apressado

Com pauta conservadora, deputados prometem semana cheia, apesar do feriado

Agenda intensa - e atípica - foi criticada por analistas e parlamentares e tida como ‘pretexto’ usado por Cunha para reduzir espaço de debates sobre matérias contrárias a interesses dos trabalhadores

Semana de feriadão diferente em Brasília, com parlamentares ‘trabalhando’. Cunha diz que ritmo intenso faz parte de seu estilo

Brasília – Depois que a Câmara dos Deputados e o Senado Federal ficaram marcados por uma produção legislativa considerada fraquíssima durante todo o ano passado, estes dias que antecedem o feriado da Semana Santa tinham tudo para que se esperasse quórum baixo de sessões e uma agenda de votações esvaziada nas duas casas – com os deputados e senadores trabalhando, de fato, apenas nestes dois primeiros dias e rumando, a partir de quarta-feira (1º), para seus estados. Mas não é essa, a princípio, a expectativa da semana para o Congresso Nacional.

Caso os planos dos parlamentares não mudem, eles terão uma pauta programada até o final de quarta-feira – que muita gente ainda duvida que seja cumprida, mas que está agendada. As sessões de votação acontecem apenas nesta segunda e terça-feira, mas foram incluídas, para apreciação pelo plenário da Câmara, nada menos que 30 proposições (no Senado, estão pautados oito itens, apenas).

Constam dentre as propostas e projetos de lei, por exemplo, a votação do projeto referente ao novo indexador para as dívidas dos estados e municípios, no Senado, a conclusão do pacote de matérias relacionadas à área de Segurança Pública, na Câmara dos Deputados, e a Medida Provisória (MP) 627, que altera regras de tributação de empresas brasileiras multinacionais com controladas ou coligadas no exterior.

Como se não bastasse a apreciação destas propostas, estão previstas visitas por integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do HSBC à Procuradoria-Geral da República (PGR) e à embaixada da França, audiência pública com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado – para discutir as medidas de ajuste fiscal –, e a presença, na CPI do HSBC, do secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, e do diretor do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), na quarta.

Ainda por cima, as centrais sindicais e parlamentares da chamada bancada sindical possuem apenas esta semana para negociar o projeto de lei que regulamenta a atividade de terceirização, considerado polêmico e previsto para ser votado no próximo dia 7.

Mudança de perfil?

Criticar o Congresso Nacional por cumprir o seu papel na discussão e apreciação de leis é sempre perigoso politicamente e considerado contraditório, sobretudo quando um dos perfis que se pretende mudar no país é justamente o dos parlamentares para que passem a ser mais atuantes e céleres. Mas a grande repercussão em torno da agenda do Congresso para os próximos dez dias, na opinião de vários analistas, diz respeito ao conteúdo das matérias em questão, consideradas de cunho conservador e que teriam, por trás desse interesse em “mostrar trabalho”, um fortíssimo lobby da bancada empresarial.

Somam-se a estas matérias, ainda, a discussão do projeto de lei que aumenta o subsídio do defensor público-geral federal para R$ 35.919,05 (valor igual ao proposto pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Ministério Público da União para seus integrantes) e a “PEC da bengala” – a proposta de emenda constitucional que aumenta de 70 para 75 anos a idade para aposentadoria compulsória dos magistrados.

“Legislar bem é evitar que matérias fiquem por anos na gaveta sem serem apreciadas, mas também consiste em permitir uma melhor discussão de temas considerados conflituosos pela sociedade. O pacote de medidas de segurança que desde a semana passada tem sido votado é um exemplo dessa pressa açodada e proposital para fazer com que matérias conservadoras sejam aprovadas sem dar muito tempo para que o teor seja modificado”, reclamou o cientista político Alexandre Ramalho, que há anos acompanha e estuda a movimentação da Câmara e do Senado.

A reclamação sobre o ritmo de “correria nas votações” começou a partir da votação do projeto que tipifica como hediondos os crimes cometidos contra policiais, na última semana. Para o deputado Chico Alencar (RJ), líder do Psol, a matéria não poderia ter sido aprovada sem uma discussão mais ampla. “Com esta aprovação estamos banalizando o crime hediondo”, queixou-se ele, cuja declaração foi acrescentada pelo líder do PPS, Rubens Bueno (PR). “Crime hediondo para lesão corporal é uma aberração jurídica. Não existe isso em nenhum país do mundo”, afirmou.

‘Mais disposição’

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, já deixou claro que o ritmo de trabalho não difere do que tem tentado imprimir desde que assumiu o comando da Casa, em fevereiro passado. E que a agilidade faz parte do seu estilo. Cunha ainda tem enviado vários recados para os deputados que se queixam: “Agora é assim. Quem for parlamentar e não demonstrar disposição para trabalhar precisa ficar de olho”, ressaltou, recentemente.

Por parte do PT, o líder, deputado Sibá Machado (AC), destacou que o fato de o Congresso caminhar no ritmo que se espera é saudável para o país, mas enfatizou que o PT e a base aliada vão tentar discutir melhor matérias que representam retrocesso, como é o caso da PEC da Bengala. “Vamos trabalhar contra a aprovação. Nossa bancada não vai aprovar essa PEC e lutará como puder para derrotá-la ou para tirá-la de pauta”, disse.

Enquanto alguns deputados, como Miro Teixeira (PTB-RJ), elogiam a iniciativa de Eduardo Cunha e colocam que, com um ritmo mais ágil, “a Câmara ajudará a mudar a imagem que a população tem do Parlamento”, as medidas do atual presidente também são vistas de forma cética.

“Não deixa de ser salutar essa mudança na programação das votações, mas é preciso lembrar que diante de um Congresso que só aprovou o Orçamento Geral da União poucas semanas atrás, uma agenda tão intensa de forma atabalhoada deixa, no mínimo, uma pulga atrás da orelha quanto aos interesses que estão por trás da maior parte das bancadas. Principalmente num Congresso considerado conservador e, sobretudo, alguns dias após a CNI (Confederação Nacional da Indústria) ter divulgado a sua agenda legislativa de prioridades a serem acompanhadas”, destacou o analista legislativo e economista Eduardo Fernandes, ex-consultor da Confederação Nacional do Transporte (CNT).

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