Fórum Econômico Mundial

Em Davos, Dilma tenta ‘ganhar’ mercados e evitar ataques especulativos

Para analistas, participação da presidenta em encontro tem objetivo de oferecer garantias para eventual segundo mandato

Roberto Stuckert Filho/PR

Presidenta desembarcou ontem na Suíça

São Paulo – A presidenta Dilma Rousseff faz hoje (24), às 11h15, horário de Brasília (14h15, no horário local), pronunciamento no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. É a primeira vez que ela participa do evento desde que assumiu a presidência da República, em janeiro de 2011. Desde 2008, início da crise econômica internacional, um presidente do Brasil não participa do Fórum de Davos.

O evento acontece uma vez por ano e reúne vários dos principais líderes empresariais, leia-se mercado financeiro, e políticos do mundo. A presidenta chegou a Zurique nesta quinta-feira e visitou a sede da FIFA.

Dilma chega ao evento cercada de expectativas sobre as diretrizes econômicas de seu governo, pressionada pelo mercado e em ano eleitoral. A participação da presidenta soa como um “agrado” ao  mercado financeiro e serve para enfatizar as boas relações com os investidores internacionais, num momento em que as expectativas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país para 2014 oscilam de 1,5% a 2%, com as previsões mais otimistas chegando a 3%.

“Há um certo conflito de expectativas, recuo de investimentos, um monte de noticias negativas e especulações sobre rebaixamento (da classificação de risco da economia brasileira). O que Dilma quer evitar é que haja movimentações negativas, rebaixamento, desconfianças, e que o capital vá embora, o que seria um cenário muito ruim em vésperas de eleições”, analisa Giorgio Romano Schutte, professor doutor e coordenador do curso de relações internacionais da Universidade Federal do ABC.

“Uma das hipóteses é que Dilma está tentando apaziguar os ânimos de potenciais investidores no Brasil. Dado que a Dilma está em um cenário de provável reeleição, quem sabe o que ela vai fazer se ela tiver mais um mandato? Então ela pode estar com interesse justamente em tranquilizar os investidores, assinalando mais uma continuidade do que uma ruptura para o segundo mandato”, acredita Thomas Heye, professor do  Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense.

Especula-se que setores descontentes com a manutenção de um governo de centro-esquerda no Brasil, com diretrizes pouco afeitas às regras do mercado financeiro internacional, estariam articulando um “ataque especulativo” à economia brasileira – daí a importância política de Dilma em Davos.

“Se é para atacar a política do governo, é agora. Seria uma aposta num desgaste que poderia abrir caminho para uma improvável, mas eventual, vitória de outro candidato”, diz Schutte. Porém, ele considera que o mais plausível é que o mercado esteja interessado em garantir que o governo se comprometa com políticas que o setor financeiro quer, como, por exemplo, um compromisso mais forte com o superávit primário.

Para Giorgio Schutte, “o que o setor empresarial e sobretudo o financeiro quer ouvir da Dilma são compromissos dela com o receituário liberal, porque aí, para esses setores, tanto faz se ela ganha ou outro ganha as eleições”.

O problema, diz ele, é que tanto para o mercado quanto para a própria sociedade brasileira, a política econômica do governo não está clara. Não há uma indicação sobre os rumos que o país deve seguir no segundo mandato de Dilma Rousseff.

“O governo não diz qual é o jogo dele. Aí que está o problema. Assim, a própria base social fica perdida e ao final você não convence nem um lado nem o outro.”

“Se o governo dissesse, por exemplo: não vou atingir o superávit primário, não porque houve uma queda de arrecadação, mas porque usei parte desta disponibilidade fiscal para outras prioridades que eu tenho, como manutenção do emprego, da política do salário mínimo, de distribuição de renda, e com isso vou sacrificar um pouco o superávit primário, tudo bem. Mas o governo não diz, falta clareza”, explica Schutte.

Para ele, o governo está tendo enorme dificuldade em fazer-se entender e nesse caso o problema pode ser a comunicação.

Mas as coisas podem se complicar, em termos de “confiança do mercado”, se a questão não for apenas a comunicação. “Esperamos que falte clareza na comunicação. Mas pode ser que falte clareza na própria política, porque este é um governo de composição, tem vários interesses”, especula.

Guido Mantega

O mercado também estaria interessado em alguém mais conservador para ocupar o lugar do ministro da Fazenda Guido Mantega, alguém com um perfil semelhante a Antonio Palocci, por exemplo.

Na opinião de Thomas Heye, Mantega, desde o governo Lula, não é uma personalidade muito “crível” no mercado financeiro, no cenário econômico internacional.

“Ao longo dos últimos anos, sucessivamente, ele vem perdendo credibilidade. As previsões dele em relação à inflação, e outros fatores, não foram muito bem sucedidas somadas a tentativas de maquiagem nas contas públicas”, explica.

Giorgio Romano concorda: “Começou lá atrás. Quando Nelson Barbosa (secretário executivo da Fazenda) saiu [em junho de 2013], começou a tentativa de dizer ‘nós conseguimos o superávit’, mas com truques tão visíveis que era até patético”.

“Podem ser boatos de bastidores, mas se eles começam a falar, isso ganha força política”, vaticina Giorgio Romano Schutte, sobre a suposta saída de Mantega.

A comitiva levada pela presidenta não deixa dúvidas sobre a importância que ela atribui a sua ida a Davos: além de Mantega, os ministros de Relações Exteriores Luiz Figueiredo e de Comunicação Social Helena Chagas, o assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais Marco Aurélio Garcia, o presidente do Banco Central Alexandre Tombini, e o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) Luciano Coutinho. “Não ficou ninguém no Brasil”, brinca Schutte.

Para Heye, existe um significado simbólico importante na ida de Dilma a Davos. “Existe a preocupação por parte da diplomacia brasileira em tentar se reinserir no cenário internacional de uma maneira contundente. A gente teve aquela grande onda de crises, com a crise europeia de 2008. As campanhas nas ruas em junho do ano passado mostraram que as coisas não estavam tão bem assim aqui. O Brasil se marginalizou um pouco dos fóruns internacionais, dando muito mais peso para a retórica bolivariana na América Latina”, lembra o professor da UFF.

“Ir a Davos é uma maneira da Dilma mostrar para o mundo que ainda estamos entre as dez economias mundiais e ainda somos interessantes, e queremos participar desse jogo”.