Estratégia

Para barrar maioridade penal, governo quer endurecer pena de quem coopta crianças

Secretaria de Direitos Humanos negocia possibilidade com Senado. ‘A discussão deveria ser a violência que o adolescente sofre atualmente’, afirma ministra Ideli Salvatti

Wilson Dias/Agência Brasil

Ideli: “Articulação foi para que Senado aprove projeto que agrava a pena do adulto que utilizou criança no crime”

São Paulo – A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República está negociando com o Senado a possibilidade de a Casa legislativa acelerar a votação de um projeto de lei que endurece as penas dos adultos que cooptam crianças e adolescentes em crimes, aprovado na semana passada na Câmara dos Deputados. Trata-se de uma estratégia para tentar tirar força do projeto que propõe a redução da maioridade penal, que está sendo discutida hoje na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados.

“A articulação foi no sentido de acelerar no Senado a provação de um projeto que  consideramos muito importante, que foi aprovado por unanimidade na Câmara: em vez de penalizar o adolescente, ele agrava a pena do adulto que utilizou o adolescente na execução de um crime”, afirmou a ministra dos Direitos Humanos, Ideli Salvatti. “Quem tem que ser responsabilizado, quem tem que pagar a pena efetivamente, é o adulto, porque normalmente quando se tem um adolescente envolvido na violação de alguma lei, na quase totalidade há um adulto envolvido.”

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O Projeto de Lei (PL 8.077/14) prevê o endurecimento das penas para aqueles que utilizam criança ou adolescente para praticar crime e estava apensado ao PL 789/07, de autoria do ex-senador Aloizio Mercadante (PT-SP), que tipifica como crime o ato de utilizar, induzir, instigar ou auxiliar criança ou adolescente a praticar ou participar de crimes. A proposta segue agora para análise do Senado.

“Nas condições de segurança pública e do sistema prisional, nós vamos jogar nossos adolescentes para se aprimorarem no crime em vez de serem ressocializados? Nenhum dos países que reduziram a maioridade penal diminuíram a criminalidade. Além disso, os adolescentes são clara minoria entre os praticantes de homicídios, eles têm sete vezes mais probabilidade de morrer em um homicídio que o restante da população. O assunto que demandaria preocupação não é a violência praticada pelo adolescente, mas a violência que o adolescente sobre atualmente.”

A proposta de Emenda Constitucional (PEC) 171, de 1993, de autoria do deputado Benedito Domingos (PP-DF), propõe reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos. Se a PEC for considerada legal pela CCJ será criada uma comissão especial na Câmara para analisar a proposta, com prazo de 40 sessões do plenário para fazer o trabalho. Depois disso, o projeto tem de passar por duas votações plenárias, em que deve ser aprovado por 3/5 dos 308 deputados.

Aprovada, a matéria vai para o Senado, onde será analisada pela CCJ da casa e terá de passar por mais duas votações e ser aprovada por 54 senadores. Se o texto for alterado, a PEC volta para a Câmara. O processo só termina quando as duas casas concordarem sobre a redação final da proposta.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) já prevê seis medidas aplicáveis ao menor de 18 anos que comete algum ato infracional. De acordo com o Censo do Sistema Único de Assistência Social, de 2014, o Brasil tinha 108.554 adolescentes cumprindo algum tipo de medida socioeducativa em 2012, o equivalente a apenas 0,18% dos 60 milhões de brasileiros com menos de 18 anos.

Destes, 20.532 (19%) cumpriam medida de internação ou semiliberdade e 88.022 (81%) estavam em prestação de serviço à comunidade ou liberdade assistida. No total, esses crimes contra vida – como homicídios, latrocínio, estupro, lesão corporal – corresponderam a apenas 13,3% do total, índice menor do que o de adolescentes implicados em restrição de liberdade. A prática de roubo respondeu por 38,6% dos casos e o tráfico de drogas, por 27%.

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