Ditadura

Comissão da Verdade de São Paulo quer investigar cadeia de comando da torturta

Em 2014, grupo paulista dará menos ênfase a depoimentos de vítimas e vai mirar hierarquia da repressão no regime militar

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São Paulo – A Comissão da Verdade de São Paulo, grupo parlamentar criado pela Assembleia Legislativa de São Paulo para contribuir com a Comissão Nacional da Verdade, pretende mudar o foco dos trabalhos em 2014 para dedicar menos tempo aos depoimentos de vítimas da ditadura (1964-1985) e mais na identificação dos agentes de repressão da ditadura e a origem das ordens para sequestros, tortura e extermínio realizados pelo Exército e pela Polícia Militar.

“Nos últimos anos, tivemos uma grande preocupação em denunciar os crimes que ocorreram naquele período e dar visibilidade ao sofrimento das vítimas. Agora, vamos investir no outro lado da moeda. O povo brasileiro precisa saber como funcionava a repressão”, afirma o deputado estadual Adriano Diogo (PT), presidente da Comissão da Verdade paulista. “Até hoje, ouvimos a expressão ‘nos porões da ditadura’, e isso dá a ideia de que a tortura era algo de bastidor, escondido. Não é verdade. A tortura era uma ação do estado brasileiro, não uma exceção”, completa.

Segundo o deputado, o relatório final da Comissão da Verdade de São Paulo deve incluir não apenas as cadeias de comando acima dos torturadores, mas também os grupos políticos que operavam no seio da repressão, os atentados cometidos entre militares de correntes distintas e a atuação das escolas militares na formação de agentes violentos.

O documento-base que será utilizado para dar início a esse mapeamento da estrutura de torturadores será o ‘bagulhão’, como é chamado um documento de 1975 redigido a partir da contribuição de vítimas da ditadura e que identifica 233 torturadores e agentes de repressão. “Não adianta chamar os ex-colaboradores da ditadura, eles não falam nada. Vimos isso nas diversas comissões estabelecidas nos estados”, pontua Diogo.

Quem mandava

Raphael Martinelli, líder ferroviário que fundou o Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) e era próximo ao presidente João Goulart, deposto pelo golpe de 1964, concorda com a nova orientação da Comissão da Verdade paulista.

“A partir de relatos e documentos, vamos identificar quem sequestrava, quem matava, quem torturava e, principalmente, quem mandava”, destaca. Como presidente do Fórum de Ex-Presos e Perseguidos Políticos, Martinelli afirma ter cópias de mais de 2,7 mil processos de solicitação de indenização que apontam os nomes de muitos agentes da ditadura militar.

“É importante que façamos essa investigação. Quando íamos criar a Comissão Nacional da Verdade, nosso objetivo final era a punição dos torturadores ainda vivos, mas os militares, dentro do governo e da sua associação de aposentados, conseguiu nos impedir. Mas não podemos desistir da luta”, avalia Martinelli.