saúde abalada

‘Não quero privilégios, quero o cumprimento da lei’, diz Genoino

'Entre a humilhação e a servidão, eu assumo o risco da luta', afirma, em mensagem aos familiares. Para sua mulher, Rioco, nem mais terrível prognóstico era tão negativo

Gerardo Lazzari/RBA

Rioco diz que família teve de apelar a um advogado para tentar repassar uma carta a Genoino

Brasília – Um dia de tensão e ansiedade. A mulher de José Genoino, Rioco Kayano, e dois dos três filhos do deputado, Miruna e Ronan, viveram em Brasília horas de apreensão sobre o cumprimento do regime semiaberto a que o ex-presidente do PT tem direito e à espera de notícias sobre a possibilidade de visitá-lo. Somente no final do dia conseguiram saber ele passa bem e que enviara mensagem por meio dos advogados, na qual o ex-presidente do PT afirma: “Não quero privilégios, quero o cumprimento da lei. Entre a humilhação e a servidão, eu assumo o risco da luta”.

Antes disso, hospedados em um apartamento de amigos na Asa Norte (Plano Piloto), no começo da tarde desta segunda-feira (18) todos aguardavam a possibilidade de que fossem autorizados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a entrar no complexo penitenciário da Papuda para uma visita rápida a Genoino, em razão de seu estado de saúde. Mas em seguida veio a notícia de que apenas Rioco seria liberada para entrar, levando alguns medicamentos e alimentos.

A expectativa da família, entretanto, se dá, mesmo, em relação ao pedido feito para que Genoino seja liberado da prisão em face da sua situação clínica. “Ele recebeu alta hospitalar, não alta médica”, contou à RBA, chorando, a filha Miruna. Além da visita ao pai, ela desejava agradecer os militantes que ficaram concentrados no local que desde sábado abriga 11 réus da Ação Penal 470, o mensalão, detidos por ordem do presidente do STF, Joaquim Barbosa.

A preocupação do momento é o fato de que Genoino tem um sofisticado exame de sangue para fazer amanhã (19), com o objetivo de medir a sua coagulação sanguínea. Tal exame tinha sido programado para esta data logo após a cirurgia à qual ele se submeteu em julho passado, e é necessário porque somente estes resultados poderão apontar se há evolução ou melhorias no quadro de saúde desde que se internou com problemas cardíacos no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.

Além disso, para a recuperação tinha sido exigido que Genoino fizesse exercícios físicos e fonaudiológicos todos os dias, o que ele não tem podido realizar desde a última sexta-feira (15). “Não sabemos até agora sequer se esse exame de sangue poderá ser feito”, disse Miruna. “Assim como também não sabemos se nenhuma informação que nos chegou até agora sobre o meu pai é totalmente correta porque nada que nos foi contado foi passado oficialmente”, reclamou ela.

Rioco afirmou que a família pediu, pelo advogado, a um dos coordenadores do presídio para repassar uma carta a Genoino procurando saber como estava se sentindo e perguntando se ele estava tomando os remédios, mas não obteve retorno. “A situação está pior do que a vivida na época da ditadura. Na ditadura, ao menos os presos podiam receber cartas, que eram lidas, mas eram entregues. Agora isto não está acontecendo”, ressaltou Rioco, ela também uma ex-presa política, assim como o marido.

Em um depoimento emocionado, com os olhos marejados quando falou dos netos, dos pais e dos sogros – o pai de Genoino, que mora no sertão de Quixeramobim, Ceará, também com problemas cardíacos, ainda não soube da prisão do filho –, Rioco desabafou: “Mesmo quando pensávamos que o pior viesse a acontecer, nos nossos mais terríveis prognósticos, não imaginávamos que viveríamos uma situação da forma como está acontecendo agora.”

Segundo informações que chegaram até a família, José Genoino sentiu-se mal no trajeto do voo entre Belo Horizonte (MG) e Brasília porque enquanto aguardavam para se deslocar de Minas até o Distrito Federal os réus presos da Ação Penal 470 foram obrigados a esperar por quase quatro horas em pé.

Além disso, também de acordo com tais notícias, nesse dia a última refeição feita por Genoino e os demais presos foi às 16h30, tendo se alimentado apenas no dia seguinte. Chegando a Brasília, eles ainda tiveram de ser submetidos a procedimentos que costumam ser destinados a presos de alta periculosidade e não estavam previstos para pessoas condenadas a regime semiaberto, como ficarem nus, serem revistados e obrigados a usar fardamentos do presídio.

Água da torneira

Ao longo de todo esse período, segundo denunciou Miruna, foi servida a eles água da torneira, situação só modificada depois de um apelo feito por José Dirceu e Delúbio Soares aos agentes penitenciários na madrugada de ontem para que conseguissem água mineral apenas para Genoino, alertando que ele tinha passado mal e precisava tomar muitos medicamentos. “Serei grata ao Delúbio e ao Dirceu para o resto da vida por isso. O que soubemos é que apenas hoje meu pai começou a ter uma alimentação condizente com a dieta que estava fazendo. A situação dele exige muitos cuidados”, colocou.

Miruna disse que, no momento, a família não está preocupada mais com o resultado do julgamento ou em comentar sobre a decisão de Joaquim Barbosa, mesmo que venha a tocar no assunto posteriormente. “Nossa prioridade é a saúde do meu pai”, frisou. Rioco enfatizou que não se conforma com o fato de a condenação ter sido decidida em regime semiaberto e o marido ser submetido a todas as regras de uma prisão em regime fechado. “Desobedeceram, até agora, a todas as regras de um regime semiaberto, inclusive nessa determinação da vinda dele para Brasília, que não tinha necessidade”, destacou.

A filha de Genoino lembrou que o médico levado para atender o pai foi chamado pela família e não pelo Estado, “pois se não tivéssemos intervido não teriam sido tomadas quaisquer providências em relação à saúde dele”.

Mais quieto que a mãe e a irmã, o filho Ronan contou que apesar de a prisão do pai ter acontecido no último dia 15, Genoino praticamente começou a sentir-se preso desde o dia 12, quando jornalistas de todo o país começaram a fazer plantão intenso em frente à sua casa. “Vivemos extrema tensão desde a terça-feira passada, quando instalaram câmeras de todos os tipos na nossa porta. Seguiram minha mãe que ia fazer compras num mercado e registraram até o que foi comprado por ela. Para fazermos o jantar precisamos contar com a ajuda de amigos porque não podíamos sair de casa. Nem ir até o quintal o meu pai podia que era fotografado”, disse.

Sem ver os netos

Como se não bastasse, segundo Miruna, fotografaram de todas as formas os filhos dela, Paula, de 6 anos, e Luiz Miguel, de 5 anos. As fotos não foram publicadas, mas a abordagem de cinegrafistas e fotógrafos junto às crianças a deixou chocada. Talvez também por este motivo, os netos passaram a ser uma das preocupações externadas por Genoino. Eles não estavam na sua casa quando recebeu o mandado de prisão e, por isso, o deputado não pôde se despedir dos dois, a quem é bastante apegado.

De acordo com Miruna, mãe das crianças, o último pedido feito por ele à família ao se despedir na sede da Polícia Federal, em São Paulo, foi de que mesmo diante da situação pela qual a família está passando fizessem a festa de aniversário de Paula, que completa 7 anos na próxima sexta-feira. “Vamos fazer o maior esforço e reunir uns poucos amigos, mas atenderemos a esse pedido dele. Isso mostra o tamanho da generosidade do meu pai”, afirmou chorando.

A família conversou com os netos, orientada por uma psicóloga, e explicou que o avô fez muitas coisas boas, ajudou a mudar muita coisa no país mas, como acontece com os heróis nas histórias que eles leem, que passam por momentos ruins antes que chegue o final, eles também estavam passando por uma fase ruim, embora no final tudo fosse acabar bem. “Foi essa a imagem que procuramos passar, para tirar um pouco aquela visão de criança, do choque de que o avô foi preso e de que quem é preso é bandido”, contou Rioco.

“A gente aguenta porque sabe o comportamento que ele adotou ao longo da sua vida. Sente a energia das pessoas que estão torcendo por nós em todo o país e, principalmente, porque temos a cabeça limpa e erguida, com a convicção de que ele é inocente”, disse o filho Ronan.

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