Posição

Governadores do Nordeste rejeitam PEC 55 ‘local’ e cobram de Temer ações para ajuste

Grupo resiste à chantagem do governo federal, que quer vincular a liberação das multas da repatriação à adoção de medidas que congelem gastos em saúde e educação nos estados

Sumaya Villela / Abr

Reunião em Pernambuco: estados do Nordeste rejeitam austeridade com custos sociais, imposta por Temer e Meirelles

São Paulo – Os governadores do Nordeste divulgaram, neste sábado (26), após reunião , carta aberta em que destacam”a importância do diálogo sobre as receitas públicas, com a redução da taxa de juros, além de medidas de combate à sonegação fiscal e de justiça tributária”, afirmando que os estados do Nordeste já estão fazendo o ajuste fiscal pretendido pelo governo federal com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55, “tanto em relação às despesas quanto às receitas.”

Os governadores do Nordeste decidiram, após reunião do Fórum dos Governadores do Brasil, em Recife, iniciada na noite de sexta-feira (24), que não concordam com a proposta de ajuste fiscal feita pelo governo Temer como condição para que os estados da região tenham acesso a parte dos recursos das multas do programa de regularização de ativos não declarados à Receita, conhecido como Lei da Repatriação.

Em carta que pretendem entregar a Temer amanhã, o grupo afirma que os estados do Nordeste já estão fazendo o ajuste fiscal pretendido pelo governo federal com a PEC/55, “tanto em relação às despesas quanto às receitas” e que não é possível relacionar as duas questões ou determinar um modelo de ajuste único para todas as unidades da federação. Eles informaram ainda que se negam a retirar as ações que correm no Supremo Tribunal Federal (STF) para receber os valores, como desejado por Temer.

O governador de Pernambuco, Paulo Câmara, foi o porta-voz dos chefes dos Executivos estaduais. “O que nós temos muito claro é que já estamos fazendo ajustes, temos esse compromisso, e que não vamos confundir ajuste com essa questão da repatriação. São assuntos distintos, está judicializado, se puder se chegar a um acordo, ótimo”, afirmou.

As multas da repatriação são aplicadas sobre ativos mantidos por brasileiros no exterior que não recolheram impostos de forma indevida. O montante estimado pelos estados a ser recebido é de cerca de R$ 5,2 bilhões. Existe um impasse sobre o direito dos estados e municípios em receber parte dos valores arrecadados com as punições, o que levou governos estaduais a judicializar o caso.

Na terça-feira (22), Michel Temer recebeu os governadores de todas as unidades da federação e anunciou que o governo federal “se anteciparia” à decisão do STF e liberaria os recursos. Em contrapartida, os estados precisariam fazer ajustes fiscais semelhantes aos propostos nacionalmente pela União, como a PEC 55, que estabelece um teto para investimentos públicos, por duas décadas, de acordo com a inflação do ano anterior.

O governo também tenta impor aos governos que desistam das ações judiciais. Sobre esse ponto, Câmara respondeu que os estados nordestinos vão manter os processos. “Vamos aguardar a Justiça. Temos uma liminar que já garantiu o depósito em juízo e a gente entende que a multa tem que ser repartida entre estados e municípios”, informou.

Leia a seguir a carta dos governadores do Nordeste endereçada à gestão de Michel Temer.

Carta dos Governadores do Nordeste

Recife, Pernambuco

Reunidos na cidade do Recife (PE), no dia 25 de novembro de 2016, os governadores do Nordeste vêm a público informar a sua concordância e compromisso com o necessário equilíbrio fiscal em nossos respectivos Estados, tão necessário à retomada do crescimento, e nos associamos à preocupação do Governo Federal, mas não podemos deixar de esclarecer todo o conjunto de esforços que já vem sendo realizado pelos Governos Estaduais.

Números apurados pela União, divulgados pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN), refletem a estratégia adotada pelos Estados em seu esforço fiscal, tanto em relação às despesas quanto às receitas, e demonstram que o ajuste é uma realidade, não uma promessa.

O conjunto dos Estados saiu de um deficit primário de R$ 9,5 bilhões, em 2014, para um resultado positivo de R$ 6,5 bilhões ao final de 2015. Além disso, a despesa primária, que a União pretende atrelar ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), cresceu apenas 2,36% entre 2014 e 2015 – bem abaixo do IPCA, que ficou em 6,41% em 2014.

Enquanto a despesa primária cresceu apenas 2,36%, a receita bruta cresceu 5,38% em 2015. Destaque-se neste resultado o crescimento de 7% das receitas de arrecadação própria. Enquanto isso, as receitas provenientes das transferências da União aos estados cresceram apenas 1% nominal no período.

Diante do exposto, chamamos atenção, também, para a importância do diálogo sobre as receitas públicas, com a redução da taxa de juros, além de medidas de combate à sonegação fiscal e de justiça tributária. Do mesmo modo, sublinhamos nosso interesse em ver o andamento de temas essenciais ao desenvolvimento da Nação e de modo especial para o povo do Nordeste brasileiro e da retomada da geração de emprego e renda, tais como:

a) ações de convivência com a seca e a retomada da Transposição do Rio São Francisco e demais obras hídricas;

b) a retomada das obras da Transnordestina e de outras obras de infraestrutura;

c) a liberação de empréstimos;

d) a liberação dos recursos do fundo penitenciário e ações de segurança pública;

e) o fortalecimento do Banco do Nordeste e do Fundo Constitucional do Nordeste;

f) a apresentação de alternativas para o subfinanciamento do SUS e o enfrentamento das arboviroses;

g) a priorização da Região Nordeste no programa de concessões e novos leilões da ANP.

Por fim, abertos ao diálogo e integrados ao Fórum dos Governadores do Brasil, defendemos ações integradas com a União e municípios, sempre respeitando a autonomia das unidades da Federação, como o direito de fazer cumprir a receita da multa da repatriação como assegura a lei, e compromisso de trabalhar pelo equilíbrio fiscal para ampliar investimentos voltados para o desenvolvimento econômico e social.


Leia também

Últimas notícias