da veraadora Marielle Franco, as supostas denúncias do ministro Edson Fachin de que estaria sofrendo ameaças tornam o quadro ainda mais difícil. Na quarta-feira (4), o Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar o mérito do habeas corpus de Lula sobre execução de pena após condenação em segunda instância. As ameaças que Fachin ou sua família estariam sofrendo é outro elemento cujo interesse é ambíguo.

Na opinião de Maria do Socorro, a ministra Rosa Weber “é a grande peça” no tabuleiro, nos próximos dias. Após o julgamento da mais alta Corte do país que impediu a prisão de Lula até a definição do seu habeas corpus, a votação estaria aparentemente empatada, e apenas a posição da ministra é considerada uma incógnita. “A questão é saber como ela vai administrar todas as pressões, sabendo que seu voto pode decidir os rumos do país, já que, se Lula for candidato, o cenário muda completamente.”

Quanto à violência, a analista da Ufscar acredita que não se pode misturar os episódios como se estivessem todos relacionados entre si. “A morte da Marielle está relacionada com a conjuntura do Rio de Janeiro. E a ameaça a Fachin e os tiros na comitiva do Lula são coisas diferentes.”

Leia mais: