FORO PRIVILEGIADO

Moraes imita Mendes, pede vista e julgamento de ação é suspenso

Posição do ministro do STF representa sua primeira polêmica no cargo, por protelar ainda mais o tema e agradar parlamentares com problemas na Justiça

Carlos Moura/SCO/STF

Moraes (dir) não seguiu o relator Barroso (esq), para quem políticos usam mudança de foro para protelar julgamentos

Brasil – Empossado em março em meio a sérias críticas por suas posições político partidárias e por ter saído direto do Ministério da Justiça – ocupando cota do PSDB no governo Temer – para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes protagonizou sua primeira polêmica como integrante da mais alta Corte do país nesta quinta-feira (1º), depois de pedir vista da ação penal que trata sobre foro privilegiado. O voto do relator, Luís Barroso, foi por restringir o foro apenas para autoridades durante crimes que tenham sido cometidos por eles no exercício do mandato. Moraes, ao lado de Gilmar Mendes, não disse explicitamente que não concordou com a tese do relator. Mas contestou o entendimento de que o atual sistema provoca problemas de morosidade e, em consequência, dificuldades para a imagem do STF.

Com a suspensão do processo até a devolução dos autos por Alexandre de Moraes, o julgamento da ação fica parado, colocando mais suspense no cenário de denúncias e criminalização de políticos ocupantes de cargos no país. A iniciativa deixou satisfeitos parlamentares que, ontem, forçaram a votação, no Senado, de proposta de emenda à Constituição (PEC) referente ao mesmo tema – que segue agora para a Câmara.

O argumento de vários deputados e senadores foi de que não gostariam que o assunto, considerado pertinente de forma específica ao Legislativo, fosse julgado antes pelo Judiciário. O ministro fez exatamente o que os parlamentares esperavam.

“Ele começou a dar uma de Gilmar Mendes”, alfinetou um conhecido advogado de políticos que acompanhou a sessão do Supremo. A referência a Gilmar Mendes foi pelo fato de o ministro já ter chegado a passar mais de um ano com um processo parado sob pedido de vista no seu gabinete.

“Está mostrando sua fidelidade ao governo Temer e aos parlamentares a quem sempre foi ligado”, disse em reservado um ministro aposentado de outro tribunal superior que hoje advoga. A sua avaliação é que o maior tempo que demorar para retornar o julgamento contará como ponto favorável para a situação do atual presidente da República e os integrantes da sua equipe ministerial denunciados na Operação Lava Jato.

O argumento de Alexandre de Moraes ao pedir vista do processo foi de que se a restrição ao foro privilegiado for aprovada, o STF poderá levar meses ou anos para decidir quais os processos penais deverão continuar sendo analisados no tribunal, já que esse tipo de avaliação, segundo ele, terá de levar em conta “vários pontos de vista”. 

Controle de excessos

O ministro Gilmar Mendes seguiu com a mesma posição de Moraes. Afirmou que o STF pode vir a fazer “populismo institucional” caso os ministros da corte passem a tratar o fim da prerrogativa de foro como o que chamou de “panaceia para a impunidade no Brasil”. 

Isso porque, ao dar seu voto, Luís Barroso citou, ontem, números de processos que demoraram anos para serem julgados porque os réus ficam mudando de foro, quando deixam de exercer um cargo, muitas vezes sendo nomeados por aliados e pedindo exoneração propositadamente até que o crime prescreva. “Basta ler os jornais para percebermos que isso acontece todo dia”, argumentou o ministro relator.

Mendes, discordou e defendeu que o Supremo tem a função de controlar excessos. Segundo ele, alguns inquéritos se alongam indevidamente porque não se fez investigação e não, por conta do foro privilegiado propriamente. “Eventuais demoras não podem ser creditadas exclusivamente ao STF. De fato, tem de haver outra disciplina para o foro, mas não podemos vender a ilusão para a população que este é o problema, quando temos um sistema altamente ineficiente no primeiro grau”, criticou.

Votaram acompanhando a posição do relator o ministro Marco Aurélio de Mello e as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia (presidenta da Corte). Os demais ministros só vão dar seu voto após a devolução dos autos e retomada do julgamento.

Contra o ‘ativismo’

Alexandre de Moraes já se manifestou anteriormente dizendo ser contrário a decisões tomadas pelo Judiciário que digam respeito aos outros poderes. Durante sua sabatina no Senado, chegou a afirmar que considera o ativismo judicial “um perigo para a democracia”, especialmente no Supremo, porque poderia levar o Judiciário a avançar sobre atribuições de outros poderes.

Sucessor do ministro Teori Zavascki, morto no início do ano em um acidente aéreo ainda em investigação, Moraes assumiu um acervo de 7 mil processos ao tomar posse, mas não pegou a relatoria dos processos referentes à Lava Jato, que também estavam com Zavascki. Estes, foram transferidos para o ministro Edson Fachin.

O caso que está sendo julgado, cuja decisão determinará como ficará o foro privilegiado para políticos daqui por diante, diz respeito à restrição de foro do prefeito de Cabo Frio (RJ), Marcos da Rocha Mendes.

Rocha Mendes chegou a ser empossado como suplente do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mas renunciou ao mandato para assumir a prefeitura de Cabo Frio. Ele responde a uma ação penal no STF por suposta compra de votos, mas, em função da troca de cargo de deputado para prefeito, o processo no qual é réu foi remetido para a Justiça do Rio de Janeiro.

É essa situação, que tem sido observada com constância na corte em relação a vários políticos, que tomou como base o prefeito fluminense, que está​ sendo julgada. Mediante pedido protocolado pela Procuradoria-Geral da República para que o STF ponha fim à questão. A decisão se refletirá em inúmeros processos contra políticos de todas as esferas do país.