Seca em SP

Água: agência diz que São Paulo deve estar pronto para ‘tempos muito difíceis’

Presidente-diretor da Agência Nacional de Águas afirma que renovação da outorga do Sistema Cantareira para a Sabesp, em agosto, deverá ter mais regras, e critica bate-boca entre Alckmin e Cabral

Michele Sprea/Folhapress

Após verão seco, região metropolitana entra em período de estiagem que agravará situação

São Paulo – Presente a audiência pública da Comissão de Infraestrutura da Assembleia Legislativa de São Paulo, o diretor-presidente da Agência Nacional de Águas (ANA), Vicente Andreu Guillo, afirmou hoje (25) que a renovação da outorga do Sistema Cantareira para a Sabesp, prevista para agosto deste ano, deverá conter mais regras para atender à realidade hídrica de São Paulo, prejudicada desde novembro por uma estiagem atípica durante o verão. “Hoje, há apenas autorização de vazão mínima e máxima de água no Sistema Cantareira, mas não há regras sobre quando a vazão pode aumentar ou diminuir em diferentes situações de capacidade dos reservatórios. Atualmente, essa é uma decisão política e, durante este período, todo mundo está virando operador de reservatório”, criticou.

Guillo criticou ainda o governo paulista por considerar adiar a renovação da outorga de retirada de água do Cantareira à Sabesp devido à escassez de água. “Essa situação, em que a população está atenta ao tema, deveria ser aproveitada para intensificar os debates públicos sobre a outorga até agosto, inclusive para melhorar as regras da outorga”, propõe. A urgência de abrir o debate sobre o abastecimento de água se dá, principalmente, pela perspectiva de que este será um ano crítico para a região metropolitana de São Paulo. “Estamos terminando a época de chuvas, não há perspectiva de chuvas atípicas e haverá estiagem. Temos de nos preparar para tempos muito difíceis.”

O diretor-presidente da ANA se pronunciou ainda sobre a troca de farpas entre os governadores de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), em torno de projeto sugerido pelo tucano de levar para a região metropolitana de São Paulo águas do Rio Paraíba, que também abastece a população fluminense. Ambos afirmaram publicamente que defenderiam as águas de suas respectivas populações.

“Na lei brasileira, há dominância sobre águas, mas isso não significa quem deve cuidar delas. A água é do povo brasileiro”, afirmou. “Estou apreensivo com o tom adotado pelos governadores, porque a única solução é o consenso entre as partes.” Guillo reforçou que são integralmente de domínio estadual os rios que nascem e encontram o mar dentro de um único ente federativo, mas que essa situação é “raríssima”. “Mais cedo ou mais tarde, a água escoa em alguma água federal, que são os rios interestaduais ou de fronteira, o que significa que sempre há impacto a outras populações.”

A disputa em torno de São Paulo, por exemplo, envolve Minas gerais, onde estão as nascentes dos rios que abastecem o Sistema Cantareira e que já estão nos planos de captação do governo estadual mineiro, e também o Paraná, onde, segundo a ANA, o governo estuda a possibilidade de retirar água do Rio Ribeira. “Fora os conflitos internos. Em São Paulo, você pode tirar água do Rio Paraíba para a região metropolitana, mas como ficam os outros municípios da Bacia PCJ? A região de Campinas já recebe menos do que reivindica. No Rio de Janeiro também há conflito interno entre a região de Campos e a região metropolitana da capital”, exemplificou.

A situação é agravada pelo momento em que acontece o debate: o Rio Paraíba estará em vazão mínima a partir de abril, quando começa o período de estiagem e é difícil fazer projeções sobre o impacto da retirada de água em uma situação de normalidade. “É necessário que Rio, São Paulo, Minas e Paraná apresentem seus números, seus projetos, e construam um consenso para garantir o abastecimento no futuro”, defende Guillo.

O diretor-presidente da ANA participou do debate ao lado do deputado estadual Alencar (PT-SP), presidente da comissão, de Paulo Massato, diretor metropolitano da Sabesp, e de José Eduardo de Campos Siqueira, diretor da Federação Nacional dos Urbanitários. Massato, falando em nome da presidenta da estatal, Dilma Pena, ausente por motivos de saúde de familiar, defendeu que a situação atual é resultado de um fenômeno climático atípico.

“Existe uma zona de baixa pressão sobre todo o planeta, desde a Austrália e a costa Oeste dos Estados Unidos até aqui. É um fenômeno que causa altas temperaturas e poucas chuvas, o que nos levou à situação atual”, pontuou. De acordo com ele, a estiagem deste ano é a pior da história da região metropolitana, superando a de 1953, que era utilizada pela empresa como modelo para planejamento.

Massato ressaltou que entre 1991 e 2000, havia uma tendência de redução dos habitantes do centro expandido de São Paulo, e que, entre 2000 e 2010, essa tendência se inverteu: as periferias estão crescendo menos, e o centro deixou de diminuir e voltou a acumular habitantes. “Estamos entrando agora nesse novo ciclo, que muda a tendência do consumo de água na região metropolitana”, afirmou, e defendeu os investimentos da Sabesp no período.

As principais ações para o momento, segundo ele, são as campanhas de conscientização, o programa de desconto nas contas de água de quem economiza e a flexibilização do volume mínimo dos contratos fixos – como, por exemplo, o mantido com a prefeitura de Guarulhos, que compra água por atacado da Sabesp e, desde semana passada, sofre com racionamento.

Mesmo com essas ações, no entanto, a expectativa do governo estadual é que os reservatórios úteis do Sistema Cantareira estejam secos até junho, quando começará a ser utilizado o chamado “volume morto”, água abaixo da captação das bombas. O sistema Cantareira tem cerca de 400 milhões de metros cúbicos de água no volume morto, ou aproximadamente 40% do volume útil, acima das bombas.

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