MP espera esclarecimentos de Kassab sobre o templo da Igreja Mundial

No inquérito, promotor diz que projeto de lei do prefeito 'parece constituir manobra para burlar' princípios constitucionais

Prolongamento da rua Bruges, em Santo Amaro foi suspenso para não “invadir” terreno onde a Igreja Mundial do Poder de Deus constrói um templo (Foto: RBA)

São Paulo – A Promotoria de Habitação e Urbanismo do Ministério Público de São Paulo solicitou e aguarda esclarecimentos do prefeito Gilberto Kassab (PSD) e da Câmara Municipal sobre o prolongamento da rua Bruges, em Santo Amaro (zona sul), suspenso para não “invadir” terreno onde a Igreja Mundial do Poder de Deus constrói um templo.  

No inquérito instaurado pelo MP-SP, o promotor José Carlos de Freitas solicitou de Kassab “informações sobre a legalidade da continuidade das obras da Igreja Mundial”, principalmente “a partir do arquivamento do PL 224/11”. E também notifica a igreja para que informe “sobre a continuidade das obras em área objeto de prolongamento de via pública”.
 
Na quarta-feira 5 de setembro a Câmara adiou a segunda votação do Projeto de Lei 71, de 2012, como estava previsto. No primeiro turno, o PL de Kassab recebeu 31 votos a favor e um contra, de Aurélio Miguel (PR). O PT se absteve.
 
O PL em tramitação tem a mesma finalidade de um projeto anterior, o 224/11, que foi arquivado por ter sido considerado inconstitucional pela Comissão de Constituição e Justiça. A finalidade de ambos é suspender o prolongamento da rua Bruges até a rua Benedito Fernandes, “melhoramento” que estava previsto desde a Lei 10.560, de 1988. No local, um terreno de quase 15 mil metros quadrados, a Igreja Mundial constrói um enorme templo que ocupa um quarteirão inteiro.
 
A inconstitucionalidade do projeto arquivado foi motivada pelo fato de que a proposta não foi precedida nem de audiência pública nem de Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima). E a Constituição estadual exige que a população participe de discussões sobre mudanças viárias de planejamento urbano. A construção não tem sequer alvará da prefeitura.
 
Se os dois projetos têm a mesma finalidade e, na prática, suspendem o prolongamento da rua, por que o primeiro foi arquivado por inconstitucionalidade e o segundo já foi aprovado em primeiro turno no plenário do Legislativo? É o que a promotoria quer saber da Câmara e do prefeito. “Das duas, uma: ou a Câmara estava certa antes, ao arquivar o primeiro projeto, e portanto não pode ignorar isso, ou estava errada e por algum motivo foi convencida pelo prefeito”, disse o promotor José Carlos de Freitas à reportagem da Rede Brasil Atual.
 
Nos corredores do Legislativo municipal, comenta-se que os vereadores aguardam que o caso “esfrie” na imprensa para então aprovar o PL em segunda votação. 

Manobra

 
A diferença entre o projeto 224/11, arquivado, e o que tramita no Legislativo é uma sutileza legal. Enquanto o primeiro suspendia o prolongamento do logradouro textualmente, citando tanto a rua Bruges quanto outras do local envolvidas nas previsões da Lei 10.560/88, o segundo apenas revoga dispositivos dessa lei, sem mencionar nome de rua algum. Em observação à caneta feita pelo promotor no inquérito, ele escreveu: “O novo PL 0071/12 parece constituir manobra para burlar os princípios lembrados pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara”.

Rua Bruges, na zona sul de São Paulo

Caso o projeto de Kassab seja aprovado em definitivo, satisfazendo o interesse da Igreja Mundial, o que ocorre depois? A Secretaria Municipal de Habitação poderá emitir o alvará de construção da obra, evitando que o templo da Igreja Mundial seja desapropriado.
 
O PL poderá ser atacado judicialmente depois de aprovado em segundo turno? “O prefeito vai ter de esclarecer se vai levar isso adiante, até porque depois ele precisa sancionar”, diz o promotor Freitas. “Em tese, pode, sim, ser objeto de ação judicial.”
 
Freitas lembra que há outro inquérito sobre a mesma região. “Trata-se de um shopping e o consequente impacto naquele local”.

Votação vinculada à eleição  

 
No dia 29 de agosto, a Câmara Municipal de São Paulo aprovou, em primeira votação, o projeto 0071/12, do prefeito Gilberto Kassab, suspendendo o prolongamento da rua Bruges até a rua Benedito Fernandes. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, vereadores afirmaram que a aprovação do PL na Câmara foi exigência de Valdemiro Santiago, fundador da Igreja Mundial, e do deputado federal José Olímpio (PP), em troca do apoio dos pastores da igreja à candidatura de José Serra à prefeitura de São Paulo. De acordo com o jornal, a pressão foi confirmada pelo líder do governo na Câmara, Roberto Trípoli (PV).

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