Privatização

Em Goiás, OS elevaram custos da saúde sem melhorar a qualidade do atendimento

Estado passou a gastar mais com os serviços, houve demissões e a precarização do trabalho. Temor é que a situação se repita na educação quando essas entidades assumirem a gestão das escolas

Flickr/Governo de Goiás

Marconi Perillo, ao lado de Geraldo Alckmin: depois de passar a saúde às OS, quer privatizar a educação

São Paulo – Em meio a protestos nas ruas, desocupações de escolas por meio da força policial e prisões arbitrárias de estudantes e professores contrários à transferência das escolas estaduais para as organizações sociais (OS), dados do Dieese mostram que essas entidades não melhoraram a situação da saúde no estado. E que ao contrário do que afirma o governador Marconi Perillo (PSDB), essa forma de privatização encarece o serviço prestado sem ampliar o atendimento.

Em dezembro, o Sindicato dos Trabalhadores do Sistema Único de Saúde no Estado de Goiás (Sindsaúde/GO) divulgou um estudo que encomendou ao Dieese, detalhando a aplicação dos recursos estaduais no setor.

“Ficou claro que em 2002, 2003 e 2013 o governo não aplicou nem sequer o mínimo exigido pela lei (12%). Nos outros anos, o estado decidiu aplicar apenas o mínimo, sucateando o setor para justificar a privatização”, afirma a presidenta do Sindsaúde-GO Flaviana Alves.

De acordo com a dirigente, em 2011, quando começou a implementação das OS na saúde, o estado gastou R$ 600 milhões. Já em 2014 esses gastos foram de aproximadamente R$ 1,7 bilhão, sem que houvesse aumento no número de atendimento nos hospitais estaduais sob gestão das OS. O atendimento piorou, segundo ela. Muitos hospitais, que antes eram abertos a toda a população, passaram a ser de “portas fechadas”, ou seja, que atendem apenas a casos encaminhados por médicos de outras unidades de saúde. “As OS selecionam então quem vai ser atendido conforme a complexidade do caso. Se não interessar do ponto de vista econômico, não atende.”

Flaviana ressalta que o aumento dos gastos com a saúde não garantiram emprego e condições adequadas de trabalho aos servidores. Houve remanejamento de 50% do quadro de servidores, sobrecarregando o trabalho dos profissionais e aumentando a rotatividade. Nos primeiros oito meses de 2012, o estado gastou 7,09% do total da folha de pagamento com os trabalhadores do setor. No mesmo período de 2015, porém, o percentual caiu para 5,59%.

Há suspeitas de rombos nessas OS, segundo ela. Mesmo com aumento dos repasses estaduais, essas entidades reclamam. Recentemente, afirmaram ter um déficit de mais R$ 103 milhões, o que compromete o atendimento. “Temos recebido denúncias da falta de materiais, medicamentos e até lençóis.”

Para complicar, segundo Flaviana, uma lei estadual criou a Agência Goiana de Regulação, aparelhada pelo estado, para fiscalizar a atuação dessas organizações, que estão livres do acompanhamento de outras instâncias do controle social. “O Conselho Estadual de Saúde, do qual fiz parte, já solicitou diversas vezes documentos à agência reguladora, que até agora não atendeu”.

Em 2012, os trabalhadores ingressaram com ação civil pública no Ministério Público Federal e estadual contra a atuação das OS que estariam substituindo o estado em seu papel constitucional de gerir a saúde. No entanto, em abril de 2015, o Supremo Tribunal Federal negou Ação Direta de Inconstitucionalidade contra as OS, protocolada por centrais sindicais e outras entidades da sociedade civil. “Ao validar a atuação dessas organizações, as ações civis públicas foram invalidadas”, diz Flaviana.

Para ela, as expectativas quanto à implementação das OS na educação são igualmente preocupantes. “O governo que já não cumpre a lei do piso do magistério assinou edital que prevê demissões. Com as OS, o governo vai aumentar o repasse proporcional às escolas e não deve melhorar a qualidade do ensino.”

Legado da era FHC

Em abril de 2015, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram pela constitucionalidade da Lei nº 9.673 de 15 de maio de 1998, que dispõe sobre a qualificação de entidades como Organizações Sociais (OS). Trata-se da conversão da Medida Provisória nº 1.648-7 assinada por Fernando Henrique Cardoso em outubro de 1997, no terceiro ano de seu primeiro mandato. A lei foi questionada pela Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 1923, proposta pelo PT e pelo PDT em novembro de 1998.

Na ação, os partidos argumentavam ser dever do estado os serviços públicos de saúde, educação, proteção ao meio ambiente, patrimônio histórico e acesso à ciência pelo estado conforme a Constituição Federal, a dispensa de licitação, contratação sem concurso público e liberdade para atuar sem o controle social. No entendimento dos ministros, os setores de saúde, educação, cultura, desporto, lazer, ciência, tecnologia e meio ambiente configuram serviços públicos sociais – um dever tanto do estado quanto do setor privado. E que a realização de tais atividades pelo poder público em parceria com entidades privadas não configura delegação da atividade estatal. E que, por receberem recursos públicos, bens públicos e servidores públicos, devem ser observados princípios e regras da administração pública.

Colaborou Tiago Pereira

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