contas do governo

Luiz Moreira: ‘Seria impensável que o TCU levasse ao impeachment uma presidente eleita’

Para jurista, prática chamada de 'pedaladas' é procedimento corriqueiro na administração pública, e ministro relator das contas de Dilma se utilizou da imprensa para criar notoriedade em torno dele

Brizza Cavalcante/Agência Câmara

“É a primeira vez na história que o TCU dá prazo ao chefe de Estado e chefe de governo da República”, diz Moreira

São Paulo – A abordagem midiática das chamadas “pedaladas fiscais” do governo Dilma Rousseff em 2014 é equivocada, e causa estranheza a atitude do Tribunal de Contas da União de fixar um prazo para o Executivo explicar as supostas irregularidades. A opinião é do jurista e ex-titular do Conselho Nacional do Ministério Público Luiz Moreira.

“O TCU é um órgão auxiliar do Congresso Nacional. É a primeira vez na história que o Tribunal de Contas da União dá prazo a um chefe de Estado e chefe de governo da República. Temos que analisar os poderes do TCU no organograma do Estado. A natureza jurídica do tribunal é que é uma corte administrativa, portanto, um tribunal contencioso, subordinado ao Congresso Nacional”, diz Moreira.

O jurista complementa: “Como tribunal administrativo subordinado ao Congresso, causa estranheza que ele conceda prazo à chefe de Estado e de governo Dilma Rousseff sobre uma prática que é feita pelos governos anteriores. Seria impensável que o TCU levasse ao impeachment uma presidente da República eleita”, diz.

O prazo dado pelo TCU para Dilma enviar sua defesa acaba hoje (22). O TCU deverá julgar as contas e enviá-las ao Congresso em agosto. O poder da corte é apenas de analisar e votar um parecer e enviá-lo ao Parlamento, que faz o julgamento. As “pedaladas” são procedimentos pelos quais o Executivo posterga repasses do Tesouro Nacional a bancos públicos para pagar benefícios sociais e previdenciários, entre outras obrigações.

Luiz Moreira explica que, além dos executivos federal e estaduais, diversos órgãos da União praticam o procedimento chamado midiaticamente de “pedaladas fiscais”. “Um exemplo é o próprio Tribunal de Contas da União nas suas regras.”

O jurista define como “corriqueira”, no âmbito da administração pública, a prática do governo Dilma. “Desde Fernando Henrique Cardoso para cá, todos os governos praticaram esse procedimento contábil corriqueiro, maliciosamente chamado de ‘pedalada’. Não é ‘pedalada fiscal’, é um procedimento contábil, é disso que se trata.”

Para Moreira, são equivocados os termos em que o relator do processo relativo às contas de Dilma no TCU, o ministro Augusto Nardes, abordou o processo.  “Ele se utilizou da imprensa, se aproveitando dos índices negativos do governo, para criar notoriedade em torno dele”, afirma.

“Causa espécie que um tribunal administrativo subordinado ao Congresso fixe prazo à presidente e, mais, que o relator dê declarações públicas portando-se como julgador político das contas e não como julgador administrativo, o que já mostra, por parte do relator, um transbordar da competência dele. Espera-se de um juiz administrativo que proceda a um julgamento técnico.”

Em abril, Nardes manifestou-se sobre as contas do governo Dilma dizendo que a presidenta “poderá, sim, ser responsabilizada”. “Os atos são dela (Dilma)”, afirmou, entre outras declarações.

Segundo a coluna da jornalista Mônica Bergamo na Folha de S. Paulo desta quarta-feira, um ministro do TCU teria dito que os membros da corte “dificilmente” deixarão de votar contra as contas que serão apresentadas pelo governo, mesmo que a defesa seja convincente, devido à pressão “insustentável” que o tribunal estaria sofrendo para rejeitá-las. “’Precisamos andar na rua”, teria dito um ministro não identificado, disse a colunista.

“Acho que o que vai acontecer é a aprovação das contas com ressalvas. O TCU deve aprovar uma recomendação para que o Executivo tome providência para corrigir alguns procedimentos contábeis. Não há da parte do Executivo nem dolo, nem a prática de nenhum ilícito contábil”, afirma Moreira.

O TCU é composto por nove ministros. Seis são indicados pelo Congresso Nacional (três pela Câmara e três pelo Senado) e três pelo presidente da República. Das indicações do presidente, uma é livre (o indicado será o ministro) e dois são escolhidos pelo presidente entre autoridades (auditores e membros do Ministério Público junto ao TCU).

Os atuais ministros do TCU são os seguintes:

Augusto Nardes – relator das contas de Dilma em 2014

Indicado ao TCU pela Câmara dos Deputados em 2004, começou sua carreira política em 1973, como vereador em Santo Ângelo (RS), pela extinta Arena. Foi deputado federal e passou por vários partidos: PDS, PPR, PPB e PP.

Aroldo Cedraz

Ligado ao ex-governador da Bahia Antônio Carlos Magalhães, foi deputado federal e passou por MDB, PMDB e PFL. Sua vaga, preenchida em dezembro de 2006, era de indicação da Câmara dos Deputados.

Raimundo Carreiro Silva

Assumido por escolha do Senado em 2007, como funcionário público da casa. Ligado a José Sarney. Foi indicado pelo Senado e aprovado por unanimidade.

Walton Alencar Rodrigues

Chegou ao TCU em 1999 por indicação do Ministério Público. Procurador concursado, foi presidente do TCU entre 2007 e 2008.

Benjamin Zymler

Engenheiro, trabalhou em Furnas Centrais Elétricas e na iniciativa privada e entrou no TCU como concursado no cargo de analista de finanças e controle externo. Foi indicado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso à vaga destinada a auditores do TCU em setembro de 2001.

José Múcio Monteiro Filho

Indicado para a vaga que cabe à Presidência da República pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do qual foi ministro das Relações Institucionais, em 2009.

Ana Arraes

Deputada pelo PSB, é filha do ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes, morto em 2005, e mãe do ex-governador do mesmo estado Eduardo Campos, morto em agosto de 2014.

Bruno Dantas

Indicado pelo PMDB, para vaga que cabia à Câmara, e sua escolha foi aprovada pelo presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho. Foi empossado em 2014.

Vital do Rêgo

Senador, Vital do Rêgo (PMDB-PB) foi anunciado como indicado pelo colega de Senado Renan Calheiros (PMDB-AL) e tomou posse em dezembro de 2014.

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