Rasteira

A economistas, Jucá declara voto em Aécio e promete derrubar votação de Dilma no Norte

Ex-líder do governo e ex-ministro de Lula, cacique do PMDB se diz aliado do PSDB em defesa da precarização trabalhista e corte em programas sociais, e afirma que política 'socialista' de Dilma 'serve para o Cazaquistão'

Wilson Dias/ Abr

Aécio Neves e Romero Jucá (dir.): aliança contra Dilma, o PT, os direitos trabalhistas e as políticas sociais

São Paulo – O senador Romero Jucá (PMDB-RR), integrante da base aliada do governo de Dilma Rousseff (PT) no Congresso e cujo partido indicou o candidato a vice-presidente na campanha pela reeleição, afirmou na quarta-feira (13) que fará de tudo para que os eleitores da região Norte contribuam para a derrota da presidenta nas urnas. O senador proferiu palestra em evento político do Conselho Regional dos Economistas de Roraima (Corecon), em Boa Vista, com críticas duras à política econômica do governo, e afirmou que, com a morte de Eduardo Campos (PSB), votará no colega de Senado Aécio Neves (PSDB) para presidente – o evento foi realizado horas depois que o avião do candidato do PSB caiu em Santos, no litoral paulista.

Nós tínhamos duas opções de voto: o Aécio e o Eduardo. Hoje, perdemos uma. Então, na verdade, eu não quero forçar ninguém, mas eu vou falar o meu voto. Eu vou votar no Aécio porque eu, do que tem, é talvez o que tenha um pouco mais de condição de mudar essa linha de pensamento que eu acho que não combina com o Brasil”, disse, referindo-se à “linha de pensamento” que direciona a política econômica do governo federal. “Quando você setorializa a pesquisa [eleitoral], o Aécio já passa a Dilma na região Sudeste em 8% e já passa a Dilma na região Sul em 6%. Onde a Dilma tá ganhando? Essa diferença de seis pontos está no Nordeste, no Centro-Oeste e no Norte. Tem que diminuir essa diferença. Se depender de mim, Roraima vai diminuir essa diferença”, completou.

À plateia de economistas e empresários, Jucá reiterou diversas vezes os problemas da gestão “socialista” de Dilma. “Você tem que ganhar produtividade. Você tem que ganhar competitividade. E é nisso que o governo do PT falha, porque ao pender para a linha ideológica, o governo do PT quer taxar, limitar a taxa de retorno, tirando do jogo a produtividade do empresário. E quer aumentar direitos sociais que tiram a competitividade”, afirmou. “Porque o discurso dela é socialista e a prática dela é socialista. Então, você tem um governo ideológico na forma de comandar a economia. E na ideologia, centralização, estabilização, não combina com o capitalismo. Não combina. Isso dá certo na Albânia, dá certo nos países do Cazaquistão, onde a visão é outra.”

Jucá, que é relator no Senado do projeto de lei que pode mudar a definição legal de trabalho escravo, afirmou ainda que o modelo econômico da China, acusado por organizações internacionais de direitos humanos de promover o trabalho forçado em condições degradantes, é melhor que o “bem-estar social” promovido pelo PT, e atacou os direitos trabalhistas.

“Nós estamos discutindo aqui, no mercado internacional, a competitividade do produto brasileiro com o produto chinês, que não tem [contribuição ao] INSS, não tem licenciamento ambiental, não tem nenhum tipo de custo direto que não era pra ser. E nós estamos aqui discutindo se a gente vai baixar de 44 horas para 40 horas semanais a capacidade de trabalho do trabalhador brasileiro. Ou seja, nós estamos querendo imitar um modelo que não deu certo. Nós estamos querendo importar um modelo que é um modelo do bem-estar social, mas o bem-estar social tem que estar ligado ao bem-estar da produção, a capacidade efetiva de você dialogar com o mercado internacional e discutir”, ponderou.

O lucro dos empresários sobre os direitos do trabalhador não integra apenas o discurso de Jucá, mas sua prática no Legislativo. O senador do PMDB é também relator da regulamentação dos direitos garantidos às empregadas domésticas por meio da emenda à Constituição 72, aprovada em 2013, mas promoveu mudanças no projeto que impediriam a contribuição sindical para a categoria e criariam regras distintas para o seguro-desemprego. Além disso, enquanto o projeto não é votado, as trabalhadoras domésticas seguem sem base legal para reivindicar folgas semanais, piso salarial e outros direitos.

Rancor

Jucá, que foi líder do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Senado de 2006 a 2010, seguiu na posição de articulação política após a eleição de Dilma. Em 2012, porém, foi substituído por Eduardo Braga (PMDB-AM) por não trabalhar pelas prioridades apontadas pelo governo no Congresso. Desde então, jurou vingança política contra a presidenta. Além da campanha pelo PSDB, partido a que foi filiado até 2002, Jucá também reforça o discurso oposicionista que apresenta os governos de Dilma e de Lula como antagônicos, e não de continuidade, em uma manobra para tentar enfraquecer o apoio do ex-presidente à reeleição da atual presidenta.

“Aí a gente tem que dividir um pouco o governo da Dilma do governo do Lula. O presidente Lula era um artista, vocacionado para a política e com um sentimento muito grande. Ele não é economista, ele não tem nível superior, mas ele aprendeu na vida, com sensibilidade, com experiência, ganhando e perdendo, e ele fazia ou faz um discurso social, às vezes quase socialista, no discurso, na divisão de renda, nos predicados que, de certa forma, buscam mais a igualdade e a distribuição de renda, mas, na prática dele, é uma prática capitalista”, pontuou, durante a fala ao Corecon.

Jucá soma à dissidência pessoal o sentimento antipetista que se fortaleceu em Roraima desde 2005, quando o governo Lula contrariou a elite local com a demarcação das terras indígenas de Raposa e Serra do Sol. Desde então, o PT encontra dificuldades eleitorais no estado: em 2006 e 2010, Geraldo Alckmin e José Serra (ambos do PSDB) tiveram votação acima de 50% no estado tanto no primeiro quanto no segundo turno, embora Lula tenha vencido os dois turnos das eleições de 2002. Segundo pesquisa ibope de agosto deste ano, o quadro mudou em 2014: Dilma tem 46% das intenções de voto em Roraima, contra 24% de Aécio Neves, que tem dificuldades para se estabelecer como alternativa à presidenta fora das regiões Sul e Sudeste.

O tom de guerra fria é recorrente entre as lideranças de perfil mais conservador do PMDB. No Maranhão, onde Lobão Filho está mais de 40 pontos percentuais atrás de Flávio Dino (PCdoB) na disputa para governador, o discurso também é ácido: panfletos do candidato governista, apoiado por Roseana Sarney (PMDB), dizem que a eleição “tem dois lados”, e opõe imagens de Lobão Filho beijando a mão do papa João Paulo II sobre fundo azul à silhueta de Dino, sobreposta pela foice e o martelo da bandeira da extinta União Soviética, com fundo vermelho.

Verticalização

Os “rebeldes” regionais do PMDB foram institucionalizados a partir de 2006, quando a Câmara dos Deputados derrubou, por 343 votos contra 143, uma norma do Tribunal Superior Eleitoral que obrigava os partidos a repetirem a aliança em torno do candidato a presidente nas coligações para disputa a governador, a chamada verticalização das alianças. De um lado, caciques regionais defendiam o direito de oficializar acordos locais que não necessariamente estivessem em sintonia com os objetivos programáticos nacionais de uma aliança política; de outro, estavam deputados favoráveis ao fortalecimento dos partidos e dos projetos políticos na composição das alianças.

Naquela época, o apoio do PMDB à mudança de regra já tinha a ver com o diálogo difícil com o PT: às vésperas da eleição de 2006 e de um acordo formal entre as legendas, as lideranças estavam divididas. O PT defendeu a verticalização pelo fortalecimento dos partidos, mas Lula se colocou contra o que considerava “aliança à força”. A regra só valeu para aquela eleição por decisão do STF, que foi provocado a decidir se a mudança, aprovada em janeiro do ano eleitoral, poderia valer para o mesmo ano.

No dia da palestra de Jucá, Aécio fazia campanha no Rio Grande do Norte ao lado de outro peemedebista, Henrique Eduardo Alves, eleito presidente da Câmara dos Deputados em acordo com o PT – desde que se coligaram, PT e PMDB revezam, a cada dois anos, as presidências da Câmara dos Deputados, do Senado e do Congresso.

No Rio de Janeiro, a esquizofrenia das alianças eleitorais deste ano é mais gritante: lá, o PT tem candidatura própria, mas, pelo acordo que manteve Michel Temer (PMDB) como candidato a vice-presidente, Dilma também tem de apoiar o candidato a governador Luiz Fernando Pezão (PMDB), que tem materiais de campanha “mistos”, em que aparece como candidato da presidenta e também de Aécio.

No total, coligações apoiadas oficial ou extraoficialmente pelo PMDB vão enfrentar chapas integradas ou apoiadas pelo PT em 17 estados. Em outros dez estados, repetirão a aliança nacional, embora o PMDB seja cabeça de chapa em sete delas. O racha com o PT colocou o PSDB na mesma chapa dos peemedebistas em pelo menos quatro estados: Acre, Bahia, Ceará e Espírito Santo.

Ouça a palestra de Romero Jucá em Roraima: