mobilização nacional

Ocupações contra políticas do governo Temer se espalham pela UFRGS

Além das várias unidades do Instituto Federal que já estavam ocupadas por estudantes no estado, alunos da UFRGS começam a ocupar as dependências de suas unidades

Reprodução/Facebook

Assembleia de estudantes da Fabico decidiu pela ocupação no início da noite desta segunda

Sul 21 – A mobilização nacional contra as políticas do governo Temer que congelam investimentos em educação, saúde e outras áreas do serviço público por até vinte anos, e que alteram a estrutura do ensino médio no país, chegou com força à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Agora, além das várias unidades do Instituto Federal que já estavam ocupadas por estudantes no estado, alunos da UFRGS começam a ocupar as dependências de suas unidades em protesto contra a PEC 241 (rebatizada de PEC 55 no Senado), a Medida Provisória 746, que determina uma reforma do ensino médio, e projetos como o Escola Sem Partido.

A primeira ocupação ocorreu no dia 26 de outubro, quando estudantes de Letras ocuparam o prédio do instituto no Campus do Vale. Na manhã desta segunda-feira (31) foi a vez dos estudantes da Faculdade de Educação que também decidiram ocupar o prédio da instituição localizado no Campus Centro. No final da tarde, ocorreram assembleias em várias outras unidades que decidiram também pela ocupação de seus respectivos prédios. Estudantes do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação (Fabico), Arquitetura, Urbanismo e Design, Psicologia, Serviço Social e Fonoaudiologia decidiram iniciar as ocupações ainda na noite desta segunda-feira.

Na noite desta segunda, integrantes da Ocupação da Letras faziam, por meio da página do movimento no Facebook, um pedido de doação de alimentos para a ocupação. Entre as doações mais urgentes estavam: ovos, queijo, presunto, patê (para pães), maçã, biscoito sortido, produtos de limpeza, iogurte de saquinho e água. Até às 22h de segunda-feira, estava confirmada a ocupação de 20 cursos na UFRGS: Letras, Biologia Marinha, Bacharelado Interdisciplinar, Educação no Campo, Pedagogia, Filosofia, Ciências Sociais, História, Arquitetura, Design, Psicologia, Fonoaudiologia, Serviço Social, Jornalismo, Publicidade, Relações Públicas, Biblioteconomia, Museologia, Arqueologia e Políticas Públicas.

UnB ocupada

Também na noite desta segunda, mais de 800 estudantes aprovaram em assembleia a ocupação da reitoria da Universidade de Brasília, contra a PEC 55 (antiga PEC 241), contra a Reforma do Ensino Médio, contra o projeto Escola Sem partido, pela permanência e ampliação das bolsas estudantis e em apoio à greve dos trabalhadores e as ocupações dos estudantes em todo Brasil.

Apoio da AJD

A Associação Juízes para a Democracia (AJD) divulgou, também nesta segunda, nota oficial em apoio às ocupações. Segue a íntegra da nota:

Nota Pública da Associação Juízes para a Democracia em defesa da livre manifestação de estudantes:

A Associação Juízes para a Democracia (AJD), entidade não governamental e sem fins corporativos, que tem dentre suas finalidades o respeito aos valores jurídicos próprios do Estado Democrático de Direito, vem a público afirmar o direito à livre manifestação de estudantes que participam de movimentos de ocupação das escolas e universidades no Brasil, diante da violência institucional que vêm sofrendo e da omissão do Estado em garantir seus direitos.

1. No dia 03 de outubro de 2016 iniciou-se, no Estado do Paraná, um movimento de ocupação das escolas e universidades públicas. A partir de tal mobilização, diversos outros estudantes brasileiros aderiram à manifestação e também passaram a ocupar escolas e universidades em todo o Brasil.

2. O movimento de ocupação das escolas tem como principal escopo rechaçar a Medida Provisória 746/2016 e a PEC 241, que no Senado adotou a numeração 55, as quais trarão modificações substanciais na educação pública e que não foram abertas ao debate amplo de toda a sociedade.

3. Tem-se visto, no início do presente século, uma série de manifestações por todo o mundo que demonstram a indignação das pessoas perante as promessas não cumpridas do sistema político: a revolução da liberdade e dignidade da Tunísia, a revolução egípcia, as insurreições árabes, os Indignados de Espanha e o Occupy Wall Street nos Estados Unidos são exemplos desse quadro.

4. Na América Latina, em 2006, ocorreu a Revolução dos Pinguins no Chile, onde estudantes ocuparam mais de 600 escolas reivindicando a gratuidade do exame de seleção para universidade e o passe escolar gratuito. Em 2015, mais de 200 escolas foram ocupadas em São Paulo contra o fechamento de unidades pelo governo paulista.

5. É a partir desse contexto que se deve voltar os olhos às atuais ocupações. Na sociedade em rede, a dinâmica das mobilizações sociais e dos meios de controle do Estado pela sociedade ganharam uma nova conformação e, consequentemente, o Direito deve acompanhar tais transformações a partir de releituras dos institutos jurídicos.

6. O direito à liberdade de expressão, estampado no art. 5º, IV da Constituição da República, permite que a liberdade de manifestar o pensamento, por meio da comunicação, ocorra entre interlocutores presentes ou ausentes. Na sociedade em rede, não é mais possível entender que vigore uma forma apartada de comunicação entre presentes de um lado e entre ausentes do outro, quando surgem, a todo momento, formas não usuais de manifestação, como é o caso das ocupações, que afetam um número considerável de pessoas, ganhando repercussão e gerando discussões sobre o evento.

7. Assim, partindo dessa constatação, é preciso considerar que as ocupações, na forma que sucedem em escolas e universidades, consistem em exercício de liberdade de expressão que permite, aos coletivos, grupos e movimentos sociais, a atenção do Estado e da sociedade para as suas demandas. Representam, em outros termos, legítimo direito tutelado pela Constituição da República.

8. Tais atos não configuram, portanto, esbulho sobre bens públicos. Conforme reconhecido judicialmente por ocasião da mobilização de estudantes ocorridas em São Paulo em 2015, o instituto possessório não guarda identidade com o ato de ocupação, uma vez que os alunos não pretendem ter a posse do prédio público, mas utilizá-lo para dizer à sociedade que a escola/universidade e a educação são temas que dizem respeito essencialmente aos alunos e que eles, enquanto sujeitos de direitos – amparados pela Constituição da República, pelo Estatuto da Juventude e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – podem manifestar-se acerca das pretendidas modificações na legislação pertinente.

9. Não se pode esquecer, ainda, que os estudantes das escolas e universidades trazem a esperança de um novo tempo com a intervenção da sociedade nas questões públicas, na medida em que buscam estabelecer um diálogo duradouro com o Estado. A democracia de alta intensidade, projetada em Constituição que promete a construção de sociedade livre, justa e solidária (art. 3o, I), impõe a permanente participação social na gestão pública, não se limitando, pois, às formalidades eleitorais.

10. Por tudo isso, a Associação Juízes para a Democracia (AJD), no exercício da liberdade de associação também consagrado constitucionalmente (art. 5o, XVII), vem a público afirmar que as ocupações nas escolas e universidades, como forma de protesto, representam legítima expressão do direito à livre manifestação, clamando para que o Estado promova o diálogo efetivo com estudantes.

São Paulo, 31 de outubro de 2016.

A Associação Juízes para a Democracia.

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