Cadê a Prova?

Acampamento em Porto Alegre: ‘Vamos continuar lutando por nossos direitos’

Vigília em defesa do ex-presidente Lula mobiliza milhares de cidadãos desde a noite de terça-feira no Acampamento da Democracia, centro de convergência dos atos em apoio à democracia

MÍDIA NINJA

Entre 15 e 20 mil pessoas estão alocadas no imenso campo à beira do rio Guaíba em apoio ao ex-presidente

Porto Alegre – Desde o início da manhã desta quarta-feira (24), milhares de trabalhadores e manifestantes estão mobilizados no centro da capital gaúcha, em vigília de apoio ao ex-presidente Luíz Inácio Lula da Silva, que aguarda sentença do julgamento de seu recurso no Tribunal Regional da 4ª Região, localizado a cerca de um quilometro do ponto de concentração. Uma barreira guardada pela tropa de choque da Brigada Militar impede a aproximação do prédio.

A vigília está concentrada no Acampamento da Democracia, no Anfiteatro do Pôr do Sol. Segundo os organizadores, entre 15 e 20 mil pessoas estão alocadas no imenso campo à beira do rio Guaíba. O local, montado mesmo debaixo de chuvas torrenciais que castigaram a cidade no domingo (21), e conta com quatro grandes barracões e centenas de barracas. A estrutura conta com 16 cozinhas, onde são preparadas as refeições, sempre com ingredientes produzidos nos assentamentos de trabalhadores sem terra.

A organização impera no local, que conta até com um espaço da saúde, onde o corpo médico – com muitos profissionais nascidos nos próprios assentamentos e outros formados nas escolas de medicina cubanas – realizam mais de 150 atendimentos por dia, a maioria causada por dores musculares e nas articulações, assaduras e queimaduras do sol por conta das longas marchas, problemas comuns  de quem enfrenta a extenuante jornada de trabalho na terra. Os casos mais simples são tratados com medicamentos fitoterápicos igualmente feitos a partir de produtos dos próprios assentamentos. As ocorrências mais graves são encaminhadas por uma ambulância ao hospital pronto socorro de Porto Alegre.

Ao fim do grande ato em apoio ao ex-presidente Lula, realizado na tarde, de terça-feira (23), no centro da cidade, milhares de manifestantes se dirigiram ao Acampamento da Democracia, localizado a cerca de dois quilômetros de distância do local do protesto.

“Nunca imaginei que ia chegar aos 70 anos, e ver todo esse retrocesso em tão pouco tempo. O povão ainda não caiu na real. Nem o povão e nem a classe média, que está sendo ferrada e ainda fica falando que nós somos baderneiros”, desabafou a médica veterinária Inês Maria Cerpa, durante a marcha. “O que vai ser dos jovens? É um crime de lesa-pátria. O objetivo dessa elite é acabar com as leis trabalhistas, com a Previdência, e com as riquezas do país. Vocês, jovens, tem uma grande missão de reverter essa situação”, conclamou.

Já era alta noite da terça-feira e o acampamento continuava atraindo uma multidão para dar apoio aos acampados. Uma delas é Stela Maris Cardis, moradora de Porto Alegre, aposentada, elegante, bem articulada, fez questão de acompanhar a filha até o local. “Eu gostaria que o julgamento fosse favorável ao Lula, mas eu não acredito muito nessa justiça. Eu acho que esse julgamento é uma cortina de fumaça porque, se, ele se candidatar, está morta a questão para eles, e não convém às elites que a gente tenha um governo para todo mundo, e não só para as elites.”

No acampamento, centenas de pessoas se acomodam nos imensos barracões comunitários construídos com lonas e troncos. Manifestantes como Paulo Lima e Eva Pereira, agricultores gaúchos que sentem na pele o resultado da mudança de governo. “Para nós está claro que é a continuação do golpe que eles deram em 2016. O Lula criou várias políticas públicas que ajudaram os pobres e que estão acabando. A Dilma não cometeu nenhum crime e perdeu o mandato.O Lula também não cometeu nenhum crime, mas estão perseguindo ele porque querem colocar um projeto da direita. Mas nós estamos aqui para dizer que não aceitamos esse sistema e que vamos continuar lutando pelos nossos direitos, independente do que acontecer com o Lula”, afirmou o agricultor da cidade rio grandense de Canguçu.

Sua sogra, Eva Pereira, afirma que já sente os efeitos negativos da mudança de governo. “Para nós que somos agricultores, é massacrante. O crédito está mais difícil, tudo subiu muito de preço. O diesel, o custo da produção de um modo geral. Não estamos aqui por diversão. Estamos aqui porque estamos sentindo no cotidiano todas essas mudanças.”

“Piorou 100% desde que o Temer assumiu ao poder. A luz, o gás, o diesel aumentam praticamente todo dia. Querem passar por cima dos trabalhadores, do pequeno agricultor. Não podemos aceitar todos os cortes que o Michel Temer fez. É uma vergonha aumentar só R$ 17 o salário mínimo”, protestava o também agricultor Vilmar de Almeida enquanto aguardava na longa fila para o banho. Vilmar é aposentado por invalidez e continua trabalhando como agricultor para complementar a renda.

Em 2018, o salário mínimo determinado por Temer sofreu o menor aumento dos últimos 24 anos.  Passou de R$ 937 para R$ 954.  O reajuste, de 1,81%,  ficou abaixo da inflação pela primeira vez desde 1995 – já entre 2003 e 2016, durante os governos Lula e Dilma, o salário mínimo teve aumento real, descontada a inflação, de 77%. Segundo o IBGE, 44 milhões de brasileiros vivem com menos de um salário mínimo por mês.  

“Minha expectativa é que o Lula vai sair vitorioso, de uma forma ou de outra”, afirmou Vilmar. “Os juízes não tem mais o que inventar contra o Lula. Eles não têm outra saída. Já inventaram tantas mentiras que não sabem mais o que falar. É uma calúnia muito forte que ele está sofrendo. Se prenderem o Lula, eles podem ter certeza que vão ter que prender todos nós”, afirmou Vilmar.

O jovem agricultor Ronaldo Adílio Pinatti, colocou a situação em perspectiva. “Eu tenho 10% de confiança na Justiça, mas eu quero que a Justiça prevaleça”, afirmou o camponês de Pontão, no Rio Grande do Sul. Seu assentamento, conta, produz alimentos como arroz, feijão, amendoim, batata, mandioca, alho, cebola e carne, tudo 100% orgânica, como ele fez questão de afirmar. “O mais prejudicado [com a condenação do Lula será] o trabalhador, o ser humano que bota o pão na mesa todo dia e que depende da terra. Somos 1% que coloca comida orgânica na mesa do brasileiro, mas vamos fazer muita falta.”

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