Intolerância

Vereador gaúcho pede demissão de servidora da Câmara por ser ateia

Funcionária da Câmara Municipal de Antônio Prado foi repreendida por Alex Dotti (PMDB) em discurso no plenário por postar em perfil no Facebook que não acredita em deus

Câmara

O crucifixo colocado em plenário resultou num debate acalorado e em ameaças à servidora que o contestou

São Paulo – O município de Antônio Prado, a 181 quilômetros de Porto Alegre, acompanha há um mês um debate religioso acalorado que teve início na Câmara Municipal: em 4 de fevereiro, na sessão inaugural do Legislativo, o vereador Alex Dotti (PMDB) utilizou o microfone do plenário para pedir a demissão da assessora de imprensa da Casa, Renata Gigghi, por ela declarar publicamente que não acredita em deus. A Câmara não acatou a sugestão do parlamentar, mas ele teria ameaçado processá-la por ter se sentido ofendido em sua fé. Por outro lado, a Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (ATEA) estuda a possibilidade de representação ao Ministério Público por intolerância religiosa. Dotti foi procurado para comentar o assunto, mas não respondeu aos telefonemas da RBA.

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A retirada do crucifixo para atividades com crianças irritou o vereador

“Me chamou a atenção a falta de fé da nossa assessora de imprensa”, iniciou Dotti, de acordo com a ata pública da sessão, disponível na página de internet da Câmara. “Não tenho nada contra ela, ela pensa o que ela quiser, só que para mim ela é a voz da Câmara e acho que isso, numa cidade onde a maioria tem uma religião e acredita em deus, eu acredito que não pega bem, e acho que é muito errado pronunciar-se contra deus”, afirmou o vereador, que pediu “a exoneração da assessora de imprensa e a troca urgente, porque a cidade de Antônio Prado é uma cidade de fé”.

Renata, que diz ter sido pega de surpresa pela reação do parlamentar, conta que a implicância com sua descrença religiosa começou no ano passado. “Quando comecei a trabalhar com o projeto Aluno Cidadão, levávamos as crianças para conhecer a Câmara e falávamos sobre o papel do Estado, sobre a nossa Constituição, que é laica, e de como a Câmara é a casa do povo, que representa a todos, sem exceção.

Tinha um crucifixo no plenário e, quando eu levava as crianças, retirava, porque achava que não tinha nada a ver com a mensagem que estávamos transmitindo, de diversidade”, conta. Por reclamação de parlamentares que perceberam que o crucifixo não estava sempre no plenário, Renata teve de passar a deixar o objeto cristão ali durante as visitas escolares.

Em janeiro, dias antes do discurso de Dotti no plenário, Renata iniciou uma discussão pública sobre religião com familiares e amigos em sua página do Facebook, e o vereador se manifestou pela primeira vez. “Ele já entrou xingando e ofendendo meus conhecidos, e eu tive de pedir a ele que nos respeitasse. Ele se despediu dizendo: ‘nos falamos, colega’, e aí veio o discurso”, completa.

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Renata Gigghi

Renata conta que já recebeu telefonemas agressivos na Câmara desde o episódio, mas que a maior parte das manifestações é de apoio. “Diferentemente do que diz o vereador, que minha posição incomoda a cidade, tenho recebido muito apoio, inclusive de católicos, evangélicos, e até de um budista”, diz.