Fraudes

Com relatório da CPI do Carf, senadores reconhecem que trabalho ‘deixou a desejar’

Relatora pediu indiciamento de 28 pessoas e mudanças na legislação tributária, além de sugestões para que PF dê continuidade à Operação Zelotes. Parlamentares têm prazo para apresentar emendas ao texto

Geraldo Magela/Agência Senado

Vanessa Grazziotin ressaltou que existem muitas interrogações sobre o futuro do Carf

Brasília – A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga fraudes e irregularidades no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – a CPI do Carf – está próxima de chegar ao fim, mas ainda não se sabe com certeza quantos indiciamentos pode pedir nem em que legislações pode vir a resultar para aperfeiçoar o funcionamento do órgão. A relatora da comissão, senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), apresentou hoje (26) o seu relatório, mas o documento foi objeto de pedido de vista para inclusão de outros itens por parte dos demais parlamentares até a próxima semana.

O relatório de Vanessa pediu o indiciamento de 28 pessoas por crimes como sonegação fiscal e corrupção ativa e recomendou várias mudanças na atual legislação. Dentre os nomes dos indiciados está o ex-presidente da Mitsubishi no Brasil, Paulo Ferraz – corporação apontada pela senadora como uma que cometeu um dos casos mais graves de fraudes no esquema para mudar a aplicação de multas e punições para empresas.  Conforme informações do relatório, a Mitsubishi teria tido uma dívida reduzida de R$ 266 milhões para R$ 960 mil.

“A empresa é o maior exemplo desse esquema criminoso, pois se valeu do tráfico de influência exercido pelas empresas de consultoria e advocacia que, comumente, eram compostos por conselheiros do Carf ou por lobistas com forte influência dentro do conselho”, destacou Vanessa no seu relatório.

Também consta dentre os nomes com pedidos de indiciamento o lobista Mauro Marcondes Machado, que atuaria como intermediário entre a Mitsubishi e o grupo comandado pelo ex-presidente do Carf, José Ricardo. Assim como Juliano Nardes, que é sobrinho do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes. Ele é apontado como suspeito de recebimento de recursos de propina pagos por empresas também investigadas no caso.

Lulinha

Sobre a apreensão nas empresas do filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Luís Cláudio Lula da Silva, o Lulinha, pela Polícia Federal – um ponto polêmico da Operação Zelotes (a operação que deflagrou o esquema de fraudes no Carf ) –, a relatora disse que ele “não foi e não poderia ser investigado pela CPI porque isso faria a comissão fugir do seu objetivo”. Ela acrescentou que as empresas de Lulinha nada têm a ver com a Operação Zelotes.

A empresa de Lulinha foi alvo de ação de busca e apreensão porque durante as investigações da Polícia Federal, houve suspeita, por meio de um e-mail, de suposto lobby para aprovação de uma medida provisória que autorizou incentivos fiscais para o setor automotivo. Mas não há, até hoje, comprovação dessa suspeita, nem de qualquer envolvimento de Lulinha no caso.

Por isso, neste item do documento, a senadora aproveita para explicar os motivos pelos quais os requerimentos para convocação de Lulinha à CPI, assim como do ex-ministro Gilberto Carvalho e da ex-ministra Erenice Guerra terminaram sendo rejeitados pelo colegiado da comissão, pelos mesmos argumentos.

Conforme dados destacados hoje pela relatora, no total foram apresentados à CPI 68 requerimentos para convocar pessoas a depor. Desses, 57 foram aprovados e 11 foram retirados pelos senadores. Dentre as convocações aprovadas, apenas 15 pessoas foram de fato ao colegiado, enquanto 42 não chegaram a ser chamadas a prestar depoimento ou, quando foram, usaram o direito legal de não se pronunciarem. No caso da quebra de sigilos fiscal ou bancário, foram protocolados 21 requerimentos. Desses, 18 foram aprovados e três, retirados.

Poucos avanços

O presidente da comissão, senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), reconheceu depois da apresentação do relatório que as investigações não avançaram tanto quanto gostaria e atribuiu o fato ao que chamou de “falta de colaboração dos convocados”. Uma vez que vários apresentaram habeas corpus para permanecerem em silêncio durante os depoimentos. Ataídes afirmou, entretanto, que o legado a ser deixado pelo Senado em relação ao caso é a sugestão de mudanças na legislação que trata do Carf por parte do colegiado.

Vanessa Grazziotin ressaltou que existem muitas interrogações sobre o futuro do Carf. “Caberá à Polícia Federal e ao Ministério Público aprofundar as investigações e dar prosseguimento aos detalhes descobertos ao longo da CPI, especialmente por intermédio de quebras de sigilo bancário e fiscal e da colheita de depoimentos que ajudaram a entender melhor o funcionamento das quadrilhas que assaltaram o Carf”, acentuou a senadora.

O trabalho da CPI tomou como base quebras de sigilo feitas pela comissão e o material compartilhado pela Operação Zelotes, deflagrada em março passado pela Polícia Federal e que investiga irregularidades no julgamento de mais de 70 processos envolvendo dívidas de bancos, montadoras de automóveis e siderúrgicas.

De acordo com a relatora da comissão, os julgamentos forçados teriam sido manipulados para favorecer empresas num esquema que pode ter resultado em prejuízo da ordem de R$ 19 bilhões à Receita

“Ganhava a empresa corruptora, que via os débitos tributários serem reduzidos a pó. Ganhavam os conselheiros corruptos, que aumentavam seu patrimônio e ganhavam também os intermediários, cujas empresas de ‘consultoria’ gerenciavam somas vultosas. Só quem perdia era a população brasileira: bilhões de reais que deveriam ser pagos a título de tributos, e que poderiam inclusive equilibrar as contas públicas nunca sequer foram recolhidos”, acentuou ela, no seu documento.

A CPI tem um pouco mais de tempo para avaliar o relatório e fazer emendas e sugestões com certa calma: o prazo para conclusão dos trabalhos termina no dia 18 de dezembro. Os senadores têm 23 dias para passarem a limpo tudo o que já discutido e que considerarem necessário.

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