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Renovada, Dilma reaparece no Rio e pede resistência e luta pela democracia

'Estou feliz de estar aqui, apesar de manter no meu coração a tristeza da injustiça e a consciência de que neste país deram um golpe', disse, na Cinelândia, a presidenta deposta

Roberto Stuckert Filho

Sutilmente, Dilma descartou a possibilidade de retornar agora à Presidência e defendeu conquista dos governos petistas

Rio de Janeiro – Na primeira aparição pública desde seu afastamento definitivo da Presidência da República, em 31 de agosto, Dilma Rousseff foi a principal atração na noite de ontem (21) do ato organizado pela candidatura da deputada federal Jandira Feghali (PCdoB) à prefeitura do Rio de Janeiro. Com o tradicional espaço da Cinelândia (região central da cidade) ocupado por milhares de pessoas, o ato em favor da candidata comunista, que tem o apoio do PT, acabou se transformando em uma grande manifestação contra o golpe praticado no governo federal e em defesa da democracia. Sorridente e com um semblante muito mais leve do que aquele que exibia nas semanas que antecederam o impeachment, Dilma dá sinais de estar superando o martírio político.

O contato com o público carioca, de quem recebeu abraços, flores e muitos aplausos, mostrou que a presidenta afastada ainda tem um papel político a desempenhar: “Boa noite, queridas e queridos!”, disse Dilma em uma saudação que já começa a ser adotada como bordão, antes de lembrar que foi na mesma Cinelândia o primeiro comício de sua campanha na vitoriosa eleição de 2010. “Estou feliz de estar aqui, apesar de manter no meu coração a tristeza da injustiça e a consciência de que neste país deram um golpe parlamentar e tiraram uma presidenta eleita por 54 milhões de votos sem que ela tenha cometido qualquer crime que seja. Minha alegria se dá porque eu tenho a certeza de que nós somos um país de pessoas que são capazes de resistir e de lutar.”

Dilma, que recebeu pelo menos meia dúzia de buquês no palco, comentou o recente movimento de entrega de flores à presidenta afastada, que teve início quando o presidente Michel Temer, ainda interino, ordenou que fossem retiradas todas as flores do Palácio do Planalto. Quando souberam disso, algumas mulheres espontaneamente começaram a enviar flores à Dilma, e esse movimento não para de crescer. “Esse recebimento de flores é um carinho não só a mim, mas à democracia brasileira. Vocês estão cobrindo de flores a democracia brasileira”, disse.

Sutilmente, Dilma descartou a possibilidade de retornar agora à Presidência e mostrou que a luta popular chega a outro patamar: “Muitos de vocês gritam para mim ‘volta, Dilma’. Eu agradeço e entendo. E acho que tem um lado desta fala que está para além do meu mandato. É uma defesa que vocês fazem da democracia e da legalidade”. Essa defesa, disse, é mais importante do que nunca. “Está em andamento no país um processo sistemático de ruptura constitucional. Primeiro, atacaram a mim. Agora, estão atacando ao Lula, e fazem isso de uma forma muito golpista. Quanto a mim, vocês sabem como as coisas se passaram”, afirmou, ressaltando que o Brasil vive momento de retrocesso, com expectativa de congelamento de gastos em educação e saúde.

Dilma fez uma defesa das conquistas dos governos petistas: “Desde a eleição do Lula, nós subimos um pequeno degrau na redução da desigualdade monumental que existe neste país, conseguimos tirar milhões da miséria, demos acesso ao ensino universitário a quem não tinha acesso à educação”, disse. Ela alertou sobre a possibilidade de ruptura com esses avanços sociais pelo governo Temer. “É preciso investir em tecnologia e inovação, e não tirar recursos da educação. Depois de afastar as pessoas da miséria, o mais importante é garantir uma educação de qualidade.”

Apoio a Jandira

Sobre a ameaça de crescimento do desemprego, Dilma se dirigiu especificamente aos trabalhadores de estaleiros, presentes em bom número no ato da Cinelândia. “Querem mais uma vez exportar plataformas do exterior. Ora, há 70 mil trabalhadores que tem oportunidade de trabalho qualificado se o Brasil continuar com a política de comprar aqui o que é produzido aqui. A candidatura de Jandira no Rio tem esse compromisso com o conteúdo nacional e com os trabalhadores de estaleiros”, disse.

A ex-presidenta também associou a eleição da candidata comunista à luta em defesa da democracia. “Eleger Jandira prefeita aqui no Rio de Janeiro é um ‘volta, Dilma’. Eleger a Jandira significa a retomada da democracia. Eu acho que nós somos capazes de virar esse jogo”, afirmou. O fato de o Rio nunca ter tido uma prefeita também não foi esquecido. “Jandira tem trajetória de luta, integridade, coragem e capacidade de trabalho. É uma mulher guerreira. Ela foi a relatora da Lei Maria da Penha. Isso mostra seu protagonismo, sua liderança, levando essa bandeira fundamental para as mulheres do nosso país”, acrescentou.

Três dores

No momento mais emocionante do ato, Dilma afirmou que sofreu “três grandes dores” em sua vida. “Eu sofri a dor indizível da tortura. Sofri também ao enfrentar uma doença de que todos temos muito receio, que é o câncer. Tem uma dor, essa da injustiça, que é a terceira grande dor que eu sofri na minha vida. Mas uma coisa muito importante é esse apoio, a força de vocês. O fato de vocês terem se mobilizado, de terem ido para a rua defender a democracia nesse país. Eu encontrei a energia para resistir em vocês”, disse.

Além de Dilma e Jandira, falaram ao microfone durante o ato o senador Lindbergh Farias (PT), a deputada federal e ex-governadora Benedita da Silva (PT) e o ex-ministro da Igualdade Racial Édson Santos, petista que é candidato a vice na chapa da comunista. Também marcaram presença parlamentares do PCdoB e do PT e dirigentes sindicais e de movimentos sociais como o MST, entre outros, além de dissidências do PDT e do PSB.

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