Esplanada

Cientistas políticos veem possíveis resultados de reforma ministerial com ceticismo

Para Leonardo Barreto, da UnB, a reforma traz riscos, porque 'com certeza terá de desagradar alguém'; na opinião de Francisco Fonseca, da GV, o ministério reflete uma aliança de classes que se esgotou

Marcelo Camargo/Agência Brasil

Vice-presidente Michel Temer e o ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, não podem ser contrariados

São Paulo – Cientistas políticos ouvidos pela RBA analisam com ceticismo a esperada reforma ministerial que a presidenta Dilma Rousseff deve anunciar esta semana. Para eles, as mudanças na Esplanada dos Ministérios terão um alcance limitado na atual conjuntura política, se Dilma não considerar alguns fatores cruciais. Para Leonardo Barreto, da Universidade de Brasília (UnB), a reforma pode trazer “mais riscos do que bônus”, porque envolve interesses que podem não ser conciliáveis. “Essa reforma é uma coisa que com certeza terá de desagradar alguém.”

Na opinião de Barreto, independentemente da economia, do ponto de vista político a diminuição do número de ministérios e de seus ocupantes é no momento uma questão secundária, ou “colateral”. “É claro que ela pode usar essa oportunidade para tentar ganhar alguns pontos. Agora, se ela fizer a leitura exata do jogo à frente dela, só existe uma saída possível: é preciso dar poder aos seus aliados, leia-se PMDB.”

Na opinião do analista, a entrevista do ex-ministro da Aviação Civil Moreira Franco à Folha de S. Paulo de ontem (22) é “enfática” nesse sentido. “Em dado momento ele diz que Temer foi afastado da coordenação política. Essa é a leitura do PMDB”, avalia Barreto.

Assim uma das “leituras” que se pode fazer da fala de Moreira Franco implica soluções como a presença ainda mais forte do PMDB no governo. “Por exemplo, criando-se um superministério da Infraestrutura, juntando eventualmente a Aviação Civil, por exemplo. Teria de ser alguém do PMDB com um orçamento privilegiado.”

O ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, é um dos peemedebistas politicamente mais fortes no atual ministério.

Na opinião do cientista político, o fato de Dilma estar construindo uma reforma administrativa açodada para satisfazer “clamores” decorrentes da crise política é um dado que joga contra o governo e ela própria. “Uma coisa é você fazer uma reforma administrativa dentro de um contexto, de um projeto, de um estudo, baseado em sugestões; outra coisa é fazer mudanças para atender a alguns clamores, uma mudança pouco estudada, pouco pensada e pouco compartilhada com a sociedade.”

Para Barreto, na atual situação, Dilma está numa “sinuca”. Isso porque, de um lado, ela está sob ataque da oposição e setores da mídia querendo não substituir ministros, mas a própria Dilma; e de outro, sua base, seus eleitores e o próprio PT estão reticentes quanto à presidenta.

“Para ela ganhar espaço (na reforma ministerial) entre os aliados como o PMDB, ela precisaria cortar gente do PT. E o próprio PT está com problemas com ela. Se ela cortar, de três, dois ministros da área de direitos humanos, por exemplo, de Igualdade Racial e Políticas para as mulheres, isso vai dar uma dor de cabeça tremenda a ela com a militância”, diz Barreto.

A ideia, segundo se veicula em Brasília, é de que as secretarias de Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos sejam fundidas em uma pasta.

Para o professor da UnB, a crise pela qual passa a presidente vem “do colapso de suas bases de legitimidade”, a partir de uma eleição muito difícil “da qual sempre se sai machucado”, passando por uma “uma guinada econômica muito forte sem uma transição adequada”. Esta guinada, diz Barreto, que “destituiu” a base e a esquerda de discurso em favor do governo, junta-se aos escândalos para desembocar na deterioração de imagem pela qual Dilma vem passando.

Aliança de classes

Já o cientista político Francisco Fonseca, professor da PUC-SP e da Fundação Getúlio Vargas, acredita que, no atual quadro, “é muito difícil a reforma ministerial ter grandes repercussões”. Ele considera que a conjuntura envolve aspectos estruturais da política brasileira.

“O que está em jogo é uma aliança de classes que já se desfez. Parece-me que o ministério efetivamente reflete uma aliança de classes. Na medida em que esta aliança se encerrou, ele não faz muito sentido. Falta ao governo uma sinalização à esquerda, como a taxação dos ricos, dizer não ao ajuste fiscal neoliberal. Nesse cenário, Dilma está sendo excomungada pela direita e abandonada pela esquerda”, diz Fonseca.