Tributos

Para aprovar a CPMF, governo precisa de apoio que hoje não tem

PEC deve chegar ao Congresso em 15 dias, e precisa de apoio de 'setores da atividade econômica expressivos' e negociação com governadores e prefeitos

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CPMF pode ajudar o governo na arrecadação e auxiliar no combate à corrupção, por incentivar a fiscalização

São Paulo – Depois de propor a recriação da CPMF, o governo precisa agora fazer um trabalho de engenharia política capaz de conseguir os votos de três quintos na Câmara e no Senado, 308 e 49 votos, respectivamente. A tarefa hoje não é nada fácil, considerando as dificuldades políticas do Palácio do Planalto para reunir até mesmo o número de votos necessários para aprovar leis ordinárias, que exigem maioria simples. A PEC deve ser enviada ao Congresso em 15 dias, segundo a Receita Federal.

Para o analista político Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), existem duas condições imprescindíveis para que a correlação de forças, na atual conjuntura muito desfavoráveis ao governo, seja alterada, possibilitando a aprovação do tributo. “A primeira é o governo contar com apoio de setores da atividade econômica expressivos. A outra é envolver governadores e prefeitos nesse processo. Com isso – e um trabalho de coordenação política eficiente –, pode ser que essa correlação de forças no Congresso se altere.”

Para Queiroz, a principal condição não é nem mesmo que o governo acerte sua coordenação política, o que ainda não conseguiu no segundo mandato. “Se o setor econômico apoiar, o trabalho fica facilitado. Mas mesmo com uma coordenação eficiente, se o setor econômico disser não, e são eles que financiam as campanhas, não será possível.”

Governadores e prefeitos têm também papel fundamental nessa equação. Mas o apoio pelo menos de parte significativa dos chefes dos executivos estaduais e municipais vai depender de quanto do bolo a ser criado eles vão poder trazer para suas gestões. Nesse caso, a alíquota terá de ser maior do que a proposta de 0,2% para poder ser repartida.

“Para que prefeitos e governadores entrem com peso, teria que ser trabalhado um aumento dessa alíquota, de modo que parte desse ganho fosse partilhado com eles”, diz Queiroz. Sem isso, a importância do tributo na retomada do controle das finanças públicas e do crescimento do país fica em segundo plano.

“Proporcional”

Para Evilásio Salvador, professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB), a proposta de recriar a CPMF tem aspectos positivos e negativos. De positivo, ele entende o tributo como um importante instrumento de combate à corrupção, já que incide diretamente nas movimentações financeiras e, por isso, permite o cruzamento de dados com o Imposto de Renda.

Segundo Salvador, do ponto de vista da chamada “justiça tributária” a CPMF é um tributo chamado proporcional. “Não joga nem a favor de maior justiça tributária no sentido da progressividade, nem tem característica da regressividade. É um importante instrumento de arrecadação. Grande parte da reação contra é muito menos pelo efeito do custo tributário e muito mais pelo cruzamento de dados e fiscalização. Pode-se com a CPMF constituir um importante instrumento de combate à corrupção.”

Mas se o analista considera que a contribuição tem um aspecto fiscalizatório importante e seria uma saída “praticamente inevitável” para os cofres da União hoje, ele afirma, por outro lado, lamentar que o governo não volte a tributar os mais ricos. “Por exemplo, com a tributação de lucros e dividendos de pessoa física, que precisa só de maioria simples no Congresso.”

Salvador estima que o governo poderia arrecadar perto de R$ 50 bilhões. Para chegar a esse número, ele considera os valores de R$ 200 a R$ 250 bilhões de lucros e dividendos distribuídos anualmente. “Se você aplicar uma alíquota de 15%, que tinha anteriormente (em legislação revogada pelo governo de Fernando Henrique Cardoso), e jogar na tabela progressiva, a arrecadação seria em torno de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões”, calcula. O governo diz esperar arrecadar R$ 32 bilhões com a CPMF, se a alíquota for de 0,2%.

Embora considere a CPMF necessária, o economista da UnB lembra que o governo concede desonerações “aos montes” com a chamada Desvinculação de Receitas da União (DRU), afetando o caixa da Previdência. “Por isso tem uma incoerência na proposta de criar a CPMF. Seria mais rápido acabar com a DRU e reverter as desonerações concedidas.”

Outra crítica, diz, se insere no contexto de ajuste. A CPMF seria criada, ou recriada, num momento de aperto e ajuste fiscal. “Sou contra o ajuste fiscal e compor recursos dentro do orçamento público para financiar rentista e capital portador de juros. Sacrifica a população para financiar o setor financeiro. O Brasil já gasta de 6% a 7% do PIB em pagamento de juros.”