Balanço

Tragédias e resultados ‘inúteis’ marcam 1º mês da intervenção, segundo Observatório

Segundo coordenadora do Observatório da Intervenção, atuação da polícia no Rio de Janeiro segue o mesmo padrão de antes da chegada das Forças Armadas, e morte de Marielle pode representar 'novo patamar de violência'

Divulgação/CESeC

Marielle participou da primeira reunião do Observatório da Intervenção (CESeC), no dia 6 de março, no Rio

São Paulo – Depois de pouco mais de um mês da decretação da intervenção militar no Rio de Janeiro, a polícia continua agindo “fora de controle”, em operações noturnas nas favelas e bairros de periferia, e tragédias continuam ocorrendo nas ruas da capital fluminense. Segundo a cientista social Silvia Ramos, coordenadora do Observatório da Intervenção, até agora os resultados foram “inúteis” e seguem o padrão de segurança pública adotado há anos. “Foi esse tipo de política de segurança que levou o Rio aonde estamos.” 

Dois dias após a execução da vereadora Marielle Franco, na quarta-feira (14), um menino com menos de dois anos foi morto, junto com mais três pessoas, em tiroteio entre supostos traficantes e forças policiais, no Complexo do Alemão. Na favela do Acari, o sumiço de dois moradores em caso não esclarecido possivelmente envolvendo policiais foi denunciado por Marielle, quatro dias antes da sua execução. 

Para a coordenadora do Observatório – iniciativa do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), da Universidade Cândido Mendes (Ucam) em parceria com outras entidades  –, a morte de Marielle, se confirmado que perpetrada por grupos organizados devido à sua atuação política, representa “o ingresso num patamar de violência sem correspondência anterior.” Marielle também integrava o observatório. 

Silvia lembrou que no único caso similar ocorrido no estado do Rio, – a execução da juíza Patrícia Accioli, em 2011, em Niterói – havia relação direta com policiais, que eram investigados por formação de milícia que atuava em São Gonçalo, também no Grande Rio. “Na verdade, ela estava às vésperas da decretação da prisão desses policiais”, lembrou Silvia. 

Ela chega a comparar a hipótese de execução de Marielle com o que ocorreu por décadas na Colômbia, quando a morte de vereadores, deputados, governadores, juízes e ministros eram recorrentes, em meio à guerra entre as Farc, carteis de drogas, paramilitares e forças oficiais de segurança. Ainda na semana passada, o Observatório afirmou, em nota, que o assassinato da vereadora representava “ameaça aos ativistas de favelas, às lideranças comunitárias e aos defensores de direitos”. 

O Rio não pode naturalizar essa morte, assim como naturalizamos a violência e as mortes nas favelas. Nos acostumamos a achar que, se há confrontos e pessoas morrem em tiroteios, em áreas em que há traficantes, isso é normal ou aceitável. Foi assim que chegamos a mais de mil mortes em decorrência de ação policial no estado no ano passado”, alerta a socióloga. 

Por fim, ela diz que a reação nas ruas, nas redes e na mídia, em especial dos jovens, pela memória de Marielle, tem sido muito importante para que “Rio e o Brasil encontrem um novo momento, em que o desrespeito aos direitos não será tolerado”.