POLÊMICA

Votação de emendas à PEC que proíbe aborto é adiada

Câmara alegou não ter espaço para realizar sessão hoje. Estão previstos 11 destaques para mudar o texto, que é repudiado por entidades internacionais e ativistas de direitos humanos

Mulheres mobilizadas em Brasília no dia 13 de novembro contra a PEC 181, que quer proibir o aborto

Brasília – A votação de um total de 11 destaques, dos quais quatro de caráter supressivo (que retiram itens completos de parte do texto) na proposta que proíbe o aborto em todas as circunstâncias no país – em tramitação na Câmara dos Deputados – é vista como prioridade da agenda desta semana no Legislativo, mas motivo de divergências entre os parlamentares. A secretaria da Casa tentou encontrar um espaço para realizar a sessão da comissão especial que avalia a matéria, prevista para hoje (22), durante toda a manhã. Quando encontrou, os trabalhos foram suspensos por conta da abertura da ordem do dia no plenário.

O texto, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 181, estava previsto para ter os destaques votados na comissão especial ontem, mas as trocas de farpas entre deputados da bancada evangélica e os que atuam na área de direitos humanos foram intensas. Com isso, o rito do trabalho foi adiado para esta quarta-feira, mas muitos componentes da comissão já dão como certo um novo atraso.

As alas mais conservadoras do Congresso, que trabalharam para mudar o texto e incluir a cláusula que proíbe o aborto em todas as formas (hoje, permitido por lei em casos de estupro e de fetos anencéfalos), atuam para votar a PEC do jeito como se encontra no relatório.

Os deputados, tanto da oposição como de outros partidos, contrários à alteração da PEC e atuantes de direitos humanos, acham que a manobra feita para mudança do texto foi das mais sórdidas. Assim que forem votadas as emendas na comissão, a proposta segue para votação em plenário em dois turnos. E, depois, para apreciação no Senado Federal.

Muitos deputados, inclusive o próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já declararam achar que, hoje, a PEC terá dificuldades para ser aprovada – já que, por se tratar de uma mudança na Constituição, precisa de um mínimo de 308 votos.

Ao mesmo tempo, os que são contrários à matéria acham que é importantíssimo mudar o teor do relatório apresentado pelo deputado relator, Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP), o quanto antes, com a votação dos destaques.

“As alterações feitas de forma esdrúxula transformaram o texto num verdadeiro ‘cavalo de troia’, porque o objetivo da PEC é aumentar o período de licença maternidade para mães de crianças prematuras de 120 para 240 dias, nada mais que isso. Acrescentaram um item que nada tem a ver com a proposta, num gesto propositado e desonesto”, acusou a deputada Erika Kokay (PT-DF).

‘Afronta à Constituição’

Erika foi mais além e disse que os deputados da atual legislatura são “mais desonestos do que se pensava”. O desabafo da parlamentar se deu depois de uma discussão acirrada com Flávio Augusto da Silva, mais conhecido como deputado Flavinho (PSB-SP). Além de defender as mudanças feitas na PEC, ele disse aos manifestantes presentes na reunião, que se diziam do grupo pró-aborto, que na verdade “não estão interessados em defender as mulheres”.

A deputada Luiza Erundina (Psol-SP) tem defendido que, como a proposta teve alterações que não dizem respeito ao seu formato original, da forma como foi apreciado pela comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania (CCJ) da Casa, é fundamental que com a mudança, volte à CCJ para nova tramitação, antes de ser encaminhada ao plenário.

Segundo Erundina, em resposta ao relator, que disse que a matéria não altera o Código Penal, “o texto mexe na Constituição, que tem um poder jurídico superior ao do Código Penal, onde estão previstos os casos em que hoje o aborto é permitido”.

Investidas dos evangélicos

Diante do grande número de manifestantes presentes à Câmara ontem para protestar contra o teor da PEC e da chegada de outros, com faixas e cartazes,  na manhã desta quarta-feira, a discussão promete um embate ainda maior até o final da semana. Mas a votação das emendas tende a não ser concluída hoje, por conta da votação dos vetos presidenciais, prevista para se realizar em sessão conjunta do Congresso nesta tarde.

Os parlamentares contrários à matéria destacam que a discussão exige atenção e combate constantes, mesmo com a previsão de outra tramitação no Senado. Isto, por conta do avanço das investidas de bancadas evangélicas e de outros grupos representantes do conservadorismo no Congresso Nacional, na atual legislatura.

O retrocesso é nítido, de acordo com várias deputadas, porque as regras atuais, que autorizam o aborto em caso de risco de vida da gestante ou estupro, são vigentes desde 1940, pelo artigo 129 do Código Penal Brasileiro.

Além de protestos em diversas cidades no país nas últimas semanas contra a proposta em tramitação, a PEC também conta com reação negativa e pedidos para que não seja aprovada por entidades internacionais ligadas à Organização das Nações Unidas (ONU), bem como movimentos sociais e outras associações de defesa de direitos humanos.