Congresso vira panela de pressão com proposta de plebiscito

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Arthur monteiro/agência senado

Deputados e senadores passaram o dia em reuniões e repercutindo a proposta feita pela presidenta Dilma

Brasília – O Congresso Nacional funciona hoje (25) como uma panela de pressão prestes a entrar em ebulição. Ao longo dos pronunciamentos nos plenários da Câmara e do Senado, deputados e senadores passaram o dia participando de reuniões e repercutindo a proposta feita pela presidenta Dilma Rousseff de vir a realizar plebiscito e convocar Constituinte exclusiva para fazer uma reforma política no país. Os parlamentares também aproveitaram para discutir melhor teor para as matérias cuja votação resolveram antecipar, como consequência das manifestações que têm sido observadas em todo o Brasil. A expectativa é de mais uma grande manifestação em Brasília, a partir das 11h de amanhã.

Depois de anunciar ontem a proposta de realizar uma Constituinte para discutir a reforma política, cuja repercussão foi bastante polêmica, na manhã desta quarta-feira Dilma reuniu-se com o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcos Vinícius Furtado Coelho. Ele afirmou que apresentou três motivos para justificar a posição contrária da Ordem à proposta do Executivo de convocar uma Constituinte exclusiva. Em primeiro lugar, argumentou que a OAB considera tecnicamente impossível convocar uma Constituinte parcial. Em segundo, entende como desnecessária a convocação porque, segundo ele, a proposta de reforma política apresentada na última segunda-feira pela OAB e pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) consiste num projeto de lei popular e, por isso, pode tramitar normalmente no Congresso sem que seja preciso uma emenda à Constituição.

O terceiro argumento da OAB contrário à ideia proposta, de acordo com Furtado Coelho, “é o fato de vir a ser perigoso para qualquer democracia a realização de uma Constituinte específica. “No ano em que a Constituição completa 25 o que precisamos é garantir essa atividade e não pôr em risco as garantias conquistadas”, acentuou.

O senador Renan Calheiros (PMDB-AL) defendeu a convocação de plebiscitos e deixou claro que considera “natural” a participação da população na escolha por temas principais a serem abordados na reforma política. “Cresce, cada vez mais, como é natural, o desejo das pessoas de participar. Por isso, temos de tornar mais assíduas as consultas à sociedade brasileira. Falo isso com tranquilidade, pois fui eu quem propôs o referendo sobre a proibição da venda de armas e munições e considero positiva a proposta da presidente”, afirmou.

Ainda numa referência sobre as manifestações realizadas nos estados, Calheiros disse que considera tais movimentos democráticos. “Os protestos só demonstraram que a sociedade quer ser ouvida com mais frequência e atendida com mais preferência.” O senador levou à presidenta o resultado da reunião de líderes das duas casas legislativas quando ficou acertado de se colocar em votação, em caráter de urgência, medidas cuja tramitação vinha sofrendo atrasos e têm sido objeto das reivindicações das ruas.

Dentre essas, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37, que inibe a participação do Ministério Público nas investigações criminais – é quase certo que será rejeitada, conforme decisão acertada entre os líderes dos partidos e a Medida Provisória (MP) 611/13, que concede crédito extraordinário para os ministérios das Comunicações, Desenvolvimento Agrário, Defesa e Integração Nacional.

Também figuram nessa lista: a PEC 207/12, que regulamenta as defensorias públicas; o Projeto de Lei (PL 5500/13) que destina royalties do petróleo para a educação e o PL 288/13, que define novos critérios para o Fundo de Participação dos Estados. Calheiros quer ainda dar maior celeridade, no Senado, à tramitação da matéria que propõe que 10% do PIB do país passe a ser destinado para o setor de Educação.

Na Câmara, o presidente, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-AL), afirmou que será criado um grupo de trabalho para analisar todas as propostas referentes à reforma política, inclusive as de iniciativa popular, de forma que a matéria seja apreciada e votada pelo Congresso até o final do segundo semestre.

“A presidente falou na expressão ‘debate’ e esse debate a Casa está disposta a fazer. Considero que uma reforma política via Constituinte específica retardaria ainda mais os trabalhos sobre o tema nesta Casa e a Câmara quer, assim como o país, uma reforma política.” Alves explicou que quer receber propostas de entidades civis e representantes de movimentos populares sobre o tema para que sejam incluídos numa única matéria e transformados numa proposta legislativa.

Mudanças estruturais

“As mudanças de que o Brasil precisa são estruturais. O modelo de governo é que está errado e não serão medidas feitas de forma atabalhoada pela presidente para resolvermos nossos problemas de um dia para o outro. A presidenta Dilma, com sua proposta de pacto e de Constituinte exclusiva só demonstrou fraqueza política e fez firulas posando para prefeitos e governadores”, criticou do plenário o senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB).

Complementando o coro dos que se manifestaram contrários à proposta da presidente, bradou do outro lado o senador Francisco Dornelles (PP-RJ): “O PP não apoia essa medida chavista, que consideramos de grande conteúdo demagógico porque fere a Constituição e traz insegurança jurídica. Trata-se de uma forma de governar o país por meio de plebiscitos”, enfatizou.

“Ninguém se mexeu pela reforma política antes. Lula tinha força para aprovar essa reforma quando foi eleito, mas o tema nunca foi interesse do governo”, disse, também em tom de crítica, o senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE). Valadares, porém, não é contrário à proposta. Ele lembrou que tramita na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, projeto de decreto legislativo apresentado por ele em 2009, que propõe a realização de uma Constituinte exclusiva sobre temas específicos, inclusive a reforma política e eleitoral.

Já o senador Pedro Taques (PDT-MT) destacou que a Constituinte vem ao encontro do que pede o momento atual e acentuou que, ao seu ver, “o atual Congresso não tem mais credibilidade para votar o assunto”. Taques, no entanto, acredita que o assunto seja decidido pelo Congresso, que aprecia várias propostas apresentadas pela presidente. O senador também sugeriu que os Constituintes sejam submetidos a quarentena, de quatro ou oito anos, e sugeriu participação de cidadãos não filiados a partidos.

Para o líder do governo no Senado, Eduardo Braga (AM), o Senado já aprovou projetos sobre o tema, só que “não andaram”. De acordo com Braga, um pacto com a população estimulado pela presidente poder dar novo ritmo ao assunto. “A presidenta Dilma tomou iniciativa e reuniu todas as instâncias brasileiras em torno do seu comando para dar uma resposta àquilo que fez o povo ir às ruas”, completou.

Também o líder do PT, senador Wellington Dias (PI), destacou que uma Constituinte agora, além de mais legítima, por se tratar de pedido da população, propiciaria uma oportunidade de maior debate entre o povo e o parlamento. “A reforma política é o ponto de partida para outras reformas necessárias. Seria, também, uma resposta contra a corrupção, pois trataria, entre outros assuntos, do financiamento público de campanhas”, assegurou.

‘História sem fim’

Na avaliação do cientista político David Fleisher, professor da Universidade de Brasília (UnB), a reforma política é “uma história sem fim no Brasil”. Fleisher acentuou que é difícil imaginar que o Congresso consiga votos suficientes para conseguir a aprovação da Constituinte exclusiva. Segundo ele, é preciso antes analisar se o projeto de lei que proporá a convocação dessa Constituinte poderá ser aprovado por maioria simples (quando fica valendo a maioria dos votos). Da forma como está estabelecida a lei atualmente, para qualquer decisão que venha a mudar a Constituição Federal são necessários votos de três quintos dos parlamentares.

Para Fleisher, provavelmente a decisão por essa Constituinte exclusiva terá de ser feita por três quintos dos parlamentares e, sendo assim, será difícil, para o governo, conseguir dispor desse quórum hoje. “Do ponto de vista republicano acho possível ser feito, mas é preciso saber se o Congresso teria votos suficientes para aprovar o projeto”, opinou.

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