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Alckmin retira do ar sites úteis, mas mantém propaganda no Facebook

Em nome da obediência à lei eleitoral, governador suspende sites de secretarias e retira conteúdos de interesse público, mas redes sociais divulgam inaugurações

Há mais de uma semana perfil da secretaria paulista no Facebook exibe fotos de inauguração de Alckmin

São Paulo – O internauta que acessa a página da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação ou da Secretaria do Emprego e Relações de Trabalho na busca por informações vai encontrar apenas uma página em branco, com o brasão do governo estadual e o seguinte aviso: “Em atendimento à legislação eleitoral (Lei nº 9.504/1997), este site ficará indisponível de 5 de julho de 2014 até o final da eleição estadual em São Paulo.”

Outros sites de secretarias, órgãos e autarquias até continuam no ar, mas de maneira parcial, com links para alguns serviços. É o caso das pastas de Educação, Saúde, Segurança Pública, Justiça e Defesa da Cidadania, Meio Ambiente e Cultura, além do Metrô. Já o site do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, ligado à Secretaria de Saúde, traz, além da tarjeta, apenas um número de telefone.

De acordo com a advogada do Centro de Referência Legal da organização Artigo 19, Karina Quintanilha, a lei eleitoral se refere apenas à veiculação de publicidade institucional nos três meses que antecedem o pleito (artigo 73, inc. VI, b) que possam afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos durante as eleições. Essa legislação, no entanto, não traz critérios específicos sobre o procedimento a ser adotado nos sites dos governos para vedar a publicidade institucional.

“Não existe nenhuma norma na legislação eleitoral que exija a suspensão prévia de sites dos governos da internet para evitar a publicidade institucional, o que seria medida inconstitucional, tendo em vista o direito ao acesso à informação pública previsto na Constituição Federal, regulamentado pela Lei de Acesso à Informação.”

Uso da máquina

O que o artigo 73 da legislação eleitoral pretende, segundo ela, é coibir condutas que possam afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais. Por esse motivo, a restrição de informação somente pode ocorrer quando houver manifesta intenção de dar publicidade à informação que privilegia determinado candidato. Em nenhuma hipótese prevista na lei, existe a possibilidade de suspender todo o conteúdo do site.

Isso quer dizer que a internet não pode ser usada para fazer publicidade de inaugurações de obras, por exemplo, como faz Alckmin nas páginas de Facebook, da Secretaria de Gestão Pública do Estado de São Paulo e do próprio Poupatempo. Ambas postaram, no último dia 2, informação da inaugurações da unidades do Poupatempo em Caieiras, na Grande São Paulo, e em Jacareí, com link para dezenas de fotos, além das publicadas na página principal.

“A lei permite que a internet seja usada para a publicação de notícias de interesse público, como informações ‘secas’ sobre o funcionamento das linhas do metrô, por exemplo, ou mesmo da inauguração de uma unidade do Poupatempo mais próxima. Agora, a notícia qualificada, com detalhes e fotos da inauguração, é uma forma de propaganda. Por isso, é ilegal”, afirma o presidente da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP), Alberto Rollo.

Ainda segundo o advogado, mesmo que a notícia no Facebook tenha sido postada antes do início de vigência do período que proíbe esse tipo de propaganda, três dias já seriam o suficiente para a difusão da informação entre os internautas e já poderia ter sido retirada da página.

De acordo com Rollo, Alckmin infringe a lei ao manter as páginas e pode ser penalizado pelo Tribunal Eleitoral com a impugnação do registro da candidatura e multa. “A alegação de defesa mais comum, e aceita, é o desconhecimento da veiculação das notícias”, diz, ressaltando, ainda, que a análise de casos semelhantes mostra que as decisões da Justiça Eleitoral depende do entendimento de cada tribunal.

Especializado em direito eleitoral, o advogado Luciano Santos, de São Paulo, também estranha a retirada de conteúdos e de sites pelo governo. “É uma medida excessiva. Não dá para entender a retirada de informações essenciais”, comenta. No entendimento dele, a atitude pode até mesmo ser uma estratégia de campanha, para reforçar junto ao eleitorado a imagem de governador que não utiliza a máquina administrativa em benefício próprio.

Prejuízo ao consumidor

Para o presidente do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor (Idecon), o advogado Reginaldo Araújo Sena, as mudanças nos sites ligados ao governo paulista, com retirada total ou parcial do conteúdo, fere o Código de Defesa do Consumidor (CDC). “O governo não pode negar ao cidadão informações úteis, de seu interesse, e muito menos confundi-lo ou induzi-lo ao erro ao modificar totalmente a apresentação do site, causando prejuízo ao acesso à informação já conquistado pelo cidadão”, garante.

Segundo o advogado, o artigo 22 do CDC determina que o poder público tem a responsabilidade de fornecer serviços de qualidade e a informação faz parte do serviço eficiente. “Logo, uma informação incompleta compromete a qualidade do serviço prestado.”

Para a advogada Karina Quintanilha, da Artigo 19, os governantes não podem restringir o acesso à informação de utilidade pública de todos os cidadãos sob o pretexto da lei. “Pelo contrário, deveriam adaptar as informações existentes no site à medida necessária para evitar possíveis abusos para promover um determinado candidato.”

Karina concorda que a retirada integral ou parcial de sites sem nenhum critério ou embasamento legal é medida desproporcional para evitar o uso da máquina pública em benefício de candidatos. E a Artigo 19 reafirma que a Lei de Acesso à Informação deve estar em pleno funcionamento e ser amplamente observada também em épocas eleitorais. “Frise-se que os dispositivos que regem as possibilidades de sigilo não devem ser usados de maneiras injustificadas, a fim de prejudicar a livre circulação de informações.”

Resposta

Após a publicação da reportagem, o governo do Estado, por meio da assessoria de imprensa da Secretaria de Gestão Pública, encaminhou nota oficial em resposta aos comentários feitos pelos advogados ouvidos pela RBA. Confira, abaixo, a íntegra do texto:

Em resposta à matéria “ALCKMIN RETIRA DO AR SITES ÚTEIS, MAS MANTÉM PROPAGANDA NO FACEBOOK”, o Governo do Estado de São Paulo esclarece que o período de restrição de conteúdo publicitário, conforme determina a legislação eleitoral (Lei nº 9.504/1997), deu-se a partir do dia 5 de julho do ano vigente. Assim sendo, diferente do afirmado pelo advogado consultado para a matéria, não houve, em absoluto, infração à lei por quaisquer publicações que tenham ocorrido antes do referido período – inclusive as apontadas na matéria, devidamente datadas de 2 de julho.

Em tempo, Governo de São Paulo segue rigorosamente a legislação eleitoral (Lei nº 9.504/1997), que proíbe, no período que antecede às eleições, qualquer tipo de publicidade institucional – o que inclui aquela veiculada em sites institucionais e perfis oficiais em redes sociais. Para o Governo de São Paulo, seguir a lei não é uma opção – é uma obrigação, em respeito a todos os cidadãos e eleitores do Estado.

Todos os serviços essenciais à população – telefones úteis, delegacia eletrônica, ambientes para solicitação de documentos e para agendamento de consultas médicas, informações sobre transporte público, entre tantos outros – continuam e continuarão disponíveis.