VOTAÇÃO FATIADA

Câmara retira percentual do fundo partidário e oposição comemora

Fundo para financiamento de campanhas teve excluído percentual 0,5% de receitas da União. Grupo de 180 deputados declarara independência de seus partidos e parlamentares vão votar como quiserem

Pedro Ladeira/Folhapress

Zarattini (c): retirada do percentual abre caminho para realizar eleições livres do poder econômico

Brasília – Com uma sessão que terminou por volta das 2h da madrugada desta quinta-feira (24), os deputados da oposição comemoraram pelo menos o que consideraram duas vitórias na discussão da proposta de reforma política, que há duas semanas vinha tendo votação adiada na Câmara. A primeira foi a retirada, do fundo de financiamento público de campanhas, do percentual de 0,5% do valor das receitas correntes líquidas da União, o que reduzirá de forma significativa o montante do fundo (estimado inicialmente em R$ 3,6 milhões). Foram 404 votos para a retirada e somente um para a manutenção do percentual. A segunda foi a manifestação de 180 parlamentares de que, em relação ao tema, vão votar de forma independente do que desejam suas bancadas.

A grande briga, que é a discussão sobre a mudança no sistema eleitoral para o distritão, ficou para a votação da matéria na próxima terça-feira (29). Para o líder do PT na Casa, deputado Carlos Zarattini (SP), a redução do valor do fundo – que ainda não se sabe em que montante ficará e será revisto a cada ano eleitoral – moraliza o financiamento público de campanha.

“Essa retirada do percentual da receita corrente líquida abre caminho para que o fundo garanta a realização de eleições livres da influência do poder econômico”, afirmou ele. “Defendemos um fundo que garanta a realização de eleições democráticas, livres e com custos baixos, e que seja definido pela Comissão de Orçamento de acordo com a realidade financeira do país, ou seja, moralizamos a proposta”, disse.

De acordo com o líder petista, a intenção dos oposicionistas é evitar que sejam retirados para esse financiamento público de campanhas recursos da saúde, educação e investimentos, seja por meio dos favores espúrios das empresas que financiaram as campanhas até bem pouco tempo, seja por meio de recursos altos para bancar este fundo que está sendo criado. “O que precisamos é encontrar fontes de financiamento dentro da atividade política e reduzir os gastos das campanhas. Não dá mais para termos campanhas milionárias como em 2014”, explicou.

Já a posição anunciada pelos 180 parlamentares incluiu deputados de várias legendas, desde o DEM, passando pelo PSB e PSC. Os parlamentares se posicionaram por meio de um manifesto divulgado ontem, no qual afirmaram que não representam nem governo nem oposição e, por isso, querem defender propostas que estejam voltadas “para o desenvolvimento econômico do país” e na votação de matérias emblemáticas, como é o caso da reforma política.

“Queremos construir um caminho que não vire as costas para a sociedade”, disse Arolde de Oliveira (PSC-RJ). “O manifesto não tem caráter de dissidência entre nós e nossas bancadas partidárias. Apenas queremos atuar de forma conjunta em questões específicas, como a aberração de tirar dinheiro do orçamento da União para campanhas quando já existe dinheiro nos fundos partidários atualmente existentes”, completou Júlio Delgado (PSC-MG).

Prioridade para o distritão

A votação da primeira parte da reforma, que ameaçou não ser realizada até o final da tarde, só foi iniciada por volta das 18h30 de ontem com dois requerimentos prévios sugerindo o fatiamento da matéria para votação em separado de todos os itens. Neste trecho, os integrantes da base aliada do governo e favoráveis à mudança de sistema eleitoral para o distritão sugeriram que o distritão fosse a prioridade da lista.

O polêmico modelo permite a aplicação do sistema majoritário para eleição de deputados e vereadores na próxima eleição. Pela proposta, em 2018 e em 2020, respectivamente, serão eleitos os deputados e vereadores mais votados em cada estado ou cidade, a exemplo do que já ocorre na eleição de senadores e de mandatos para o Poder Executivo.

O distritão está sendo proposto como transição para o sistema distrital misto, a partir de 2022, em que metade das vagas vai para candidatos mais votados e as demais para os partidos, de acordo com lista preordenada. Isso valeria para deputados federais, estaduais e distritais. Hoje, deputados e vereadores são eleitos pelo sistema proporcional, em que as cadeiras das câmaras e assembleias são divididas de acordo com o desempenho nas urnas do partido ou coligação.

O primeiro requerimento, apresentado por Zarattini, pedia que fosse apreciada primeiro a proposta do fundo de campanhas eleitorais e somente depois a do distritão. A preocupação dos petistas e demais integrantes da oposição é que, com a votação do distritão em primeiro lugar, fossem abertas brechas para que se evitasse discussão do tema no plenário, o que facilitaria sua aprovação.

O outro requerimento, apresentado pelo líder do PP, Arthur Lira (AL), pedia o contrário e defendia a apreciação do distritão em primeiro lugar. Por 241 votos a 204, venceu o requerimento de Lira, mas a votação, devido ao adiantado da hora, ficou para a próxima semana.

Em novo requerimento aprovado pelo plenário, foi rejeitada a votação do trecho da matéria que estabelece dez anos para os mandatos dos ministros dos tribunais superiores. O item consta no relatório elaborado pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP) e foi aprovado pelos integrantes da comissão especial que analisou a proposta, mas apesar de ter o apoio de alguns ministros de tribunais superiores, como Luís Barroso e Ricardo Lewandowski, enfrenta forte lobby contrário por parte do Judiciário.

‘Passo importante’

De acordo com o líder das minorias na Casa, deputado José Guimarães (PT-CE), o número de votos que mudou a ordem de votação da proposta para dar prioridade ao distritão mostra que não há os 308 votos considerados necessários para que o sistema seja aprovado.

“É como já dissemos e reitero agora: pode até existir maioria em relação a isso (o distritão), mas não quantidade de votos por parte da base do governo para aprovar esse sistema. O resultado demonstrou fraqueza do outro lado e vimos a votação como um passo importante para derrubar este item do texto na votação definitiva”, destacou.

A ordem de votação estabelecida conforme os requerimentos apresentados e aprovados ficaram da seguinte forma: em primeiro lugar, os parlamentares terão de apreciar se aceitam o sistema distrital misto para 2022 em diante e distritão para as eleições de 2018 e 2020.

Após isso, vão votar a instalação ou não do fundo partidário público para campanhas eleitorais, o chamado fundão (já que o que eles aprovaram foi apenas que, em aprovado, o fundo não terá mais percentuais da receita corrente líquida da União).

Em seguida, serão apreciados no plenário, respectivamente, a questão dos limites orçamentários do fundo e exclusão dele do teto de gastos da Emenda Constitucional 95, de 2016 (referente ao novo regime fiscal) e a regra que permite a reeleição para um único período subsequente de cargos executivos (presidente da República, governadores e prefeitos) para aqueles que tenham assumido o cargo por mais de seis meses, exceto substituições eventuais.

Depois disso, entrarão na pauta questões como: mudanças nas datas de posse, encurtamento do período de campanha em segundo turno e aplicação aos deputados estaduais das regras de sistema eleitoral, remuneração e perda de mandato dos deputados federais. Também votação indireta para presidente da República apenas no último ano de vacância do cargo, com regra aplicada também a governadores e prefeitos; regulamentação do distrital misto em 2019 e vigência da emenda constitucional.

Como todos concordam que é difícil toda a proposta ser votado num mesmo dia, diante dos vários embates e discussões que a reforma política suscita, está considerado adiado o plano do presidente da Câmara de votar a matéria inteira até o final de agosto, a não ser que haja grande esforço concentrado por parte dos deputados – o que nem todos concordam que deva ser feito em relação à reforma, propriamente.

A votação da reforma política, por se tratar de Proposta de Emenda à Constituição (PEC), precisa ser realizada em dois turnos pela Câmara e pelo Senado Federal. E depois da Câmara seguirá para tramitação normal no Senado, que inclui instalação de comissão especial para apreciar o texto e o estabelecimento de prazos para discussão e elaboração de relatório. Caso não seja aprovada até o início de outubro, dificilmente as regras valerão para as próximas eleições.

Na outra casa legislativa, é difícil adiantar se haverá agilidade ou não dos trabalhos, pois os senadores de vários partidos já anunciaram que, a exemplo dos deputados, vão querer discutir bem todas as normas.

Com Agência Câmara