Posse no STF

Marco Aurélio diz que presidente do STF deve buscar credibilidade, e não popularidade

Ministro afirma que Lewandowski saberá dar equilíbrio à Corte, e faz referências a Joaquim Barbosa ao proclamar que independência não implica arrogância e que é preciso ouvir e dialogar

Fellipe Sampaio/STF

Mello (e) após saudação a Lewandowski (centro): é preciso respeitar os colegas em plenário

Brasília – O ministro Marco Aurélio Mello aproveitou a posse do novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, para tecer críticas ao período em que a Corte esteve sob o comando de Joaquim Barbosa. Sem citações diretas ao recém-aposentado, Mello, ministros e advogados fizeram da cerimônia em Brasília um momento de balanço sobre o papel do Judiciário e de desagravo a Lewandowski, que esteve sob ataques públicos do antecessor.

Mello, que já havia feito críticas a Barbosa quando do anúncio da aposentadoria,  ressaltou que o tribunal experimentou, nos últimos anos, momentos institucionais relevantes. Ele disse que as matérias julgadas repercutiram entre os poderes, nas instituições e no modo de vida dos brasileiros. Acentuou que o STF deve ter uma postura firme e equilibrada por parte dos magistrados, sobretudo os que presidem o órgão.

“Todo magistrado precisa saber ouvir e saber dialogar. Ter independência não implica arrogância. É a partir do dialogo com as partes que fazemos a condução de todo o processo. As diferenças permitem ao mundo jurídico discussão sobre vários temas e nos ajuda a evoluir”, colocou.

Estava iniciado o momento de menção, sem citação de nomes, ao ministro Joaquim Barbosa, que deixou a presidência depois de ter protagonizado diversos embates com colegas do tribunal, jornalistas e advogados. Em outro momento, Mello disse que em um colegiado como o do Supremo, formado por 11 ministros, os componentes precisam se completar mutuamente. “Temos o dever de respeitar cada um de nós, ouvir opiniões contrárias e construir consensos”, completou.

Barbosa ficou famoso por interpelar publicamente ministros dos quais discordava. Os casos mais conhecidos se deram no julgamento da Ação Penal 470, o chamado mensalão, do qual foi o relator. O revisor do processo, Lewandowski, chegou a sofrer ironias de que estaria em colaboração com o PT ao discordar da visão defendida pelo presidente da Corte.

Hoje, Marco Aurélio Mello não esqueceu de lembrar a importância de se respeitar a harmonia entre os poderes da República e acrescentou que o papel do presidente do STF é de grande envergadura porque “ele é sempre o primeiro entre iguais”.

“Zelar pelo respeito da população à Casa é fundamental, daí o motivo pelo qual a forma como o presidente dirige os trabalhos em sessão plenária revela o nível de maturidade alcançado. Todos chegam ao tribunal sabedores do cargo e da imensa responsabilidade que tem o presidente de zelar pela harmonia do colegiado, devendo atuar como algodão entre cristais. É a forma como o presidente conduz a sessão e a dinâmica dos trabalhos que gera impacto nas deliberações do tribunal e dá segurança para todo o colegiado. O ministro Lewandowski possui os atributos necessários para a missão”, frisou.

Popularidade não, credibilidade

O discurso de Marco Aurélio Mello foi bem diferente dos que comumente são observados durante posses no tribunal e saudações aos ministros. E, seguindo uma linha parecida, foi acompanhado de perto pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coelho. Ele salientou que tanto Lewandowski como a vice-presidenta, ministra Cármen Lúcia, são magistrados que “compreendem o exercício de autoridade”.

Segundo ele, “o magistrado não deve buscar popularidade, mas credibilidade”, numa alfinetada explícita a Barbosa. E pontuou que é preciso respeitar “a forma dos ritos” e zelar “pelo conteúdo de justiça das decisões”. “O grau de civilidade de um povo pode ser medido pela exigência de prova definitiva de fato ilícito para a prolação de juízo condenatório. Não é constitucional o poder utilizado para perseguir pessoas ou ampliar desigualdades”, acentuou.

Já o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, abordou a importância de que ministros do STF valorizem e enalteçam o diálogo, por ser “uma amálgama necessária”. “A abertura e a prontidão ao diálogo, o foco na cooperação interinstitucional, a proatividade na forma de gestão e o reconhecimento de que o Ministério Público é parceiro do poder Judiciário trazem certeza de que frutos significativos serão colhidos nesse biênio”, frisou Janot.

Prestígio e autoridades

A posse de Ricardo Lewandowski contou com a presença da presidenta Dilma Rousseff, do vice-presidente, Michel Temer, dos presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN), assim como políticos de todos os escalões, muitos candidatos nas próximas eleições, como os governadores Agnelo Queiroz (DF) e Geraldo Alckmin (SP) – que tentam a reeleição – deputados federais, senadores e ministros de Estado.

Também foi prestigiada por muitos ministros aposentados do Judiciário e do Executivo, casos de Francisco Rezeck, Sepúlveda Pertence, Ilmar Galvão e os presidentes dos demais tribunais superiores. O senador José Sarney (PMDB-AP), que há poucos meses teve problemas de saúde e anunciou que está se desligando da vida pública, foi um dos primeiros a chegar e fez uma rara aparição, permanecendo durante todo o período na solenidade.

Obsessão por eficiência

Com 66 anos de idade, oito dos quais no STF, o ministro Ricardo Lewandowski é tido como um homem obcecado pela eficiência dos trabalhos. Ele sempre foi muito querido pelos demais ministros, advogados e pela comunidade jurídica e acadêmica de um modo geral. Lewandowski se formou em sociologia, além de Direito, é autor de cinco livros, doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, e professor de Teoria Geral do Estado da Faculdade de Direito da USP.

O ministro é acostumado a organizar forças-tarefa entre suas equipes para agilizar trabalhos e chegou a instituir em seu gabinete uma política de qualidade que garante celeridade na prestação jurisdicional – o que já está colocando em prática desde o mês passado no STF. Ele buscou um modo científico de organização, e implementou o padrão internacional de qualidade ISO 9001, que permite a apreciação de uma liminar em até 48 horas e segue os critérios de “gravidade, urgência e tendência para avaliação da relevância dos processos”.

O novo presidente advogou por muitos anos até ser juiz e, em 1990, ser nomeado para o cargo de desembargador no Tribunal de Justiça de São Paulo. Em 2006, 16 anos após ter sido nomeado desembargador, ele chegou ao Supremo, indicado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Estamos todos muito felizes. Não há quem não goste e não se congratule com o novo ministro. O estilo dele é de um professor que ao mesmo tempo estimula os alunos a estudarem da melhor forma para obterem os melhores resultados. É disso que o Judiciário brasileiro precisa”, afirmou a representante da Federação Nacional dos Servidores do Judiciário Federal (Fenajufe), Sandra Direito.