Capitalismo selvagem

Para analista, ao criar lei do pré-sal, Brasil atraiu a oposição internacional

Professor da UFABC acredita que posição de Lula ao se reunir com presidente iraniano, em 2010, também despertou desconfianças de Israel. Mas ele crê que elites desistiram de derrubar governo

Roberto Parizotti

“Não creio mais que haja muitos setores internos interessados em derrubar o governo”, diz professor

São Paulo – O período dos governos dos petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, iniciado em 2003, foi até certo ponto bem aceito pelos setores mais poderosos do mundo, política e economicamente. Porém, o Brasil deixou de ser o “queridinho” desses setores. Para o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC, Giorgio Romano Schutte, o ponto em que os grandes interesses passaram a desconfiar do Brasil e colocar em xeque os governos do PT foi o ano de 2010.

“Até então, no meio da crise internacional, o Brasil era o queridinho de todo o mundo. Pela primeira vez, o Brasil era visto como solução, e não mais como parte do problema. Entrou para o G-20, estava à frente dos Brics. E o que acontece em 2010? O Lula, pela primeira vez em oito anos, toma uma medida que vai diretamente contra os interesses internacionais, que foi a mudança do marco regulatório de exploração do petróleo, do pré-sal”, disse o economista em entrevista a Isaías Dalle, do site da CUT. “O Lula vinha fazendo o governo que havia prometido, atendendo às camadas populares sem contrariar interesses das elites”, acrescenta.

Segundo Schutte, ao aprovar a legislação que garantiu o controle do pré-sal pelo país, aprovada pelo Congresso num momento em que Lula tinha uma aprovação extraordinária de 85% da população, o governo brasileiro se colocou “contra interesses muito organizados e poderosos”.

Para ele, o posicionamento da diplomacia brasileira ao se posicionar, no cenário internacional, a favor do Irã, quando Lula se encontrou com o presidente Mahmoud Ahmadinejad, foi um fato político que, somado à questão do pré-sal, ajudou a turvar a visão positiva de setores poderosos do mundo. “Irã? Bomba? Quem se sente ameaçado imediatamente é Israel. E eles têm um lobby muito forte”, afirma Schutte. “Tenho dúvidas se o Lula e o Celso Amorim sabiam da reação que aquilo provocaria nos Estados Unidos.”

Na questão econômica, o analista acredita que até 2010 o Brasil conseguiu reagir bem à crise financeira internacional. Mas, a partir daquele ano, a presidenta Dilma percebeu a necessidade de reduzir as taxas de juros. “Então, quando ela começa em 2012 a atacar de maneira muito corajosa a taxa de juros, isso se torna uma coisa que contraria a comunidade financeira internacional”, lembra. Contrariando interesses financeiros internacionais, Dilma então passou a ser questionada a partir desses setores e perdeu a confiança do mercado. “Todos os relatórios financeiros começam a questionar a capacidade do governo” e a “credibilidade do governo”. “Ela não consegue resistir, ela teve de voltar atrás (interrompendo a queda dos juros)”, diz Schutte.

O professor acredita que os problemas enfrentados a partir do momento em que o governo deixou de satisfazer poderosos interesses políticos (Irã) e econômicos (pré-sal) se agravaram pela falta de maior capacidade política de negociação. No caso do Irã, conversando mais “com os amigos” (França, Rússia, China). Internamente, “ deveria ter articulado, montado uma base de apoio”.

Todo esse cenário negativo “começa a criar um clima que desperta forças políticas internas que percebem que o vento está a favor da derrubada da Dilma”, constata.

No entanto, para ele, o afastamento de Dilma do comando do Palácio do Planalto não é mais tão interessante quanto parece às elites. “Não creio mais que haja muitos setores internos interessados em derrubar o governo. Para quê? Está ótimo assim. É um governo facilmente cooptável para fazer políticas impopulares. O que eles querem é evitar a volta do Lula e desestabilizar a Dilma, impedir que ela possa fazer qualquer guinada à esquerda”, analisa.

O problema, diz Schutte, é que todo esse cenário acabou criando “monstros”, como Eduardo Cunha e a intolerância. Em sua opinião, porém, o recuo registrado por setores da mídia, inclusive em editorial do jornal The New York Times, é sintomático de que derrubar o governo não interessa mais. “É só observar editoriais do Financial Times e o The New York Times mais recentes. É de interesse manter o governo. Até porque as políticas que eles querem estão sendo implementadas. Uma coisa é certa: com essa política, eles vão destruir o PT.”

Leia a íntegra da entrevista aqui.

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