Produção legislativa

Comissão de impeachment, São João e São Pedro reduzem ritmo de senadores

Temor dos líderes é de que atenção para com sessões da CEI suscite baixa de guarda pelos partidos na discussão de matérias polêmicas, mas todos reconhecem que não podem deixar de marcar presença por lá

Jeferson Rudy/Ag. Seando

Renam Calheiros, presidente do Senado, que encurta dias de trabalho, carregados de temas polêmicos. Festas juninas são justificativa

Brasília – Apesar da importância dos trabalhos da Comissão Especial do Impeachment (CEI), o fato das sessões estarem monopolizando os senadores que a integram, suplentes e outros que costumam passar por lá para acompanhar os debates começa a ser sentido com mais ênfase no Senado e a atrasar o rito de tramitações da Casa.

Um dos maiores exemplos foi anunciado esta semana: a troca dos integrantes da comissão que trata da apreciação das matérias da chamada Agenda Brasil – um dos documentos com supostas propostas “para o desenvolvimento” com que o PMDB começou a romper com o governo Dilma, apresentado ainda no final do ano passado. Como apenas dois parlamentares da comissão não pertencem à CEI, as reuniões vêm sendo suspensas há mais de 30 dias.

Matérias que se encontram prestes a entrar na pauta do plenário, mas estão sob pedidos de vistas nas comissões por conta do temor de que não sejam bem discutidas, também estão paradas. Sem falar que, vez por outra, parlamentares do governo ou da oposição são pegos de surpresa durante votações de projetos polêmicos.

“Não vou admitir publicamente para dar gosto ao pessoal desse governo provisório, mas precisamos manter uma base fixa de aliados na comissão do impeachment para garantir nossos argumentos. E isso, além de esvaziar o plenário, termina deixando a rédea menos curta para que façam manobras e consigam aprovar matérias tidas como negativas”, disse reservadamente um senador do PT.

Ontem (21), por exemplo, enquanto os parlamentares estavam na tomada de depoimentos das testemunhas de defesa da presidenta afastada Dilma Rousseff, senadores do grupo privatista conseguiram aprovar, da forma como queriam, o projeto referente ao chamado Estatuto das Estatais. Segundo representantes do Comitê de Defesa das Empresas Públicas, o texto apresenta vários pontos negativos e abre brechas para a privatização dessas companhias.

Por parte dos pró-impeachment também há constatação de que os trabalhos estão prejudicados. “Se a gente fica muito no plenário, pode ver algum requerimento em favor da presidenta afastada ser aprovado na CEI. Se ficamos muito lá na comissão, deixamos as votações descobertas e não podemos ajudar os colegas que aqui se encontram”, disse um senador do DEM.

Para muitos líderes partidários, o ideal é tentar reduzir o ritmo das reuniões nas comissões técnicas e no plenário até o encerramento das atividades referentes ao processo de impeachment. Mas nem todos concordam com a ideia e acaba ocorrendo um revezamento entre os integrantes das bancadas.

Como a CEI costuma abrir as reuniões entre 10h e 11h, constantemente seu presidente, senador Raimundo Lira (PMDB-PB), suspende as atividades por uma ou duas horas para que todos compareçam ao plenário, votem as matérias previstas para o dia e retornem para a tomada de depoimentos.

Agenda Brasil

No momento, a preocupação dos senadores se dá com três itens, em especial. Além da escolha dos nomes que vão integrar a nova comissão da Agenda Brasil, também figuram nessa lista uma mudança proposta para a Lei Maria da Penha (que foi adiada para a próxima semana e consiste em tema que ainda não tem consenso) e o reajuste dos salários dos servidores do Judiciário.

No caso da Agenda Brasil, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) afirmou que pediu que, na recomposição, seja respeitado o critério da proporcionalidade partidária e que os partidos possam indicar os nomes – uma vez que o último colegiado foi indicado diretamente pela presidência do Senado.

O pedido foi aceito pelo presidente, Renan Calheiros (PMDB-AL), que anunciou a mudança dessa composição e da de outras duas comissões pelo mesmo motivo: constantes adiamentos das reuniões programadas. São elas a de Aprimoramento do Pacto Federativo e a Comissão Mista Especial para Consolidação da Legislação Federal e Regulamentação de Dispositivos da Constituição.

Segundo Renan, existem 120 artigos constitucionais que aguardam regulamentação e um deles é o direito de greve no serviço público, o que acendeu as luzes dos representantes da bancada dos trabalhadores – formada, principalmente, por senadores do PT e do PCdoB. Na avaliação de Lindbergh Farias, “o governo interino abriu a caixa de ferramentas junto com a base parlamentar do golpe”.

Segundo o parlamentar, o primeiro ataque aos movimentos sociais foi realizado na Câmara, com a coleta de assinaturas para “uma grotesca” CPI da União Nacional dos Estudantes. “Agora, no Senado, surge na pauta uma ‘urgência’ para ‘regulamentar’ as greves do funcionalismo público”, disse Lindbergh. “É óbvio que a regulamentação do governo golpista não seguirá as normas da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O que desponta no horizonte é mais um ataque articulado ao movimento dos trabalhadores e suas organizações sindicais”, reclamou.

O senador também destacou a necessidade de serem equilibradas as pautas da Agenda Brasil. “Nosso diagnóstico hoje é que a pauta dessa comissão é formada só por matérias voltadas para a retirada de direitos dos trabalhadores. Queremos que nossos projetos, ligados a uma tributação mais progressiva, também sejam discutidos”, disse.

Dentre os itens citados por Lindbergh estão a tributação sobre lucros e dividendos dos bancos, tributação sobre grandes fortunas e a discussão do papel do Banco Central. “A pauta desta comissão precisa ser plural, para que haja o engajamento de todos os lados e de todas as bancadas parlamentares”, acrescentou.

Lei Maria da Penha

Em relação ao texto que apresenta mudanças na Lei Maria da Penha, coube à senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), que é procuradora da Mulher do Senado, pedir mais tempo para que a matéria vá a votação. Vanessa disse que o projeto suscita ainda discussões entre delegados, juízes e membros do Ministério Público, motivo pelo qual considera importante o tema ser bem discutido.

O projeto estabelece que os próprios delegados de polícia possam adotar medida protetiva para a mulher que for vitima de violência doméstica, sem precisar da ordem judicial, como forma de evitar demoras exageradas na adoção dessas medidas. “Não concordo que a medida protetiva demore além do que deve demorar. Mas não devemos transformar essa questão em um problema policialesco”, afirmou a senadora, que acha que qualquer modificação na legislação precisa ser amadurecida antes, “para evitar futuras contestações”.

No caso do reajuste dos salários dos servidores do Judiciário, o relator, senador Jorge Vian (PT-AC), afirmou que apesar de ser fruto de uma luta justa, a matéria tem carências graves. De acordo com ele, o texto “não cumpre a Lei de Responsabilidade Fiscal nem os preceitos que a Constituição estabelece”. Por conta disso, Viana apresentou ontem um parecer da proposta na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) destacando que não há o um cálculo devido nem o valor do impacto a ser observado no Orçamento da União com o reajuste.

Embora tenha dado parecer pela aprovação do projeto, Jorge Viana disse esperar que a apreciação da matéria, no plenário do Senado, esteja condicionada à apresentação de todos os documentos que a Lei de Responsabilidade Fiscal exige, com as planilhas, mostrando o impacto orçamentário ano a ano desse reajuste. Ele solicitou ao procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, e ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, que providenciem esses dados junto aos conselhos nacionais dos respectivos órgãos para remessa ao Senado.

E em meio às pautas polêmicas, adiamentos e correrias para a aprovação de matérias de interesse de cada bancada, que fazem a agenda do Senado seguir de forma pouco convencional, os parlamentares se preparam para uma parada estratégica nos próximos dias. A Casa tem como foco, no momento, a apreciação do pedido que vai decidir de uma vez por todas se a presidenta Dilma Rousseff será afastada do cargo ou não. Mas pretende se render à homenagem a dois santos populares no país.

A partir de amanhã até a próxima semana, os dias de trabalho serão mais curtos, por conta das festas juninas nos vários estados. E muitos senadores esperam que as matérias com tramitação adiada só tenham seguimento a partir do inicio de julho.

Eles contam com a ajuda de São João e de São Pedro para que isto aconteça. “O ano está sendo de muito trabalho e, ao mesmo tempo, produtividade menor em termos de apreciação de matérias, porque é claro que o trabalho da CEI monopoliza mais. Pelo menos neste ano, que é de eleições municipais, nas festas de São João e São Pedro todos precisarão visitar os municípios do interior dos seus estados e cumprimentar as bases”, disse o senador José Maranhão (PMDB-PB).

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