seminário na fpa

Energia das ruas desafia partidos e a busca de unidade contra o golpe

Protestos colocam em xeque modelo de representação política. Começa a ficar claro que os partidos que compreenderem o que a população deseja são os que vão aglutinar novas forças

Reprodução / Divulgação

Alencar, Macedo e Medeiros: debate sobre a estratégia a ser adotada para reconquistar a democracia no país

São Paulo – A construção de unidade na luta contra o golpe protagonizado pelo governo interino de Michel Temer é um desafio do campo progressista para aglutinar a energia das ruas e ganhar força. “Plebiscito, antecipação de eleições, a volta de Dilma, Constituinte Exclusiva, esses são temas sobre os quais não vamos construir unidade agora. A unidade é ‘Fora, Temer’”, afirma o presidente da Fundação Lauro Campos e membro da executiva nacional do Psol, Juliano Medeiros. Citando pesquisa de avaliação do governo da CNT/MDA com 14,9% da população que acredita que a vida piorou com Temer, Medeiros diz que esse percentual “é muito pouco, temos de construir massa crítica sobre o golpe, porque a tendência desse número é aumentar”.

“Se formos espremer posições aqui, é capaz de ficarmos divididos. Nós temos de nos debruçar muito sobre o que vem depois do ‘Fora, Temer’”, disse ainda o representante do Psol, ao participar ontem (16) de seminário promovido pela Fundação Perseu Abramo (FPA) para refletir sobre o golpe em curso e as alternativas de futuro para fortalecer as esquerdas na luta política. Medeiros defendeu que seja feito um balanço crítico da atuação dos governos Lula e Dilma e um programa para conduzir a luta. “Vamos ter de repensar qual é o programa das forças populares para o país no futuro. No passado, nós criticamos o problema da dívida do país, e quando chegamos ao poder não fizemos nada. A reforma agrária também é um exemplo. O país mudou muito, por isso é preciso pensar um novo programa”, disse.

A atualização programática da esquerda, segundo Medeiros, além de promover as reformas estruturais nas áreas tributária, agrária, urbana e política, deve soar como uma promessa de futuro com a qual a esquerda validará o seu perdão político, garantindo que os erros não serão repetidos, principalmente na relação de poder político com o capital privado. “Não nos limitaremos às reformas possíveis, há uma energia brutal nas ruas, a nova geração quer mais do que PT, Psol”, diz Medeiros.

“O que está em curso é um golpe que rasga o pacto do país”, afirma o membro da executiva do PCdoB e da Juventude Socialista Renan Alencar, referindo-se à Carta ao Povo Brasileiro, escrita por Lula em 2002 ao propor o governo conciliador que o elegeu por duas vezes. Alencar destacou que o impeachment começou a transitar graças a uma chantagem do então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), atualmente afastado pelo Supremo Tribunal Federal, que não recebeu apoio do PT no processo de cassação de seu mandato, alimentado por denúncias da Lava Jato. Alencar disse também que a agenda do governo interino não é capaz de ganhar qualquer eleição. “A sanha do retorno ao poder se deu com uma agenda ainda mais conservadora do que a apresentada pelo PSDB nas eleições de 2014. As coisas mais nefastas para o país entre as medidas do governo estão no teto de gastos para a saúde e educação”, afirmou.

Segundo o representante do PCdoB, a crise política foi alimentada pelo consórcio conservador do golpe, incluindo setores de mídia, Justiça e empresariado, enquanto do ponto de vista econômico a operação Lava Jato tem representado um ataque aos setores de petróleo e construção civil. “Há graves violações constitucionais nesses processos, e a fase do Mensalão já começou a refletir o desrespeito à Constituição”, disse. Alencar enfatizou que o golpe no país não é isolado, frente aos embates políticos em curso em outros países da América Latina, como Venezuela, Equador, Bolívia e Colômbia. “Estão tentando nos cercar novamente. A esquerda teve erros e insuficiências, mas temos de entender que a correlação de forças não é uma fotografia, mas um filme, ela muda toda hora”, destacou.

Como massa de bolo

“O PT vai ter de fazer um balanço profundo e sincero de tudo o que estamos vivendo”, disse o secretário de finanças do PT, Márcio Macedo, destacando que essa oportunidade ocorrerá no fim deste ano, quando será realizado um encontro do partido com 600 delegados eleitos entre os movimentos sociais. “O desafio é o que seremos no futuro”. Para Macedo, o tempo agora é de resistência e luta. “Os partidos não dão conta de absorver o debate nas ruas. Como vamos consolidar essa energia que pulsa nas ruas e não se adequa ao modelo (de representação política)? Senão, essa energia vai se dispersar e se encontrar em outro lugar”, defendeu.

Para Macedo, o golpe em curso expressa o rompimento de dois pactos no país. “Um é o pacto da democracia colocado na Constituição de 1988, e o outro é o rompimento do pacto de pacificação de classes inaugurado por Lula, no qual todos prosperaram”, destacou. Apesar das dificuldades e perspectiva de retrocessos, Macedo entende que a crise está promovendo o reencontro das esquerdas. “O lado bom é o reencontro com as massas nas ruas e a reafirmação de Lula como a maior liderança do país. É um fenômeno como massa de bolo, quando mais batem na figura do líder, mais esse apoio cresce, precisamos ainda entender isso”, afirmou.

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