CASO MOURÃO

Aumentam pedidos de punição para general que pregou golpe militar

Ministro da Defesa foi convidado para falar sobre tema em audiência pública no Senado, mas parlamentares querem resposta do próprio presidente Temer

Divulgação/Exército

Ministro disse que vai exigir explicações do comandante do Exército sobre fala de Antonio Mourão (acima)

Brasília – Apesar do anúncio feito pelo ministro da Defesa, Raul Jungmann, de que vai pedir explicações sobre a fala do general do Exército Antonio Hamilton Mourão, que propôs intervenção militar no Brasil, o tema, passados quatro dias da declaração, ainda repercute no Congresso Nacional. Parlamentares de partidos diversos criticaram a postura de Mourão e cobram que o próprio presidente Michel Temer, na qualidade de comandante supremo das Forças Armadas, tome providências a respeito em nome do Estado Democrático de Direito.  No Senado, o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), pediu a convocação de Jungmann na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.

Antônio Hamilton Martins Mourão é o atual secretário de Economia e Finanças do Exército. Ele fez a declaração na última sexta-feira (15), durante palestra em Brasília, num clube de maçonaria. Destacou a intervenção militar como o que chamou de “alternativa à corrupção instalada no país”.

Um dos mais enfáticos no repúdio à fala do general, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) sugeriu que Mourão seja processado, uma vez que, a seu ver, esse tipo de discurso se equipara a um crime de responsabilidade. “Ninguém nos venha mais com essa teoria absurda. A Constituição de 1988 foi clara no sentido de repelir qualquer intervenção armada no país, por isso a declaração deve ser vista como crime”, explicou Rodrigues.

Indo mais além, o senador amapaense disse que as palavras de Mourão “podem até ser a opinião isolada de um maluco, mas a possibilidade de chantagem das Forças Armadas mostra a falta de autoridade do presidente Michel Temer no enfrentamento da corrupção”.

“Só tem respeito quem se dá ao respeito. Lógico que, quando vê um presidente da República desmoralizado, qualquer militar se sente no direito de tripudiar, de falar e ameaçar a democracia, em falar em quebrar a ordem democrática, em fechar o parlamento”, ressaltou Randolfe Rodrigues.

O senador José Medeiros (Podemos-MT) disse que a fala do general foi infeliz e que, como senador e brasileiro, se sentiu constrangido. “Considerei constrangedor ver um militar de alta patente, ocupando um cargo relevante no Exército, ser infeliz dessa forma”, ressaltou. Medeiros afirmou que, embora reconheça que o Brasil vive uma crise, não vê como possível se falar neste tipo de ruptura hoje em dia.

Mais instabilidade

Já Lindbergh Farias destacou que se não houver algum tipo de atitude punitiva contra o general, o Brasil poderá enfrentar um outro tipo de instabilidade junto à atual crise política. Farias considerou a declaração como muito grave e um caso, segundo ele, de “quebra de hierarquia e passível de punição, por se tratar de ameaça ao mundo democrático brasileiro”.

“O caso repõe a clássica questão militar novamente como alternativa de saída para a crise, algo que estava completamente superado”, acrescentou.

Em nota, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, disse que vai exigir explicações do comandante do Exército, Eduardo Villas Boas, sobre a fala do general Antonio Hamilton Mourão. O ministro ressaltou que a legislação veda a oficiais manifestações sobre a conjuntura político-partidária sem autorização do Comando do Exército, dando a entender que, apesar de ainda não ter sido tomada qualquer atitude, o gesto do general pode ser objeto de punição.

A situação de Mourão é considerada para muitos integrantes do governo um caso isolado pelo seu perfil, dado a declarações polêmicas. Mas desta vez, representantes do Executivo e do Legislativo em Brasília repudiaram o gesto afirmando que a sua condição não pode mais ser tratada de forma branda.

Em 2015, ele foi exonerado do cargo de comandante do Exército na Região Sul porque homenageou o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-Codi, centro de detenção e tortura da ditadura militar, morto naquele ano – e apontado como um dos maiores torturadores do país. O militar também já fez críticas à classe política e costuma exaltar o que chama de “luta patriótica”.

Antonio Mourão passou a ocupar o cargo de secretário de Economia e Finanças do Exército, um dos mais altos desta Força, embora de caráter mais burocrático, no governo de Michel Temer. Faltando poucos meses para sair da ativa, ele é conhecido como um militar que exerce grande liderança entre as tropas que já comandou.

Desrespeito a regulamentos

A presidenta nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), divulgou uma nota afirmando que o partido conclama as forças democráticas do país a repelir a manifestação do general, que qualifica como “gravíssima”.

“Ao pregar publicamente uma intervenção das Forças Armadas sobre as instituições da República, um novo golpe militar, este oficial não só desrespeita os regulamentos disciplinares, mas fere frontalmente a Constituição e ameaça seriamente a democracia”, destacou a senadora

Mais cedo, em vídeo, o jornalista Paulo Moreira Leite, um dos diretores do site Brasil 247, considerou a declaração um ato de insubordinação do general.

Segundo Moreira Leite, que cobrou providências das autoridades, Mourão assumiu a existência de um plano de golpe militar no país. “Ele acha que porque dá ordem para pessoas que comandam tanques, que carregam baionetas, pode ordenar para que possam intervir no Brasil? Já vimos essa história e foi uma tragédia. Precisamos impedir o mal pela raiz”, destacou o jornalista.

Em artigo publicado no Jota, o professor da FGV Direito Rio Joaquim Falcão também criticou a postura do governo no episódio. “No caso do general Mourão, três hierarquias foram atingidas. Pela ordem. A do Comandante do Exército, general Villas Bôas. A do ministro da Defesa, Raul Jungmann. E a do presidente Michel Temer, comandante supremo das forças armadas”, apontou. “É claro que ninguém quer criar uma crise e agravar a falta cometida. Mas agravar é ignorá-la. A quebra da liturgia do cargo tem sido um insidioso destruidor das instituições.”