Temer na fragilidade

Deputados tentam condicionar discussão da Previdência a eleição direta

Articulação, feita por meio de requerimento para fazer caminhar PEC que trata do assunto, foi rejeitada pela comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, mas causou nervosismo na base aliada

Jean-Marc Ferré/ UN Photo

Maria do Rosário: mudanças propostas por um governo envolvido em denúncias de corrupção

Brasília – Deputados da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara só aceitaram discutir hoje (14) a admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287, que trata da reforma da Previdência, depois de inverter a ordem dos trabalhos e apreciar um requerimento para incluir na pauta outra PEC, a de número 227. De autoria de Miro Teixeira (Rede-RJ), esta PEC pede a realização de eleições diretas para presidente da República e vice, caso os dois saiam dos respectivos cargos entre o terceiro ano de mandato e os seis meses anteriores ao seu término. O requerimento foi rejeitado, mas provocou um ambiente de nervosismo entre os parlamentares da base aliada e deixou ainda mais à mostra a fragilidade do governo Temer.

Mesmo com a rejeição do pedido para votar a PEC 227, os oposicionistas deixaram claro que o acordo valeu apenas para hoje: eles pretendem rediscutir a matéria a partir de 2017. A inclusão da proposta de Miro Teixeira na pauta da comissão foi mais uma estratégia dos parlamentares contrários às mudanças nas regras previdenciárias, que argumentaram não considerarem possível o Congresso votar, em meio a toda a instabilidade política observada, medida tão impopular e que vai mudar radicalmente a vida dos brasileiros.

“Principalmente, em se tratando de mudanças propostas por um governo envolvido em denúncias de corrupção e com um mandatário que não se sabe dizer por quanto tempo ficará no cargo”, afirmou a deputada Maria do Rosário Nunes (PT-RS).

Os integrantes da CCJ também firmaram um segundo acordo, que teve o aval do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por meio do qual, mesmo que eles aprovem na noite desta quarta-feira a admissibilidade do texto da PEC da reforma da Previdência, a instalação da comissão especial mista que vai tratar da matéria só acontecerá após a retomada dos trabalhos legislativos, em fevereiro.

Com isso, partidos como PT, Rede e Psol, que tentavam obstruir a sessão, aceitaram debater o relatório ainda hoje. “Mas quero lembrar aqui que aceitamos esse acordo em relação ao procedimento de trabalho da comissão. Não fizemos acordo algum quanto ao mérito do texto”, alertou o líder da Rede, Alessandro Molon (RJ).

‘Proposta perversa’

Durante a discussão, os deputados trocaram muitas acusações uns com os outros. Júlio Delgado (PSB-MG) afirmou que a comissão deveria ter aprovado requerimento que pediu para ser adiada a apreciação da reforma previdenciária quanto ao mérito. Delgado ponderou que muitos integrantes da CCJ podem ser trocados com a mudança da composição das comissões,  no próximo ano – quando haverá eleição para escolha da mesa diretora da Casa e presidências das comissões técnicas. E isso, segundo ele, atrapalhará os trabalhos.

Também Alessandro Molon criticou a PEC da Previdência, que em sua opinião reduzirá a programação de descanso de muitos brasileiros, que já estão se programando para trabalhar até o final de suas vidas. “É uma proposta perversa, apresentada por um governo ilegítimo, impopular e que atende diretamente aos interesses da iniciativa privada”, acusou.

Já em relação à proposta que abre uma brecha para a realização de eleições diretas no país, no caso da saída do presidente – mudando assim as regras atuais, que estabelecem que, se Michel Temer não renunciar nem sair do cargo até o final do ano, as eleições terão de ser realizadas por via indireta – a discussão foi mais acirrada. Um dos principais debatedores em defesa do governo foi o ex-líder do PMDB Danilo Forte (CE), que considerou a sugestão “despropositada”.

De acordo com o deputado, “o momento é de darmos um aval ao governo que aí está para que possa implantar as medidas de ajuste para a retomada da economia, não de discutirmos, diante de uma crise tão grande, questões que levem em conta hipóteses da saída do presidente”.

Danilo Forte foi contestado por vários parlamentares, que lembraram as denúncias feitas em delação premiada pelo ex-executivo da Odebrecht Cláudio Melo Filho, no último final de semana, contra ministros do Executivo e o próprio Michel Temer.

O deputado Esperidião Amin (PP-SC), que é o relator desta proposta (de eleições diretas), pediu que a PEC passe a tramitar  em caráter imediato na Câmara, “em nome da segurança jurídica do país”.

‘Momento oportuno’

Amin, mesmo fazendo parte de um partido da base do governo, lembrou que a Câmara aprovou regra prevendo realização de eleições diretas até seis meses antes do fim do mandato para prefeitos e vice-prefeitos, governadores e vices – o que, inclusive, está sendo questionado no Supremo Tribunal Federal (STF). E, por isso, considera que nada é mais oportuno que também incluir, nessa discussão, a questão das regras para presidente da República e vice.

“Dessa forma poderemos sanar uma dúvida jurídica, porque fizemos regras, mas a Constituição ficou com uma previsão diferente para a presidência da República”, acrescentou ele.

Num dos momentos mais tensos da discussão, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) chegou a fazer ameaças de que se não conseguisse expor seus argumentos, diante do tom acirrado dos debates, iria se levantar para bater nos deputados da oposição que atrapalhavam o seu aparte. Marun foi rebatido por gritos de “golpista”.

“O governo Temer não está perto de acabar, ele já acabou”, disse também Júlio Delgado, em resposta ao destempero do colega.

“Como podemos falar em matérias como a reforma da Previdência sem discutirmos antes questões como essa? Temos uma crise gravíssima envolvendo o presidente da República e os governistas ainda querem desconversar quanto a isso. É claro que precisamos discutir essa questão das eleições diretas para a sucessão presidencial, sim. É um assunto atual e real”, afirmou o deputado José Guimarães (PT-CE).

Os parlamentares ainda estão acompanhando a discussão de todos os itens do relatório referente à PEC da reforma da Previdência. A expectativa é de que os trabalhos na CCJ entrem pela noite.

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