Bastidores

Parlamentares já admitem erro em alardear uma CPI que ninguém de fato quer

Parlamentares do governo e da oposição já questionam, em reservado, desgaste das investigações e acham que confusão pode arranhar ainda mais imagem e credibilidade do Legislativo

jane de araújo/agência senado

Renan Calheiros defendeu que, se é para investigar, que a CPI seja ampla, sem restringir nenhum dos temas sugeridos

Brasília – Enquanto parlamentares do governo e oposição bradam para os holofotes discussões sobre o formato que terá a comissão parlamentar de inquérito (CPI) que vai investigar a Petrobras, nos gabinetes do Congresso, senadores e deputados dão sinais de que a questão toda foi um erro político que cresceu e tomou corpo de forma inesperada.

Alguns líderes governistas, durante reuniões nesta quinta-feira (10), chegaram a comentar em reservado que, no fundo, não há interesse por parte de nenhum dos lados em dar seguimento às investigações, mas a confusão pode resultar em um caminho sem volta em termos de desgaste para ambas as partes.

O entendimento desses líderes é de que houve inabilidade quando a oposição falou em CPI. Primeiro porque os próprios parlamentares não esperavam obter o número de assinaturas suficientes para a sua criação. Segundo porque, mesmo obtendo, o resultado das apurações – que dão trabalho e atrapalham agendas de campanha – não valeriam o esforço. Conversas de bastidores nos últimos dias dão conta de que, com variados focos de investigação sobre a Petrobras, a oposição poderia se perder nas apurações – e nem conseguir arranhar mais do já arranhou o governo.

Houve, ao mesmo tempo, falta de poder de articulação por parte da base aliada quando, em vez de deixar a comissão ser instalada, propôs a ampliação das apurações para projetos que envolvam também denúncias referentes a gestões do PSDB e do PSB.

Em relação às investigações sobre governos do PSDB e PSB, também, a situação não é muito definida. A base aliada tem se municiado das denúncias que já estão sendo apuradas pelo Ministério Público sobre o cartel envolvendo contratos no metrô de São Paulo durante gestões tucanas. E, no tocante ao PSB, parlamentares tentam ainda encontrar pontos obscuros em projetos de internet sem fio em dois estados governados pelos socialistas – Pernambuco e Paraíba.

No caso do Porto de Suape, em especial, as informações iniciais são de que o ponto de partida das apurações é uma recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU) apontando indícios de superfaturamento em obras de terraplenagem na área que dá acesso à refinaria de Abreu e Lima, mas tais indícios “podem ate já ter sido corrigidos”, como assegurou um deputado governista.

Exemplos anteriores

Para observadores políticos, o prejuízo maior é para o Congresso. Para a imagem da Casa, já que um trabalho esvaziado, provocado por objetivos eleitorais, pode banalizar uma ferramenta importante do Legislativo, que são as comissões de inquérito. E para o ritmo de apreciação das matérias que aguardam votação.

Um dos principais temores é de que a comissão siga o mesmo caminho da CPMI do Cachoeira, em 2012.

Também chamada de “CPMI do Fim do Mundo”, por englobar a apuração de fatos referentes a temas diversos, a comissão teve como objetivo principal investigar elos de políticos e empresários com Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, após a operação Monte Carlo, da Polícia Federal. O trabalho levou à cassação do senador Demóstenes Torres (DEM-GO), mas a CPMI teve momentos de constrangimento, em que 19 dos depoentes se valeram do direito de não dizer uma única palavra.

No final, um relatório de 4 mil páginas, que não obteve consenso, foi reduzido a duas únicas páginas sem sugerir o indiciamento de nenhum dos suspeitos no envolvimento com o esquema criminoso. Enquanto o saldo da convocação de 35 pessoas, bem como o pagamento de diárias, passagens aéreas e demais gastos, renderam um custo de quase R$ 168 mil para o Congresso, segundo dados da Câmara e do Senado.

‘Congresso perde’

“Quem perde é o Congresso. No caso da Petrobras já existia uma comissão externa investigando isso na Câmara. Além disso, já há a investigação do TCU e outra em curso pelo Ministério Público. A criação da CPI consistiu meramente de estratégia eleitoral”, afirmou o cientista político e consultor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antonio Carlos Queiroz, o Toninho.

De acordo com ele, a movimentação pela CPI consistiu numa mera tentativa da oposição de desgastar o governo. “Só que não esperavam conseguir as assinaturas necessárias para sua instalação”, enfatizou. Queiroz é da opinião que, se o STF não restringir o escopo das apurações, a oposição poderá retirar seus nomes da comissão com o argumento de não concordar com a CPI ampla e, com isso, os trabalhos ficarão esvaziados. “Não vejo interesse de ninguém, no momento, investigar coisa alguma.”

O cientista político acredita que, num ano cujo primeiro semestre praticamente encontra-se em vias de acabar (diante da realização da Copa do Mundo e o início do semestre de eleições, a partir de julho) e com a especificidade de tantas matérias importantes estarem aguardando votação no Congresso, a discussão em torno da CPI só tumultua ainda mais a produção legislativa.

Informações desencontradas dão conta de que líderes já teriam se reunido e chegado à conclusão de que a melhor das hipóteses seria uma comissão menor, apenas no âmbito do Senado. Apesar disso, no início da tarde, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), evitou tecer comentários sobre informações de bastidores e defendeu que, se é para investigar, que a CPI seja ampla, sem restringir nenhum dos temas sugeridos.

Embora tenha sido objeto de polêmicas por ter afirmado já existir precedente a respeito da questão no Supremo Tribunal Federal (STF), numa decisão anterior que permitiu que CPIs tivessem caráter mais amplo – declaração contestada depois pelo ex-ministro Paulo Brossard – Calheiros disse que se não for possível apurar tudo o que foi solicitado pelos requerimentos numa única CPI, outras comissões deveriam ser criadas em paralelo.

“Se vamos investigar, que se investigue tudo.  Acho que o Brasil quer isso. Fica muito difícil CPI que só pode investigar determinados fatos e não pode investigar outros. Fica muito difícil dizer que se quer CPI nesta condição”, frisou, numa espécie de recado para os colegas.

O presidente do Senado ressaltou ainda, que a Casa já chegou a ter cinco CPIs tramitando em paralelo e existem momentos na vida nacional em que passa a ser importante a realização de várias investigações ao mesmo tempo. “Há respostas a serem dadas e fica difícil limitar. Se existe problema em algum lugar e são necessários esclarecimentos, então vamos apurar”, acentuou.

Terça-feira

Está confirmado que a leitura de todos os requerimentos pedindo a criação da CPI acontecerá de uma única vez, na próxima terça-feira (15). Definido o tipo de comissão a ser criada (se só do Senado ou mista) e a abrangência das investigações, será instalada a composição da mesma.

Até o fechamento desta matéria, o Supremo Tribunal Federal (STF) ainda não tinha se posicionado a respeito dos dois mandados de segurança pedindo para ser avaliada a legalidade da CPI. O primeiro, da oposição, pergunta se é possível uma CPI com margem de apuração tão vasta. O segundo, do PT, questiona a justificativa do requerimento que pede a CPI, com o argumento de que o texto se baseia em fatos desconexos envolvendo a Petrobras.

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