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Temer janta com senadores indecisos, pede votos e nega tratar de impeachment

Comentários de bastidores no Senado são que presidente interino e equipe se articulam para convencer os que estariam em dúvida a manter o voto pelo afastamento de Dilma

Beto Barata/PR

Presidente interino, Michel Temer, grava entrevista para a GloboNews. Declarações sobre participação no impeachment desmentidas pelas ações, no mesmo dia

Brasília – O assunto mais destacado do Congresso hoje (22) não foi a comissão especial do impeachment, tampouco a sessão de ontem do Senado Federal, que aprovou projetos polêmicos. Foi a divulgação de entrevista concedida pelo presidente interino, Michel Temer, ontem, na qual ele afirmou que não está se metendo no processo do impeachment e tem evitado conversar a respeito com senadores.

A afirmação foi vista como, no mínimo, contraditória. Ontem mesmo, o Palácio do Planalto recebeu para uma conversa o senador Eduardo Braga (PMDB-AM) – que se ausentou na votação de 11 de maio. À noite, Temer participou de um jantar realizado em sua homenagem ao lado de vários senadores. Circulou de mesa em mesa e conversou, principalmente, com parlamentares tidos como indecisos sobre a forma como se posicionarão na votação final do processo.

O jantar foi realizado na casa do senador Zezé Perrella (PTB-MG), ex-integrante do PSDB, cujo filho, Gustavo Perrella, foi nomeado na última semana para um cargo estratégico no Ministério do Esporte. O nome dos Perrella entrou para o folclore político associado ao helicóptero apreendido em 2013 pela Polícia Federal, transportando meia tonelada de cocaína. A PF concluiu que ele não tem envolvimento com o tráfico de drogas e a culpa pelo transporte foi atribuída ao piloto da aeronave.

O objetivo declarado do jantar foi confraternizar com senadores e integrantes da nova equipe do governo. Mas o evento soma esforços ao trabalho de convencer o grupo de senadores que votaram pelo impeachment e podem mudar o voto, em desfavor do governo provisório.

Entre esses senadores tidos como indecisos, estiveram presentes Omar Aziz (PSD-AM), José Hélio (PMDB-DF), Wellington Fagundes (PR-MT), Romário (PSB-RJ) – este último, ora dá depoimento dizendo que votará pelo impeachment, ora diz que continua avaliando o processo – e Roberto Rocha (PSB-MA). Todos já afirmaram que vão “aguardar os desdobramentos dos acontecimentos”.

O senador Cristovam Buarque (PPS-DF), cuja presença no jantar de ontem ainda não foi confirmada, é outro indeciso, e seu “caso” está sendo tratado em separado. Buarque fez muitas críticas ao governo Dilma Rousseff nos últimos anos e admite ter votado pela admissibilidade do impeachment não por eventual crime de responsabilidade, mas “pelo conjunto da obra” da presidenta – o que não é objeto legal para impedimento.

‘Grande responsabilidade’

Buarque foi chamado para um jantar a sós com o presidente interino no Palácio do Jaburu na semana passada. Seu discurso, porém, continua sendo de que votou em maio pela admissibilidade do impeachment e agora não será assim, terá de analisar bem o processo, antes de formar opinião sobre o mérito e a comprovação de crime por parte da presidenta afastada. “Isto não é votar, é julgar. E precisamos ter consciência da grande responsabilidade que temos pela frente”, costuma afirmar.

Na avaliação dos peemedebistas, existem no Senado 19 parlamentares que ajudaram a provar o impeachment e agora podem mudar de voto, dando acenos de que podem votar contra o processo e pelo retorno de Dilma Rousseff ao Palácio do Planalto.

Esse número é diferente da contagem feita pelos petistas, que têm garantidos os 22 votos contrários ao impeachment e calculam em aproximadamente 10 o número dos que estavam entre 55 votos a favor do afastamento que podem mudar de posição.

O líder do PMDB, senador Eunício Oliveira (CE), negou essas estimativas. Segundo ele, a conta mais pessimista do partido é de que conseguirão 58 votos favoráveis ao impeachment. E na mais otimista, 62. Temer precisa de 54.

Eduardo Braga

Outra disputa acirrada tem sido em relação ao senador Eduardo Braga (PMDB-AM). Ministro de Minas e Energia do governo Dilma Rousseff, Braga foi um dos últimos peemedebistas a deixar o cargo e até cogitou permanecer até o fim com Dilma, licenciando-se do partido. No final, cedeu e entregou o cargo por pressões políticas do seu estado, Amazonas.

O senador, no entanto, deu várias declarações criticando a postura da legenda que integra de romper com o governo e se ausentou da votação do impeachment, apresentando na véspera um pedido de licença médica. Desta vez, o senador tem dito que pretende votar. Mas, da mesma forma que seu voto tem sido computado como certo por colegas do PT e do PCdoB, agora ele começa a ser sondado por caciques do PMDB.

Braga se reuniu ontem com o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha. Não comentou o teor da conversa, mas ficou óbvio que Temer, ao contrário do que afirmou, está se mexendo e muito se manter no governo.

Uma estratégia que tem sido observada e mantém os olhos e ouvidos atentos por parte dos senadores pró e contra impeachment, reside no acordo firmado no início da semana entre Executivo e governadores, pelo meio do qual o Executivo garantiu uma moratória de seis meses para o pagamento das dívidas dos estados e reinício de pagamento das parcelas – com generosos descontos escalonados.

O acordo, que terá um impacto de R$ 50 bilhões nas contas públicas, está sendo visto como mais uma forma de pleitear o apoio dos governadores junto aos senadores dos seus estados. O discurso do presidente em exercício, no entanto, foi outro: de que a busca do apoio dos governantes é legítima, mas diz respeito, apenas, à aprovação das medidas de ajuste fiscal.

Mas está cada vez mais forte, no Congresso, o entendimento de que o próprio Temer está disposto a deixar a votação das matérias referentes ao ajuste para depois. A intenção, agora, é centrar esforços nos aliados, avaliar quem vota e quem não vota pela manutenção do seu governo e evitar mudanças.

Por essas indicações todas é que causou, no mínimo, estranheza, entre os senadores contrários ao impeachment, a declaração do presidente interino durante a entrevista concedida ao jornalista Roberto D’Avila.