Congelamento de gastos

Senadores dizem que, com eles, PEC 241 ‘terá de ser bem debatida’

Para especialistas, congelamento dos gastos públicos não garantirá estabilização da economia. Reforma tributária, com impacto sobre os mais ricos, teria melhor efeito

Edilson Rodrigues/Agência Senado

Senadores da oposição dizem que matéria no Senado terá outras tramitação, com a participação de especialistas

Brasília – Um dia após a aprovação, na Câmara, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que congela os gastos públicos por 20 anos, a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado iniciou as discussões sobre a matéria naquela Casa,  ao lado de especialistas e parlamentares. A professora da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP) Laura Carvalho disse que a proposta do governo Temer em nada garante a estabilização da economia. Já o professor Jessé Souza, ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e professor de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense (UFF), afirmou que não consegue”entender a inteligência da classe política do país ao aceitar a proposta”.

Souza ainda destacou que quando a população sofrer as consequências das medidas “cobrará isso, a longo prazo, dos parlamentares”. Os senadores da oposição, que criticaram o resultado da votação em primeiro turno do texto pela Câmara, na noite desta terça-feira (10), lembraram que a matéria ainda terá de ser aprovada no segundo turno, previsto para o próximo dia 24, para só depois, se aprovada, ser submetida à apreciação do Senado, onde acreditam que a tramitação será diferente.

“Não acreditamos que a Câmara vire o jogo em relação a esta matéria mais. Mas esperamos fazer um outro tipo de discussão sobre o tema nesta casa, com amplo debate e a ajuda de vários especialistas”, afirmou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).

Laura Carvalho foi taxativa ao responder ao senador Cristovam Buarque (PPS-DF), favorável à proposta, que questionou que medidas os que se colocam contrários à PEC adotariam no lugar. “Existem outras alternativas, senador”, disse, ao afirmar que seria mais eficiente, para sanar as contas públicas, uma reforma tributária para reduzir os altos impostos pagos pelos que recebem menos e ampliar a carga tributária para os que ganham mais e são, hoje, os maiores sonegadores.

A professora ainda destacou que, na mesma medida, sugeriria ao governo acabar com todas as desonerações fiscais concedidas sem contrapartida, que, a seu ver, foram medidas equivocadas adotadas no governo Dilma Rousseff.

Jessé Souza reforçou que quem arca com os principais impostos do país atualmente é a população que recebe até três salários mínimos. Segundo ele, os ajustes que estão em curso consistem numa rearticulação da forma como a política é exercida no país e, em sua opinião, “representam a desconstrução de um Estado social que nos últimos anos tirou 44 milhões de pessoas da extrema pobreza”.

“A PEC não faz sentido. O que está em jogo é a captura da política brasileira da reversão do pacto instalado no país com a Constituição de 1988”, avaliou.

‘Remédio errado’

Para a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidente da comissão, o debate está apenas começando e os senadores cobrarão que a PEC seja bem detalhada na Casa, assim que receberem o texto da proposta. De acordo com a senadora, a proposta provocará estagnação econômica no país. “Entendo que limitar os gastos, nesse momento, não consiste numa medida prudente”, afirmou.

“Estamos usando o remédio errado para a situação. Estamos cortando despesas quando, na realidade, estamos numa situação de crise em que o sistema privado não consegue gastar e famílias não gastam. Quem tinha que gastar é o governo (investindo em obras de infraestrutura e ampliando serviços públicos para criar empregos na iniciativa privada). Nós vamos entrar num círculo vicioso, o que vai ser pior”, acrescentou a senadora.

Lídice da Mata (PSB-BA) apontou contradição simbólica do governo Temer, “que ao mesmo tempo em que trabalha para fazer um congelamento de gastos públicos paga um caro jantar para deputados com o intuito de defender a PEC”. “Sabemos da situação do país e das escolhas que estão sendo feitas, totalmente direcionadas para priorizar o capital privado, em vez dos mais pobres, afirmou ela.

‘Desculpa para governo’

Para Laura Carvalho, a PEC serve como justificativa para apresentar medidas duras e antipopulares, que retiram direitos e garantias sociais, em nome da questão fiscal. Funciona como uma desculpa para aprovar a reforma da previdência, para alterar o sistema de saúde pública e de educação, ressaltou.

Lindbergh expressou que um ajuste como o previsto na PEC 241 impediria a retomada do crescimento, além de privilegiar setores já privilegiados da sociedade. No pagamento de juros (pelo serviço da dívida pública a banqueiros) a PEC não toca. Então, em relação à despesa primária, o impacto vai ser gigantesco, principalmente em saúde e educação.