São Paulo

CPI dos pedágios não encontra irregularidade em tarifas. Para PT, relatório é ‘chapa-branca’

Comissão foi encerrada hoje, após 130 dias e 17 reuniões, com duas conclusões: a da bancada do governo de Geraldo Alckmin e a da oposição, que aponta irregularidades e preços abusivos

Roberto Navarro/Assembleia Legislativa

Deputados Cauê Macris (esquerda), líder do PSDB, e o oposicionista Gerson Bittencourt, do PT

São Paulo – A última reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito constituída para investigar se os valores das tarifas cobradas pelas concessionárias nas rodovias paulistas estavam em consonância com os critérios definidos nos editais de licitação foi realizada hoje (27), na Assembleia Legislativa de São Paulo. Segundo o relatório do deputado Davi Zaia (PPS), ex-secretário de Gestão do governo de Geraldo Alckmin (PSDB), não foi constatado nenhum indício concreto de irregularidade nos cálculos de elaboração das tarifas de pedágios. O relatório foi aprovado pelo colegiado, de maioria governista, por seis votos a dois. Foram 130 dias e 17 reuniões.

Os petistas membros da CPI, que apresentaram voto em separado, contestaram o texto. “O relatório tem a função de defender todas as medidas adotadas nos últimos anos, apesar das irregularidades, discrepâncias e os preços abusivos. Pede gentilmente ao governador que cumpra a lei e tem uma característica oficial de chapa branca”, afirmou o deputado Antonio Mentor. Segundo o relatório paralelo da oposição, elaborado por Mentor e o colega de partido Gerson Bittencourt, negociações para corrigir distorções dos contratos de concessão das rodovias do estado de São Paulo podem levar a uma redução das tarifas de 49% a 51%.

O relatório de Zaia “recomenda” ao governador do estado que, junto com a Agência de Transportes do Estado de São Paulo (Artesp), promova “estudos que possibilitem a redução das tarifas de pedágio”.

O presidente da CPI, o deputado tucano Bruno Covas, também ex-secretário de Alckmin (Meio Ambiente), discorda da afirmação de Mentor, que ontem disse que a preocupação da base governista e do Palácio dos Bandeirantes com a CPI dos pedágios ficou evidente na composição do colegiado, com nomes do alto clero alckmista em postos-chave, como o próprio Covas na presidência, Zaia como relator e o líder do PSDB, Cauê Macris.

“Não há isso de deputado de alto clero e de baixo clero. Todos os deputados aqui são preparados, e dizer isso é um desprestígio aos outros deputados, tão competentes quanto qualquer outro aqui presente”, respondeu Covas.

Para Covas, a afirmação de Mentor de que o relatório de Zaia é “chapa branca” se deve ao período eleitoral. “É a opinião dele, à qual eu respeito. Isso tem mais a ver com o momento eleitoral do que com qualquer questão técnica do relatório.” O tucano comemora o que considera o bom andamento da CPI. “As 17 reuniões tiveram presença maciça. Não deixamos de fazer reuniões por falta de quórum, o que mostrou o interesse e participação dos deputados.”

Para Mentor, apesar de comandada pela base do governo, a CPI foi positiva. “O deputado Gerson Bittencourt e eu demonstramos matematicamente que é possível, sim, a tarifa do pedágio no estado de São Paulo ser reduzida em 49% a 51%”, afirmou.

Além disso, o petista aponta “irregularidades” que, segundo ele, ficaram demonstradas no relatório paralelo divulgado ontem, como a prorrogação dos contratos de concessão em 2006 e “as barbaridades” cometidas na concessão da rodovia Adhemar de Barros na região de Campinas.

“O relatório oficial não viu qualquer irregularidade, nem nos aditivos de 2006, que ainda estão vigentes e podem vigorar a partir de 2018. Entende que o preço dos pedágios é justo. Não faz qualquer recomendação sobre a suspensão dos aditivos e nem para que o Tribunal de Contas do Estado reveja a aprovação desses aditivos”, acrescenta Bittencourt.

Os petistas citaram também, no voto em separado, as contratações de consultorias, pela Artesp, por “preços absurdos”. “A Artesp gasta mais de R$ 1 milhão por mês pagando consultorias. Eles gastam dois terços de sua receita em contratos de prestação de serviços de consultoria. Isso é inexplicável, inaceitável”, diz Mentor.

A prorrogação dos contratos, assinada em aditivos no final de 2006 (no final do governo de Claudio Lembo), pelos quais as concessionárias obtiveram do governo estadual direito para que as concessões fossem estendidas por até oito anos e meio foi o ponto principal questionado pela oposição. Se entrar em vigor na data prevista, em 2018, as empresas que operam as estradas estaduais conseguiriam um faturamento adicional de R$ 2 bilhões, segundo o PT.

‘Reequilíbrio’

A prorrogação foi feita com base em novos tributos que passaram a incidir no serviço prestado pelas concessionárias após a assinatura dos contratos, em 1998, previstos inicialmente para vigorar por 20 anos. As empresas reivindicaram o chamado “reequilíbrio” argumentando que estavam arcando com despesas não previstas. Segundo os petistas, o “reequilíbrio” já estava sendo feito por meio de compensação dos valores pagos referentes aos tributos no pagamento da outorga às concessionárias.

O governo estadual contesta as afirmações petistas dizendo que já moveu seis ações judiciais contra as concessionárias e moverá mais seis. No total, são 12 os contratos assinados em 1998 prorrogados pelos aditivos de 2006. Os aditivos estão previstos para começar a vigorar em 2018. O governo contesta a base de cálculo usada nos aditivos.

“O problema é que se utilizou como critério de recomposição (dos contratos) o movimento projetado de veículos, e não o movimento real. É isso que estamos questionando na justiça. Isso geraria a diminuição do prazo usado para reequilibrar. O estado, em vez de ressarcir o valor de ISS, deu um prazo a mais na concessão. Se recuperarmos isso (na Justiça), teremos um prazo menor na concessão”, afirmou, no dia 20, o procurador-geral do Estado, Elival da Silva Ramos, à reportagem.

Outro fator apontado como causa dos valores “exorbitantes” das tarifas paulistas é o modelo de concessão, a outorga onerosa (valor pago pela concessão), em vez do menor valor da tarifa, como utilizado nas concessões federais.  “Esse é um dos fatores que mais onerou as tarifas de pedágios paulistas”, diz o relatório paralelo. Para os petistas, é preciso renegociar os parâmetros econômicos dos anos 1990 que encarecem as tarifas até hoje, além do reajuste pelo IGP-M, maior do que o IPCA, sugerido por eles. O governo alega que não pode mudar os contratos.

Artesp

Por meio de nota de sua assessoria de comunicação, a Artesp contesta a alegação da oposição a Alckmin sobre as consultorias. “A contratação de consultorias com ampla capacidade e experiência no mercado é comum em todos os segmentos das administrações públicas, sejam elas na esfera estadual, municipal e federal. O trabalho dessas consultorias tem o objetivo de ajudar na tomada de decisões importantes e a orientar os trabalhos de regulação e fiscalização da Artesp. Foi o trabalho dessas consultorias, por exemplo, que ajudou a agência a implantar processos invalidadores dos aditamentos aos contratos realizados em 2006”, afirma.

Segundo a Artesp, esses processos administrativos resultaram em ações na Justiça, em andamento. “Todo esse trabalho, ao contrário do que diz o deputado, não gasta dinheiro. Ele ajuda a economizar dinheiro da agência e do erário público, consequentemente, do cidadão paulista. Aliás, o próprio parlamentar julga que é necessário rever esses aditamentos. O que vem sendo feito pela Artesp”, acrescenta.

De acordo com a agência, “sobre o voto em separado dos dois parlamentares (do PT), é importante dizer que o índice sugerido pelos parlamentares para diminuição das tarifas de pedágio (49% a 51%) é totalmente irreal”. De acordo com a agência, retirar o ônus fixo e variável dos contratos “é rasgar o documento assinado há 16 anos com as concessionárias”. “As concessionárias, com certeza, acionariam a Justiça pela quebra de contrato. Não se pode mudar a regra do jogo em andamento.”

Ainda conforme a Artesp, uma diminuição da tarifa de pedágio pode passar por uma desoneração de tributos federais. “Somente em 2013, as concessionárias que administram as estradas paulistas recolheram para o governo federal R$ 1,34 bilhão em impostos, correspondentes aos descontos de PIS, Cofins, IRPJ e CSLL nas tarifas. Estes impostos equivalem a 16% de todo o valor da tarifa pedágio arrecadada”, argumenta.

Os deputados do PT contestam a concessão referente à rodovia Adhemar de Barros, ganha pela Renovias, cuja licitação impunha a construção de duas praças de pedágios, em Campinas, na divisa com Jaguariúna, e em Mogi Mirim.

Segundo o relatório paralelo de Mentor e Bittencourt, houve manobra na licitação pela qual, em vez de duas, foi construída apenas uma praça, na divisa de Campinas com Jaguariúna. Mas o valor é cobrado em dobro nessa praça. “Hoje o usuário paga R$ 10,10 para veículos de passeio, quando deveria pagar a metade”, afirma Bittencourt.

O governo chegou a entrar com uma ação contra a concessionária em 2011, acusando-a de “enriquecimento sem causa”, mas fez um acordo em 2012, pelo qual a empresa instalou um pórtico do projeto Ponto a Ponto (pedágio automático) em Santo Antonio de Posse. Mentor e Bittencourt consideram a solução insuficiente, já que, segundo eles, os usuários que pagaram o pedágio no passado foram prejudicados e quem não usa o Ponto a Ponto (pedágio automático) continua pagando os R$ 10,10 “para andar 18 quilômetros”.

“A Artesp e o governo do estado trabalham com o objetivo de gerar uma tarifa de pedágio mais justa. Resultado disso já vem sendo obtido pelos usuários de várias rodovias na região de Campinas que aderiram ao Sistema Ponto a Ponto, que tem pagamento por trecho percorrido. Já são quase 65 mil usuários do Ponto a Ponto nas rodovias Engenheiro Constâncio Cintra, Santos Dumont e Governador Adhemar de Barros”, diz a nota da agência. “Outro esforço desenvolvido com o objetivo de se criar uma justiça tarifária foi o reajuste das tarifas realizado em 1º de julho, que foi realizado com índices abaixo da inflação dos últimos 12 meses.”

De acordo com a agência, a arrecadação de impostos incidentes sobre a tarifa de pedágio promove o desenvolvimento regional. “De maio de 2013 até maio de 2014, por exemplo, os pedágios geraram R$ 430,3 milhões a 271 municípios paulistas em Imposto Sobre Serviços, arrecadado pelos municípios que são cortados pelas rodovias. Verba essa utilizada pelas prefeituras para o desenvolvimento das cidades. Não há impostos estaduais sobre a tarifa de pedágio”, afirma a Artesp.

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