Conjuntura

Berzoini: ‘Quem faz política tem que estar preparado para cenários tensos’

Em entrevista à RBA, ministro das Comunicações diz que falar em impeachment sem pressupostos legais 'é claramente uma atitude golpista', e que governo aceita manifestações, desde que não sejam violentas

Gerardo Lazzari

“O momento está muito difícil. Mas quando esteve fácil? Eu não lembro”, diz ministro das Comunicações

São Paulo – O ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, reconhece que a conjuntura atual é difícil. Para ele, vários fatores influenciam o momento negativo pelo qual passa o governo Dilma Rousseff, entre os quais a atuação da chamada grande imprensa do país. “A questão da Operação Lava Jato coloca mais uma vez o tema da corrupção no governo federal e mais uma vez a seletividade da comunicação social do Brasil abafa casos, como por exemplo o Metrô de São Paulo.”

O ministro, porém, não atribui as dificuldades apenas à atuação da mídia. “O governo tem responsabilidade política por tudo o que faz”, diz. Para ele, a queda de popularidade de Dilma Rousseff, que se intensificou a partir da nomeação do ministério e das medidas de ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, decorre também da “mudança de expectativa em relação à questão orçamentária e a necessidade de fazer ajustes econômicos e financeiros” e do fato de que os governos do PT, desde Luiz Inácio Lula Da Silva, já entram no 13° ano e sofrem um desgaste natural. “Temos que pagar o preço do tempo, que desgasta.”

Berzoini afirma que não fica “escandalizado” ao ouvir propostas de impeachment, mas que não vê hipóteses previstas na lei para isso e que “falar de impeachment sem que haja pressupostos legais é claramente uma atitude golpista”.

Sobre manifestações contra a presidenta Dilma Rousseff, o ministro entende que o governo tem de saber “lidar com isso sem achar que é o fim do mundo”, mas alerta: “Não podemos transigir com manifestações que tenham violência como método de ação ou cujo eixo seja uma perspectiva golpista. Isso a gente não aceita.”

Ele comentou ainda a “carta aberta” divulgada pelo deputado estadual Edinho Silva na quarta-feira (11), em que admite “erros no nosso campo político” e que “é hora de ‘pegarmos a nossa história nas mãos’”. “Ele foi sincero, objetivo. Ninguém é obrigado a concordar com ele, ninguém é obrigado a discordar dele a priori”, afirma Berzoini.

Leia a entrevista concedida por Ricardo Berzoini à reportagem da RBA, no escritório da presidência da República em São Paulo.

O governo chegou a dezembro com uma popularidade alta depois das eleições. Depois do anúncio do ministério e das medidas econômicas, a popularidade despencou. Não haveria responsabilidade por parte do governo por esse mau humor generalizado, pela tensão, em decorrência da falta de comunicação com a sociedade?

O governo tem responsabilidade política por tudo o que faz. Tem que assumir. Você disputa um processo eleitoral em que tem espaço de comunicação assegurado diariamente. Depois do processo tem apenas a mediação da sua comunicação, não tem mais o espaço que estabelece para se comunicar com a população. Na composição de governo, você considera o conjunto das forças que o apoiaram na eleição e vão apoiar no Parlamento.

Depois tem um momento de mudança de expectativa em relação à questão orçamentária e a necessidade de fazer ajustes econômicos e financeiros. E simultaneamente, talvez, uma ausência e comunicação mais efetiva por parte do governo sobre a natureza desse processo. Entre novembro, dezembro, janeiro e fevereiro houve um processo de mudança de expectativas, que de certa maneira reproduz um pouco o que aconteceu em 2013. De 2004 a 2012 vivemos num ambiente de crescimento do otimismo com o país, mas esse processo de mudança começa a dar sinais de esgotamento. Porque você está convivendo com a crise que começou em 2008, e em 2012 começam a escassear os instrumentos, porque a crise foi além da duração que era prevista. A previsão era de que em três ou quatro anos você pudesse voltar ao ciclo de crescimento dos EUA Europa e manutenção do crescimento da Ásia.

Como vê o momento político atual, em que a discussão da Lava Jato tomou conta do cenário? O presidente da Câmara (Eduardo Cunha – PMDB/RJ) e o presidente do Senado (Renan Calheiros – PMDB/RN) responsabilizam o Planalto por terem seus nomes incluídos na lista do Janot. E eles não são chamados às falas. O governo não se movimenta pouco no sentido de criar fatos que promovam contrapontos?

O governo tem procurado fazer esse contraponto através de várias iniciativas de ministros e da presidenta, para justamente colocar suas posições. Óbvio que existe uma mediação, uma mediação conservadora, que é o papel que parcela significativa da grande mídia exerce na filtragem das interpretações do que se apresenta como argumento governamental, dos partidos progressistas e assim por diante.

No entanto, não podemos abrir mão das nossas responsabilidades. Esse embate tem que ser feito cotidianamente. Seria muita ingenuidade acreditar que o Ministério Público estaria a serviço do Executivo. O MP tem total autonomia e já demonstrou isso inúmeras vezes, afrontando inclusive lideranças importantes dos partidos que sustentam o governo. Não tem possibilidade de manipulação em relação a uma lista que o procurador-geral (Rodrigo Janot) deve ter tido muitas horas de trabalho para avaliar. Mas não tem ninguém denunciado. Os nomes que aparecem, aparecem na forma de inquérito. Quem está exposto na política sempre tem o risco de ser investigado. Faz parte do jogo. Ao final do inquérito vai-se avaliar quem deve ser denunciado, e, ainda assim, só aí começa a ação penal, com direito ao contraditório, ao devido processo legal.

Como o sr. encara a questão do impeachment, disseminada por todo o país?

Em primeiro lugar, o impeachment está na Constituição e tem regras. Não fico escandalizado quando ouço a palavra impeachment. Por outro lado, eu rejeito de maneira muito veemente qualquer possibilidade de impeachment em relação à presidenta, porque não há as hipóteses previstas na lei para isso. Está na ordem jurídica, mas falar de impeachment sem que haja pressupostos legais é claramente uma atitude golpista. Precisamos reconhecer que existe um ambiente ruim na política do país, e cuidar para que melhore.

A questão da Operação Lava Jato coloca mais uma vez o tema da corrupção no governo federal e mais uma vez a seletividade da comunicação social do Brasil abafa casos, como por exemplo o metrô de São Paulo, os casos de Minas Gerais, os casos que ocorrem em outros governos, mesmo de Brasília, que foi quase há quatro anos. O cidadão tem todo direito de se indignar e ficar extremamente incomodado. Temos que demonstrar que o governo está empenhado em combater e mudar a legislação para o combate à corrupção. É bom lembrar que temos hoje essa exposição da corrupção porque não temos engavetador no MP e porque a Polícia Federal não está presa a interesses partidários, está desimpedida para atuar.

Em segundo lugar, temos o problema da economia. A onda de otimismo que tínhamos de 2004 a 2012 começou a se esgotar. Terceiro, com o crescimento da economia até 2012, 2013, tivemos um aumento da demanda por serviços públicos, especialmente mobilidade urbana, mas não só, e isso provoca insatisfação. E em quarto lugar, o governo está indo para o 13° ano. Temos que pagar o preço do tempo, que desgasta. Temos que saber lidar com isso sem achar que é o fim do mundo. Manifestação é algo absolutamente previsível. O que não podemos é transigir com manifestações que tenham violência como método de ação ou cujo eixo seja uma perspectiva golpista. Isso a gente não aceita.

É possível compor com o PMDB de Eduardo Cunha? Como avalia as informações de que o PMDB estaria muito insatisfeito por não estar no círculo decisório da presidente?

O Eduardo Cunha, assim como o Renan, além de serem do PMDB são presidentes das casas. Temos que separar o que é o Eduardo e o Renan como membros do PMDB da responsabilidade institucional que têm na condução das casas. Acho que eles vão buscar construir uma agenda para reforçar o papel do poder Legislativo nas discussões com o Executivo.

A outra questão é o PMDB como um todo, que faz parte da coalizão de governo. Tem gente no PMDB que tem menos conforto em fazer parte da nossa coalizão, como na época do Fernando Henrique Cardoso também tinha parte do PMDB que não se sentia parte da base do governo do PSDB. O PMDB tem divisões internas que se manifestam muitas vezes nessa tensão entre ser governo ou não ser governo. Eu, pessoalmente, tenho muita facilidade de me relacionar com o PMDB. O PMDB sabe quem é o PT e o PT sabe quem é o PMDB. Somos partidos diferentes mas somos parceiros.

Na questão da articulação política, há muita insatisfação em relação aos ministros Pepe Vargas (Secretaria de Relações Institucionais) e ao Aloizio Mercadante (Casa Civil).

A discussão não é em relação à SRI, mas em relação ao grupo de ministros que assessoram a presidenta na questão da condução política. A SRI tem o papel de executar essa política com a ajuda dos demais. Eu acho que o Pepe está fazendo um trabalho adequado, correto, eu não estaria fazendo nada diferente…

O sr. não negociaria melhor?

Não, conhecendo bem a experiência dele (Pepe Vargas), acho que ele negocia com grande qualidade. O Mercadante tem um papel importante na Casa Civil, tem sido uma pessoa de extrema lealdade aos interesses do governo. Não podemos procurar bodes expiatórios nem achar que vamos resolver as coisas mudando peças de uma hora para outra. Se precisar mudar, muda, mas não é isso que vai resolver. O que está em jogo hoje é o seguinte: reorganizar uma condução política de governo que não é responsabilidade só da SRI, mas do conjunto dos ministros.

Como o Sr. avalia a carta aberta do Edinho Silva?

Eu acho que o debate é sempre bom, não? Tem muita gente que tem medo das pessoas exporem suas opiniões e isso causar turbulência. Mas quando a pessoa expõe a opinião como Edinho expôs, ele foi sincero, objetivo. Ninguém é obrigado a concordar com ele, ninguém é obrigado a discordar dele a priori.

Não se poderia interpretá-la como um chamamento do tipo: “PT, volte para as bases?”

O PT está na base! O parlamentar do PT que não vai para as bases não se elege. O militante do PT que não vai para a base não tem legitimidade. É claro que é um momento difícil, a gente reconhece as dificuldades, setores da militância ficam às vezes buscando informação pra poder orientar sua ação política, mas o PT sem base não existe, depende da base pra viver.

A carta talvez reflita que as pessoas estão preocupadas com um golpe, na atual conjuntura…

Quem faz política tem que estar preparado para cenários tensos. Senão, não é político. Político no sentido de militante político, não político profissional. A política é tensão. Estou completando 35 anos de militância, já passei por tantos momentos difíceis, na ditadura militar, prisão de pessoas, violência na repressão, depois as contradições na redemocratização, a construção do movimento sindical autônomo. Agora o momento está muito difícil. Mas quando esteve fácil? Eu não lembro.

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