Desafio do PT é convencer eleitor de que Haddad é diferente de Russomanno

Pesquisas qualitativas do partido indicam que, para petista menos politizado, ambos fazem parte do mesmo projeto político

Midiático e associado à defesa do consumidor, Russomanno é associado por eleitores ao mesmo projeto de Haddad, ao lado de Dilma e de Lula (Foto: Leo Martins.Frame.Folhapress)

São Paulo – Faltando duas semanas para o primeiro turno das eleições em São Paulo, a campanha do candidato Fernando Haddad (PT) se depara com um obstáculo inesperado, que está se revelando de difícil superação: “recuperar” os votos de simpatizantes do PT que migraram para Celso Russomanno (PRB), principalmente nas periferias sul e leste da cidade.

Segundo apurou a Rede Brasil Atual, a maior dificuldade dos petistas está em convencer seu eleitorado, até então tido como “fiel”, de que Russomanno e Haddad não fazem parte do mesmo projeto político. Pesquisas qualitativas realizadas pela campanha de Haddad teriam identificado que o petista menos politizado não enxerga Russomanno como adversário do PT, de Lula ou do governo Dilma – e adere ao candidato do PRB porque ele é o que aparece, hoje, com mais chances de vencer o inimigo maior, no caso, o tucano José Serra.

Nas duas sub-regiões consideradas redutos petistas, a vantagem de Russomanno é considerável. Na Leste 2, ele tem 46%, contra 16% de Haddad e 12% de Serra. Na Sul 2, os índices são 37%, 19% e 18%, respectivamente. Segundo um dirigente do partido, todo o esforço do PT nas próximas semanas será no sentido de desfazer essa “confusão” – o que inclui intensificar a participação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos programas eleitorais e nas andanças de Haddad pelos bairros da capital. 

Inimigo comum

O fenômeno Celso Russomanno o transformou naquilo que no futebol se conhece como “o adversário a ser batido”. E não apenas pelo PT. O problema é que ninguém sabe como.

O debate realizado pela TV Cultura e pelo jornal O Estado de S. Paulo no dia 17 de setembro foi sintomático dessa conjuntura. De maneira inusitada, o mediador do evento, o jornalista Mário Sergio Conti, iniciou fazendo uma única pergunta dirigida a todos os candidatos: o que eles tinham a dizer sobre Celso Russomanno, seu perfil e seu desempenho, tanto mais surpreendente quanto mais parece se consolidar nas pesquisas.

A melhor resposta foi de Soninha Francine (PPS), que atribuiu a performance do candidato apoiado pela Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) “à exposição midiática durante muitos anos”, além de ele ter sido “subestimado, livrando-se das trocas de acusações” dos oponentes. Embora não tenha mencionado os partidos, Soninha se referia à polarização PT x PSDB que tem caracterizado as eleições em São Paulo na última década.

Aliado à exposição midiática, Russomanno tem outro handicap considerável: sua experiência em questões relativas à defesa do consumidor lhe dá condições de conhecer profundamente as expectativas do eleitor, a quem diz o que este quer ouvir valendo-se de uma linguagem que mistura o papel de repórter que sabe exercer muito bem e o populismo. 

O candidato se dirige à população anônima, para quem olha através da câmera de TV com intimidade, referindo-se a ela como “você”. Consegue, assim, a cumplicidade desse eleitor anônimo que, nas periferias pobres, é a mesma pessoa da “nova classe C” cujo desejo de consumo está muito além de sua preocupação com políticas públicas que a tornem mais próxima da cidadania e de uma sociedade mais justa, como notou Eliane Brum em artigo publicado na revista Época

Essa seria uma explicação mais sociológica para o fato concreto de Fernando Haddad não conseguir reverter a desvantagem nos redutos históricos do PT, nem mesmo com a entrada de Marta Suplicy na campanha – a ex-prefeita tem grande popularidade naquelas regiões. 

Religião

Muitos dos jovens que andam em seus carros ouvindo funk em alto volume pelas periferias pertencem a famílias evangélicas. Seus pais estão no culto evangélico, que promete resolver problemas materiais, e não espirituais, enquanto eles estão ouvindo o funk que prega a busca pelo sucesso pessoal onde o coletivo e a consciência política não têm lugar.

Mas, se a avaliação é verdadeira, é apenas parte de um conjunto de fatores que especialistas e adversários de Russomanno estão tentando entender, enquanto rapidamente se aproxima o dia 7 de outubro, data do primeiro turno das eleições, e Russomanno, pelo menos segundo as pesquisas disponíveis, não cai. No último levantamento do Datafolha, divulgado na quinta-feira (20), ele subiu três pontos em relação ao levantamento anterior, para 35%, enquanto José Serra (PSDB) oscilou um ponto (indo para 21%) e Haddad caiu dois, para 15%.

Até mesmo os trackings da campanha petista (pesquisas diárias), embora coloquem Haddad na frente de Serra, não alteram o essencial. No tracking fechado sexta-feira (21), Russomanno aparecia com os mesmos 35% do Datafolha, seguido por Haddad, com 18%, e Serra, com 16%.

A influência pentecostal é bastante relativa se se considerar que, segundo o Censo de 2010 do IBGE, os evangélicos são 22,1% da população paulistana (eram 15,9% em 2000), contra 58,2% que se declaram católicos. É com esse potencial poder eleitoral que a Igreja Católica entrou concretamente na campanha. Mas ela não apoia claramente nenhum candidato, nem mesmo Gabriel Chalita (PMDB), o mais próximo do catolicismo entre os postulantes. 

O objetivo da cúpula católica, encarnada no arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer, pelo menos na atual conjuntura, é outro: “A Igreja Católica tem um não candidato, o Russomanno”, disse à Rede Brasil Atual no dia 17 o professor da Faculdade de Humanidades e Direito da Universidade Metodista de São Paulo Oswaldo Oliveira Santos Junior. Eleitoralmente, os católicos formam um universo heterogêneo que se divide entre Fernando Haddad (PT), José Serra (PSDB) e Gabriel Chalita (PMDB), dependendo de grupo, região da cidade, linha evangélica etc. 

Sob esse aspecto, Russomanno teria a vantagem de angariar mais facilmente os votos evangélicos do que os outros candidatos de reunir os dos católicos. Ele é o candidato da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), cujo universo de eleitores é mais homogêneo, além de ser apoiado abertamente em cultos religiosos de outras correntes pentecostais. 

Segundo matéria do jornal O Estado de São Paulo no início do mês, pastores da Assembleia de Deus de Santo Amaro (reduto tradicionalmente petista) pediram voto dos fieis para o candidato do PRB à prefeitura durante um culto e teriam estabelecido até uma meta a 500 pastores: cada um deveria conseguir ao menos cem votos. Segundo o Datafolha, 47% do eleitorado de Russomanno é de católicos e 28% de evangélicos. Essa relação é de 42% a 24% no eleitorado de Haddad e de 54% a 18% no de Serra. 

Outro fator a se considerar contra Haddad é a possível influência do julgamento do chamado “mensalão” no Supremo Tribunal Federal, em pleno processo eleitoral. Segundo o Datafolha da semana passada, 45% dos eleitores dizem que não terá influência no voto para prefeito, enquanto para 25% terá grande influência e 20% declararam que a influência será pequena. Se a pesquisa estiver correta, pode-se considerar que é bastante razoável o estrago do julgamento na campanha de Haddad. Um quarto de um eleitorado de 8,6 milhões de eleitores significa mais de 2 milhões de pessoas. 

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