Saída do governo

Com demissão, Alves diz fugir de constrangimento; parlamentares divergem

Ministro que deixou o cargo foi deputado por 11 mandatos e possui um grupo de aliados, com quem mantém estreitos laços há décadas. Sua saída do Executivo foi discutida no plenário da Câmara

JBatista/Câmara dos Deputados

Alves a Temer: ‘Sempre estaremos juntos nessa trincheira democrática em busca de uma nação melhor’

Brasília – A saída do ministro do Turismo do governo interino de Michel Temer, Henrique Eduardo Alves, na tarde de hoje (16), monopolizou os discursos e comentários entre deputados e senadores no Congresso. Na carta de demissão enviada ao governo, Alves afirma que tomou a decisão de deixar a pasta para “não criar constrangimentos” ou “qualquer dificuldade” para o governo.

“É o terceiro ministro que sai deste governo golpista, cuja estrutura está sendo desmontada como um castelo de cartas em tão pouco tempo. E essas saídas deixam claro que o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, além de ter sido armado com o objetivo de derrubar o projeto de governo eleito pela população, também teve o intuito de fazer com que as práticas de corrupção existentes há décadas não fossem desandadas, tivessem continuidade”, afirmou a deputada Erika Kokay (PT-DF).

“Estou seguro de que todas as ilações envolvendo o meu nome serão esclarecidas. Confio nas nossas instituições e no nosso Estado Democrático de Direito. Por isso, vou me dedicar a enfrentar as denúncias com serenidade e transparência nas instâncias devidas”, diz Alves, em outro trecho da carta a Temer.

No documento, ele agradece a lealdade, amizade e o “compromisso de uma longa vida política e partidária” do presidente interino. “Sempre estaremos juntos nessa trincheira democrática em busca de uma nação melhor. A sua, a minha, a nossa luta continuam. Pelo meu Rio Grande Norte e pelo nosso Brasil”, escreveu o agora ex-ministro.

Para Erika Kokay, “a corrupção vai devastando as áreas do Executivo como uma árvore que contamina as demais”. Ela afirmou considerar irônico que a presidenta Dilma Rousseff, alvo de um processo de impeachment por ter assinado decretos de crédito suplementar, “não foi citada em nenhum momento dessas delações”.

A fala de Erika chamou a atenção de outros parlamentares que saíram em defesa de Henrique Alves, como Alfredo Kaefer (PSL-PR). “A senhora pode falar o que quiser neste plenário, mas o discurso do PT e seus aliados, de que houve golpe, esse não cola mais e é desrespeitoso para conosco. Nem todos estão envolvidos com as mesmas práticas espúrias”, disse o parlamentar.

Para o líder das minorias na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), as declarações de que as denúncias são “inverídicas”, “mentirosas” e “criminosas”, por parte do presidente interino, Michel Temer, e vários peemedebistas consistem no que chamou de “esperneio” feito pelo Palácio do Planalto. “Qquando sai lista contra o PT em delações, eles (grupo de Temer) são os primeiros a divulgar e a defender a legalidade das listas. Quando essas listas envolvem o partido deles, ficam a reclamar e a espernear.”

Guimarães também criticou pronunciamento feito por Temer durante a manhã, no qual o presidente interino negou pessoalmente qualquer recebimento de recursos para campanhas eleitorais de forma ilícita, conforme foi denunciado pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado.

Aliados fiéis

Henrique Eduardo Alves é considerado um dos padrinhos do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e também conhecido por ter ajudado os colegas, nas últimas décadas, na captação de recursos para financiar suas campanhas eleitorais – o que provocou preocupação entre integrantes de várias bancadas partidárias.

“Para mim, a despeito dos pronunciamentos que estou ouvindo aqui hoje, o que acontece é o sujo falando do mal lavado. Vi vários parlamentares do PMDB subirem à tribuna, liderados e depois presididos pelo Eduardo Cunha nos últimos anos, para criticarem o PT. E agora vejo os petistas reclamando e criticando o governo do PMDB que aí está”, observou  Pompeo de Mattos (PDT-RS), que sugeriu a realização de novas eleições.

O deputado João Campos (PRB-GO) afirmou que ele e um grupo de parlamentares esteve no fim da tarde de hoje com Temer para manifestar apoio ao presidente diante da nova crise provocada pelas revelações de Sérgio Machado, em delação premiada.

O ministro que pediu demissão foi citado por Machado por ter recebido R$ 1,55 milhão em doações eleitorais provenientes do esquema de propinas pagas pelas empresas para contratos com a Petrobras. Ao saber que tinha sido um dos mencionados, Alves divulgou ontem mesmo, por sua assessoria, que repudiava as informações e considerava as declarações de Machado um ato de “irresponsabilidade”. Disse ainda que todas as doações para suas campanhas foram oficiais e tiveram prestações de contas aprovadas pela Justiça eleitoral.

Ele figurou na primeira lista de políticos encaminhada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, no ano passado, ao Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo abertura de investigações sobre sua participação no esquema referente à estatal. No seu caso específico, é alvo de dois pedidos de abertura de inquérito, mas o STF ainda não se pronunciou a respeito de nenhum deles.

A saída de Henrique Alves do Executivo vinha sendo esperada havia algum tempo por causa de referências feitas ao seu nome em investigações da Lava Jato e em delações. Sua permanência no governo vinha sendo atribuída à forte relação que possui com Temer e ao gesto de ter sido o primeiro ministro do governo Dilma (também na pasta do Turismo) a entregar o cargo, assim que o PMDB anunciou o rompimento com o governo petista.

Queiroz Galvão

Na delação de Machado, o ex-presidente da Transpetro disse que os pagamentos feitos a Alves foram repassados pela empreiteira Queiroz Galvão em etapas diferentes, nos valores de R$ 500 mil (em 2014), R$ 250 mil (em 2012) e R$ 300 mil (em 2008). E, por fim, pela empresa Galvão Engenharia (R$ 500 mil, em 2010).

Machado também o acusou de ter chegado a levar algumas empresas da área de tecnologia à Transpetro para que fossem contratadas pela companhia, mas as negociações não avançaram porque, segundo contou, um estudo técnico da subsidiária constatou que essas empresas não possuíam perfil que se enquadrasse com a área em questão.

Juristas, investigadores, magistrados e os próprios parlamentares têm feito, constantemente, alertas de que o conteúdo revelado por investigados na Operação Lava Jato por meio do instrumento da delação premiada não tem validade até que sejam comprovadas as informações repassadas pelo Judiciário. No caso da delação de Sérgio Machado, todo o conteúdo ainda será objeto de apuração.

Com informações da Agência Brasil