Embate na Câmara

Reforma política: oposição briga com base governista para barrar distritão

Parlamentares de várias bancadas afirmam que novo sistema vai criar exclusão das minorias no Legislativo. PT, PCdoB e PHS obstruem votação para negociar adiamento

Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Deputados da comissão especial discutem destaques à reforma política

Brasília – Os deputados que fazem oposição ao governo, integrantes da comissão especial encarregada de analisar a reforma política – Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 77/2003 –, anunciaram que querem obstruir a votação final do relatório, para que este só seja aprovado em sua totalidade na próxima terça-feira (15). A intenção é construir um novo acordo que permita fazer com que o texto apresente mais itens de consenso entre as bancadas, já que vários trechos do relatório foram alterados da noite de ontem até agora. Nesta segunda reunião para apreciar a matéria, os deputados já estão debatidos há quase cinco horas e aprovaram poucas emendas.

As discussões têm sido intensas. No final da manhã, os parlamentares recolocaram no relatório do deputado Vicente Cândido (PT-SP) as figuras dos vice-presidente, vice-governador e vice-prefeito no texto, que tinham sido retiradas pelo relator ontem. Eles recolocaram ainda, por meio de destaque, o cargo de suplente de senador, também excluído do texto aprovado durante a madrugada.

Para muitos integrantes da comissão especial a ideia era que, com o texto final, os senadores deixassem de ter suplentes. E em caso da vacância de um cargo no Senado, passaria a assumir de 2018 em diante o segundo mais votado.

Lamento do relator

“Todos sabemos que quem assume a suplência para o Senado são os patrocinadores de campanha dos senadores. É uma regra que já deveríamos ter acabado há muito tempo”, protestou o deputado Henrique Fontana (PT-RS), sem sucesso. O relator da matéria afirmou que tinha sugerido também o fim dos vices porque eles não possuem função definida e tais cargos acarretam em mais gastos para os cofres públicos. Cândido demonstrou insatisfação com o resultado do seu relatório, que foi desfigurado na reunião anterior, encerrada na madrugada desta quinta-feira.

Os deputados de bancadas ligadas à base aliada do governo, em especial PMDB, PSDB, DEM e PP, deixaram de lado os termos do seu parecer e aprovaram, por meio de um destaque apresentado pelo PMDB, o chamado distritão (voto majoritário) para deputados, senadores e vereadores. “Lamento esse resultado. O que foi aprovado ontem foi uma reforma para os políticos, para os mandatos, e não para a sociedade”, ressaltou o relator.

Cândido afirmou que quando elaborou seu parecer não pensava que o texto final iria estabelecer o valor de R$ 3,6 bilhões, em 2018, para o Fundo Especial de Financiamento da Democracia. Segundo ele, apesar de saber que o processo eleitoral tem custos e que não se faz campanha sem dinheiro, não se esperava que o montante fosse tão elevado. O deputado afirmou ainda que incluiu o percentual de 0,5% da receita líquida da União mediante as negociações feitas com os demais integrantes da comissão.

“Vamos olhar para frente, parar de olhar para o próprio umbigo, para a própria reeleição. Desse jeito, com essa toada, podemos ter uma renovação muito maior, não vai ser o distritão que vai salvar. Estou colocando no meu relatório contra minha vontade”, disse.

O distritão tinha sido sugerido anteriormente pelo ex-presidente da Câmara, o deputado cassado e hoje preso Eduardo Cunha, e é considerado pelos oposicionistas um sistema elitista. Em 2015, o sistema foi rejeitado em votação no plenário da Casa, mas em uma manobra da base aliada do governo, passou a ser incluído no texto do relatório ontem.

Protestos contra alteração

“O PT orienta seus deputados contra toda forma de voto distrital. Temos orientação congressual contrária a este sistema. Tentamos hoje abrir o diálogo nesta reunião, mas não foi possível. Só temos a declarar a nossa posição que é pelo voto proporcional em todos os sentidos na composição dos parlamentos”, afirmou a deputada Maria do Rosário Nunes (PT-RS).

Rosário citou o ex-presidente da Câmara Ulysses Guimarães. “Doutor Ulysses dizia que quando nós pensamos somente nos pequenos, nos apequenamos. Um parlamento é do tamanho da sua jurisdição. O parlamento brasileiro deve, portanto, pensar do tamanho do Brasil”, ressaltou.

Ivan Valente (Psol-SP) também reclamou. “A posição da bancada do Psol nesta comissão é contrária ao distritão. O Psol é contra qualquer modelo em que entre o voto distrital, por ser contra a interferência do poder econômico no processo eleitoral. Fazemos questão de debater a realidade brasileira, o que seria o voto distrital e a transformação do Brasil em distritos. O distrital puro chegou na Inglaterra em que o Partido Trabalhista, o Conservador e o Liberal disputavam. O Liberal teve 25% dos votos e não elegeu nenhum parlamentar naquele país. Na França, recentemente, vimos partidos que tiveram 25% elegerem apenas 2%”, argumentou.

De acordo ainda com Valente, as representações de opinião, as minorias, receberão uma inclusão que não interessa à democracia brasileira. “’Prefeiturizar’ uma eleição, trazer a lógica do distrito para o Congresso Nacional e para a discussão de projetos nacionais me parece absolutamente incorreto. Aqui se discute projeto de nação, as grandes matrizes da direção de governo nacional”, disse o deputado

Ivan Valente ainda acrescentou que a ideia terá mais um problema a ser observado, que será a distribuição de distritos. “Essa distribuição será feita segundo interesses espúrios para a montagem de distritos que atendam aos atuais parlamentares e a interesses partidários. Isso não interessa ao povo brasileiro”, destacou.

Após a votação final do relatório na comissão especial, a matéria ainda terá de ser apreciada o plenário da Câmara e seguirá para uma segunda tramitação no Senado.

 

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